Defesa lidera verbas para investimentos e Ministério da Mulher terá o menor orçamento em 2023

Militares ficaram com a maior fatia dos investimentos federais no Orçamento encaminhado pelo governo ao Congresso. Verba para compra de caças é maior do que recurso de saneamento.

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Foto do author Daniel  Weterman
Atualização:

BRASÍLIA - O Ministério da Defesa ficou com a maior parte dos investimentos no Orçamento proposto pelo governo do presidente Jair Bolsonaro (PL) para 2023. Os militares terão R$ 7,4 bilhões dessa fatia das contas públicas do ano que vem, maior do que os valores destinados para saúde, educação, infraestrutura e ciência e tecnologia.

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O governo enviou o projeto na última quarta-feira, 31. A votação do Orçamento deve avançar só depois das eleições presidenciais. Todos os anos, o Poder Executivo propõe o Orçamento da União para o ano seguinte e a proposta é votada pelos deputados e senadores, responsáveis por embutir as emendas parlamentares na proposta.

O Orçamento de 2023 prevê R$ 22,4 bilhões em investimentos. O Ministério da Defesa terá R$ 7,4 bilhões dessa fatia, na frente de Infraestrutura (R$ 4,7 bilhões), Educação (1,7 bilhão) e Saúde (R$ 1,5 bilhão). O valor representa o menor nível de investimentos da história, que vem caindo ano a ano. A queda nos investimentos das Forças Armadas, no entanto, é menor do que a diminuição do montante total.

As emendas parlamentares costumam aumentar os recursos para atender a projetos de interesse dos congressistas, mas não têm sido suficientes para conter a queda. Em 2021, o projeto do Executivo mais as emendas levaram os investimentos a R$ 49 bilhões, mas só R$ 16,9 bilhões foram efetivamente realizados no mesmo ano.

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Investimentos públicos

O economista Raul Velloso, especialista em contas públicas, afirma que os investimentos públicos estão diretamente relacionados ao crescimento da economia. Para ele, o Brasil vive uma estagnação porque deixou de investir em infraestrutura.

No segundo trimestre de 2022, o Produto Interno Bruto (PIB) cresceu 1,2% em comparação com o trimestre anterior. Nos cálculos do economista, porém, o País registrou uma queda anualizada de 0,4% na economia nos últimos oito anos, enquanto que de 2004 a 2013 o crescimento médio foi de 3,9% ao ano. “O único jeito de resolver isso é aumentar o investimento, abrindo espaço no Orçamento através do ajuste no gasto previdenciário. Há muito tempo, nós não conseguimos repor o estoque de infraestrutura e ela só se deteriora e se desmancha”, diz Velloso.

O economista Raul Velloso, especialista em finanças públicas Foto: Sheyla Leal/Agência Senado

Ao observar o Orçamento para os ministérios em 2023, considerando o custeio dos órgãos públicos e os investimentos, o Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos ficou com o menor valor da Esplanada dos Ministérios. O presidente Jair Bolsonaro (PL) tenta diminuir sua rejeição no eleitorado feminina na campanha à reeleição e prometeu ampliar as políticas direcionadas a esse público.

A pasta terá R$ 327,9 milhões em 2023 para todas as ações, incluindo pagamento de funcionários, manutenção das unidades vinculadas ao ministério e ações de proteção à mulher, à criança e ao idoso. O Ministério do Trabalho e Previdência, responsável pelo pagamento de aposentadorias, tem o maior orçamento, com R$ 974 bilhões, mas a fatia que representa as despesas de custeio e investimentos não obrigatórias soma R$ 2,5 bilhões, menos de 1% do total.

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O Orçamento é limitado pelo teto de gastos públicos, medida que vem sendo alvo de críticas e propostas de mudanças na campanha dos principais candidatos à Presidência. Em 2016, a regra foi criada com o objetivo de conter o aumento de despesas e forçar o governo a fazer escolhas dentro de um limite. Atualmente, 94% das despesas estão comprometidas com gastos obrigatórios, incluindo salários, aposentadorias e benefícios sociais.

Ao observar o detalhamento das despesas, é possível identificar as prioridades da administração federal na hora de colocar recursos que o governo pode remanejar. O Executivo reservou R$ 1,4 bilhão para a compra de caças da Aeronáutica, enquanto os investimentos em saneamento básico ficaram com R$ 16 milhões.

O investimentos para a compra de caças é fruto de um programa implantado pelo governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Foi no governo Bolsonaro, em 2020, no entanto, que os militares passaram a receber a maior parte dos investimentos no projeto de Orçamento.

Em um ano que não haverá eleição, há R$ 745 milhões para a realização de pleitos eleitorais, o dobro do orçamento destinado para o combate à corrupção. Além disso, o dinheiro reservado para a construção de submarinos é o triplo do recurso para fiscalização ambiental. A verba de publicidade do Senado Federal é 66 vezes maior do que o recurso destinado para a produção de medicamentos.

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Jair Bolsonaro participa de evento; na mensagem presidencial que encaminhou junto com o projeto de Orçamento ao Congresso, o Executivo apontou que não dá para contar apenas com investimentos privados no planejamento orçamentário. Foto: EFE

Na mensagem presidencial que encaminhou junto com o projeto de Orçamento ao Congresso, o governo afirma que os investimentos públicos são indicativos ao setor privado para incentivar novas obras e demonstrar quais setores serão priorizados. Ou seja, o Executivo aponta que não dá para contar apenas com investimentos privados no planejamento orçamentário.

“Na alocação dos recursos para projetos públicos foram priorizados os investimentos em andamento, de forma a possibilitar maior previsibilidade para seu planejamento e execução e evitar a profusão de obras inacabadas e o desperdício de recursos públicos”, diz a mensagem.

Emendas

O governo federal reservou R$ 38,8 bilhões para emendas parlamentares em 2023, um valor recorde considerando os anos anteriores. Essa reserva significa que o Executivo deixou de apontar a destinação específica dos recursos e as prioridades para o Orçamento serão definidas pelo Congresso. Desse total, R$ 19,4 bilhões é para o orçamento secreto, esquema revelado pelo Estadão que distribui verbas para congressistas sem transparência.

No Orçamento 2023, a parcela de recursos destinada à indicação dos parlamentares representa 40% do total das despesas discricionárias, ou seja, aquelas que não são obrigatórias. “Enquanto o Poder Executivo tem como princípio investir em projetos com uma lógica mais estruturante, com reflexo econômico de nível regional ou até nacional, os parlamentares tendem a promover investimentos mais fragmentados com impacto apenas no nível local”, afirma o economista Dalmo Palmeira, assessor de Orçamento no Senado Federal. “Essa é uma parcela significativa que deixa de ser decidida por ministérios dotados de técnicos especializados em suas áreas, para ser decidida por atores que decidirão com base em critérios exclusivamente políticos.”

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As emendas tornaram o Orçamento uma “jabuticaba” brasileira. Como o Estadão publicou, o Congresso brasileiro é o que mais interfere no Orçamento em comparação aos países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Uma das diferenças é a reserva para as emendas. Nos outros países, o Legislativo propõe alterações a partir de recursos já colocados pelo Executivo em obras específicas. Aqui, a reserva fica “livre” para as emendas.

Nos últimos anos, as indicações apresentadas por cada parlamentar foram simplesmente aprovadas no Congresso, sem discussão de mérito e objetivos. A única obrigação é destinar metade das emendas individuais para a saúde, o que garantirá R$ 5,9 bilhões para o setor. Ainda assim, o Legislativo fica livre para escolher os projetos e municípios atendidos. O restante, um total de quase R$ 33 bilhões, poderá ser colocado em qualquer outra área. “Deixar a reserva para as emendas significa comprar apoio sem saber o preço que será pago depois. A sociedade não sabe no que vai se transformar esse ‘dinheirão’ das emendas”, afirma Raul Velloso.