Análise | No país da inflação, a conta maior vai para os trabalhadores

O governo pode contar a seu favor um crescimento acumulado provavelmente superior a 6,5% em dois anos, mas com graves desequilíbrios, que levaram a uma inflação fora da meta

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Foto do author Rolf Kuntz
Atualização:

Com inflação de 4.83% em 2024, o Brasil completou 20 anos com alta de preços acima de 4% desde o ano 2000 e oito com descumprimento da meta. Pelo menos 13 países do Grupo dos 20, formado pelas maiores economias do mundo, devem ter fechado o ano com inflação inferior à brasileira, de acordo com as últimas projeções da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE). O governo pode contar a seu favor um crescimento acumulado provavelmente superior a 6,5% em dois anos, mas com graves desequilíbrios.

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Com dinheiro curto e em grande parte comprometido com alimentação, transporte e cuidado das crianças – gastos dificilmente comprimíveis –, as famílias pobres e de classe média baixa são as mais sacrificadas pelo aumento do custo de vida.

Em 20 anos, no período iniciado em 2000, a alta dos preços ao consumidor superou 4%. Em 16 anos ficou acima de 5%. Em 7 anos ultrapassou o teto da meta, evidenciando o descontrole do gasto público e as dificuldades de conter os preços por meio do aperto monetário.

A inflação permaneceu bem acima do centro do alvo (3%) nos primeiros dois anos do atual mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Chegou a 4,62% em 2023 e a 4,83% em 2024, superando nos dois períodos o teto da meta, 4,5%. As projeções apontam 4,99% para este ano, 4,03% para o próximo e 3,90% para 2027, de acordo com o boletim Focus. As expectativas dificilmente se tornarão muito melhores enquanto o governo se mostrar disposto a gastar de forma imprudente.

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A inflação foi especialmente danosa em 2024, porque a alta de preços foi liderada pelo grupo alimentação e bebidas, com alta de 7,69%. Também muito importantes para a maior parte das famílias, os custos de saúde e cuidados pessoais subiram 6,09%, enquanto os de transportes aumentaram 3,30%. Todos esses itens são componentes do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), principal medida oficial da inflação.

Com as projeções de inflação ainda elevadas, o Banco Central deve anunciar novas limitações do crédito, com mais uma ou duas elevações dos juros básicos. Medidas de política monetária podem levar meses para produzir, de modo pleno, os efeitos pretendidos, mas algum resultado parcial geralmente aparece no curto prazo.

De toda forma, essas medidas tendem a afetar negativamente a atividade econômica, prejudicando, além dos negócios, a geração e até a manutenção do número de empregos. Também neste caso as famílias dependentes de salários podem ser as mais prejudicadas. Sofrem mais com a alta de preços e também são as mais pressionadas quando as políticas de ajuste complicam a contratação de pessoal e a preservação de postos de trabalho. Quando o governo comete imprudências em seus gastos, a conta mais pesada vai para os trabalhadores, na forma de preços em alta ou de empregos em baixa quando sobem os juros.

Análise por Rolf Kuntz

Jornalista

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