O presidente da Caixa Econômica Federal, Pedro Guimarães, afirmou nesta terça-feira, 22, que o pagamento do auxílio emergencial revelou um grande contingente da população – de cerca de 35 milhões de pessoas – que nunca recebeu ajuda do governo federal. Embora a Caixa só operacionalize o pagamento, ele disse acreditar que a equipe econômica continue a liberar novas parcelas do auxílio e afirmou que, agora, o banco está preparado para fazer os pagamentos sem as filas vistas pelo Brasil no mês de abril.
Outro grupo importante a ser contemplado são as pequenas e médias empresas – que, até agora, têm tido dificuldade de acesso a recursos. “A nossa maior missão agora é o crédito das micro e pequenas empresas. A Caixa não participa do crédito às grandes empresas, que já estão muito bem servidas”, disse o executivo, em entrevista ao vivo na série Economia na Quarentena. “Nossos focos são claros: crédito imobiliário, políticas sociais, crédito consignado e microempresas.”
Leia, a seguir, os principais trechos da entrevista:
O pagamento do auxílio emergencial revelou que milhões de brasileiros estão fora dos cadastros do governo. Como a Caixa pode contribuir para que o governo tenha mais informações sobre seus próprios cidadãos?
Em relação ao auxílio, nós já estamos pagando 64 milhões de pessoas por mês. Destes 64milhões, 35 milhões não estavam em nenhum tipo de data base do governo. Ou seja: nunca receberam nenhum tipo de benefício. Ao redor de 30 milhões nunca tiveram conta em banco. Então, estamos fazendo duas coisas importantes além da questão da pandemia: realizar a inserção digital e social, porque essas pessoas quando precisavam pegarempréstimo financeiro cobravam 20% ao mês e outro ponto conseguir que dezenas de milhões de pessoas recebem auxílio neste momento importante para a sociedade brasileira.
Por que existia tanta gente fora dos cadastros?
Tinha muita gente à margem da sociedade. Tem uma cracolândia em Brasília que tem uma agência ao lado e vi pessoas retirando (o benefício). Existem pessoas que efetivamente ganhavam muito pouco, com trabalho muito duro. A maioria desses 35 milhões de pessoas têm realmente uma necessidade muito grande. Nós lançamos o aplicativo do auxílio emergencial quatro dias depois dele ser promulgado. Logo no primeiro dia 42 milhões de brasileiros se cadastraram. Hoje, temos 107 milhões cadastrados. Estamos pagando 64 milhões. Junto com o FGTS, teremos 121 milhões de adultos recebendo algum tipo de benefício do governo federal.
Diante deste contingente que não recebia auxílio, o sr. acha que esse benefício deve ser estendido?
Essa é uma discussão do meu chefe, (o ministro da Economia) Paulo Guedes, que envolveo ministro Onyx (Lorenzoni), da Cidadania, que coordena todo o programa, capitaneado pelo presidente Jair Bolsonaro. À Caixa cabe a operacionalização do pagamento. A decisão se vai estender não cabe à Caixa. Mas pela posição do ministro Paulo Guedes deverá haver alguma extensão. O importante, além da questão de curto prazo da pandemia ,é que nós teremos 121 milhões de brasileiros com conta digital de graça. Destes 35 a 40 milhões, nunca tiveram conta. Há pessoas que precisam andar 5 horas para ir a uma agência da Caixa. Esta inserção digital vai permitir que as pessoas não precisem andar muito tempo e gastar dinheiro porque hoje já consegue realizar compras pela internet e mais 3 milhões de estabelecimentos via o aplicativo do celular. Estamosconversando com o governo e provavelmente o aplicativo Caixa Tem vai ser usado para o pagamento de diversos benefícios sociais.
Ao mesmo tempo que o auxílio ajudou a milhões de brasileiros, houve também fraudes. Por que isso aconteceu e como se pode corrigir daqui para frente?
São 64 milhões de pessoas recebendo. A fraude é da ordem de 0,1% a 0,15%, mas em 64 milhões qualquer 0,1% é relevante. Dois pontos importantes: fraude é crime e a Caixa Econômica Federal é 100% do Tesouro Nacional. Qualquer questão que envolva a Caixaenvolve a Polícia Federal. A fraude é pequena e, quando detectada, a pessoa é obrigada a devolver. Elas não se repetirão no terceiro pagamento.
Uma das críticas ao governo é o fato de o dinheiro não estar chegando a pequenas e médias empresas. Como a Caixa pode fazer esse meio de campo?
É uma análise risco.Com o governo tendo 85% da (possível) perda, a Caixa vai conseguir emprestar para um número maior de empresas do que se o dinheiro fosse do banco. Nós entendemos que o próprio auxílio de (R$ 600) tem ajudado na volta de atividades (das empresas). Posso te dizer que abril foi um mês muito duro, assim como o começo de maio. Mas já estamos retomando. Na última sexta-feira, tivemos um recorde de busca por crédito consignado e prestamista. Nunca vendemos tanto. Voltamos a vender assim que acabamos de pagar o auxílio emergencial. A Caixa está retomando. A nossa maior missão agora é o crédito das micro e pequenas empresas. A Caixa não participa do crédito às grandes empresas, que já estão muito bem servidas. Então os nossos focos são claros: crédito imobiliário, políticas sociais, crédito consignado e microempresas.
A Caixa está preparada para a liberação do FGTS sem filas?
Começa nas segunda-feira a liberação de R$ 3 bilhões para 5 milhões de pessoas. Estamos depositando nas contas digitais para evitar as filas. Estamos pagando o auxílio a 64 milhões de pessoas, todos os meses, fora os 60 milhões que já são atendidos nas agências da Caixa todos os meses. Abrimos as contas digitais, que vão poder ser utilizadas mesmo pela população mais carente. Vai ser um legado positivo de uma situação catastrófica da pandemia. E vamos ter um cronograma de pagamento mais dilatado. Para evitar as filas.
Há chance de retomada do mercado imobiliário mesmo com a crise econômica?
Há um mês e meio lançamos os financiamentos imobiliários com seis meses de carência para pagamento. Apesar do momento grave, há uma série de pessoas que têm comprado apartamentos a um preço mais baixo que o normal e aproveitado a carência para começar a pagar. De novo é uma questão de foco. No segmento imobiliário, em que somos fortes, vamos auxiliar sim empresas e empresários, buscando dar opções de escolha a nossos clientes.
Como vai ser o processo de venda de ativos da Caixa?
Não há discussão para privatizar o banco como um todo nem nunca houve. A Caixa tem um papel social que ficou claro nessa pandemia. Mas podemos abrir o capital de operações como asset, seguros e cartões. Nas loterias há uma discussão que depende (de legislação). São quatro ramos importantes para a Caixa, mas que não são o coração do banco. A entrada de novos investidores pode ser uma forma de aumentar a governança do banco como um todo.
Como o sr. vê a crise política que se instalou no País em meio à pandemia?
A gente precisa focar no que precisa ser feito. Na Caixa, a gente colocou um aplicativo no ar e 42 milhões de brasileiros se cadastraram em quatro dias. Tivemos as filas, que foram um problema. E como a gente resolveu? Todas as pessoas da Caixa unidas, e mais parceria com 1.280 prefeituras, que nos ajudaram.
O consenso do mercado é de uma queda de 6% no PIB em 2020. Como o sr. vê a situação da economia?
Estamos vendo uma volta rápida. Se essa retomada do crédito continuar, talvez esse valor (de queda) seja menor. Eu sou otimista, penso que as políticas de transferência de renda estão tendo impacto – talvez não na Faria Lima, mas no Acre, em Roraima, no interior do Pará. Eu vi isso na prática, nas viagens que tenho feito pelo Brasil. Certamente, no entanto, a velocidade com que a pandemia perder força será determinante para o impacto no PIB (Produto Interno Bruto). Estou mais otimista hoje do que estava há dez dias, pois estamos vendo uma retomada mais rápida do que esperávamos.
Com esse lado social escancarado, pode haver mudança de mentalidade da equipe econômica?
O ministro Paulo Guedes tem um plano muito claro de governo. Ele não fala disso, mas a ideia de colocar os invisíveis num programa de distribuição de renda foi dele. Agora, é importante lembrar que as reformas são o coração (da política econômica). São elas que trazem a confiança para a retomada o investimento, para a taxa de juros de longo prazo estar a 2,25% ao ano, e não em 10% ao ano. Se não houvesse essa confiança nas reformas, isso não aconteceria.
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.