BRASÍLIA - A sustentabilidade da dívida pública no Brasil só será garantida com um arcabouço fiscal crível, uma reforma tributária efetiva e eficiência nos gastos públicos, aponta a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) em seu Relatório Brasil 2023, sobre a economia do País neste ano.
A avaliação da entidade é de que uma combinação de política fiscal expansionista, juros elevados e menor crescimento colocam a dívida bruta em trajetória de alta, com projeção para fechar 2024 em 80% do PIB, e 2047, em 90% do PIB.
O cenário base da OCDE pressupõe que o arcabouço fiscal e novos impostos sobre consumo estarão implementados, o que elevará o crescimento potencial em 0,5 ponto porcentual. Com isso, o superávit subiria para 1% do PIB a partir de 2026, considerando maiores receitas tributárias, reflexo da melhoria na arrecadação de impostos.
“A trajetória da dívida é altamente sensível à implementação da agenda de reformas. Uma falha na implementação da reforma tributária implicaria um crescimento mais baixo, o que seria suficiente para questionar a sustentabilidade da dívida pública”, pontua o documento.
“Uma consolidação fiscal mais baixa (exemplificada por um superávit primário equilibrado a partir de 2025) levaria a uma trajetória de dívida claramente insustentável, com o nível da dívida atingindo 100% do PIB já em 2037 e com uma forte inclinação para cima. Um pacote mais ambicioso de reformas estruturais impulsionaria o crescimento potencial e levaria a uma queda na relação dívida-PIB”, diz o texto.
Os dados estão no Relatório Econômico Brasil 2023, divulgado pela OCDE e Ministério da Fazenda nesta segunda-feira. O documento examina o desempenho econômico do País diante de desafios globais e do mercado interno, trazendo recomendações para o enfrentamento de desafios estruturais, com vias de garantir ao Brasil um crescimento robusto, inclusivo e sustentável a médio e longo prazo.
Questionado sobre o documento da OCDE, o secretário de Política Econômica, Guilherme Mello, afirmou que o governo está atento à agenda de gastos. Ele defendeu que a política fiscal adotada tem como objetivo olhar para os dois lados do resultado primário (receitas e despesas) e disse que uma prova de que o governo está atento ao crescimento dos gastos é o novo regime fiscal, que impõe restrições no avanço das despesas atrelado à obtenção de receitas.
Ele defendeu, no entanto, a correção de distorções. “A recomposição da base fiscal é um tema decisivo, porque melhora o ambiente de negócios ao corrigir distorções. O combate às distorções tributárias é uma forma de conter e reduzir gastos”, disse.
O secretário pontuou que esse trabalho de correção dos gastos tributários tem efeitos sobre as variáveis macroeconômicas, que impactarão a trajetória da dívida pública. Ele citou que a melhora do ambiente econômico, com harmonização das políticas fiscal e monetária, reflete na redução da taxa de juros. Com juros menores e controlados e crescimento econômico, o País poderá manter a trajetória da dívida estável, afirmou.
Espaço fiscal
A OCDE reforça a necessidade de reformas fiscais e fortalecimento das regras fiscais para a estabilização e sustentabilidade da dívida pública. Esse movimento também será necessário para abrir espaço para gastos mais eficientes.
O documento avalia que o novo arcabouço fiscal procura “aprimorar a previsibilidade de médio prazo nas finanças públicas, ao mesmo tempo em que adiciona flexibilidade, principalmente para investimentos”, com mecanismo para realinhar a meta no caso de desvios. Mas a OCDE pondera que o País não tomou providências para lidar com o excesso de “rigidezes orçamentárias”, que estão associadas a uma menor eficiência nos gastos públicos.
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O relatório cita os pisos nacionais de saúde e educação e benefícios atrelados ao salário mínimo e inflação. No caso dos pisos, há o reconhecimento de que garantir uma parcela de recursos para estes fins é compreensível do ponto de vista de política social, mas vem o alerta sobre o limite da flexibilidade da política fiscal para lidar com mudanças demográficas ou choques econômicos. Do mesmo modo, a indexação ao salário mínimo é apontada como um risco, pelas implicações fiscais significativas.
“Reduzir as rigidezes orçamentárias é uma área em que a nova regra provavelmente não trará muito progresso. Reduzir pisos obrigatórios de gastos e receitas vinculadas, ao mesmo tempo em que repensa alguns mecanismos automáticos de indexação, permitiria mais flexibilidade para ajustar políticas a prioridades em mudança e ao ambiente macroeconômico volátil do Brasil e deveria ser uma prioridade”, argumenta o documento.
“Desenvolver planos orçamentários indicativos e plurianuais seria uma opção alternativa melhor para garantir financiamento adequado de prioridades e proteger investimentos públicos e gastos sociais ao longo do tempo”, diz o texto.
Soluções
Após esse diagnóstico, a OCDE elencou medidas que devem ser tomadas pelo País para avançar na política fiscal. Um dos aspectos destacados é a continuidade da flexibilização da política monetária, desde que mantenha a convergência da inflação à meta, e a implementação do novo arcabouço fiscal, buscando a redução do déficit.
No caso do Orçamento, avaliado como muito engessado, a sugestão é a redução de pisos de gastos obrigatórios e de receitas vinculadas. O documento também sugere a indexação de benefícios sociais à inflação, e não ao salário mínimo, como é o caso da aposentadoria.
A OCDE também analisou as emendas parlamentares individuais e constatou que elas carecem de auditorias e exacerbam a desconexão de estratégias políticas e alocações eficientes do Orçamento. A sugestão é a imposição de limites mais rigorosos e auditoria sistemática de gastos financiados por esse tipo de emenda.
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