BRASÍLIA - O Congresso turbinou o orçamento de ministérios controlados pelo Centrão, aumentou as verbas destinadas à compra de trator e asfalto e cortou o dinheiro destinado ao combate à violência contra a mulher, à educação, à cultura e ao saneamento básico ao aprovar o Orçamento de 2025, nesta quinta-feira, 20. As mudanças receberam o aval do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
O Orçamento do governo federal soma R$ 5,9 trilhões. Sem contar as despesas com juros e manutenção da dívida pública, são mais de R$ 2 trilhões. O governo Lula mandou o projeto em agosto do ano passado. O Congresso deveria aprovar a proposta em dezembro, mas votou o texto com três meses de atraso, após impasses envolvendo as emendas parlamentares no Supremo Tribunal Federal (STF).
Após as alterações feitas pelos parlamentares, os ministérios que mais ganharam proporcionalmente ao Orçamento enviado pelo governo foram:
- Esporte: com R$ 2,3 bilhões, um aumento de 270%
- Turismo: R$ 1,9 bilhão, um aumento de 180%
- Empreendedorismo: R$ 137,9 milhões, aumento de 104%
- Integração e do Desenvolvimento Regional: R$ 4,4 bilhões, alta de 79%
Com exceção de Empreendedorismo, todas essas pastas são comandadas por ministros do Centrão, e são onde os parlamentares mais destinam recursos em emendas.

Por outro lado, o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação foi o que mais perdeu. O Congresso reduziu o dinheiro da pasta de R$ 16,7 bilhões para R$ 13,7 bilhões. Minas e Energia, Transportes, Educação e Defesa também perderam recursos (veja lista completa abaixo).
Os valores consideram o parecer apresentado pelo relator do Orçamento no Congresso, Angelo Coronel (PSD-BA) e contemplam as maiores mudanças no Orçamento enviado pelo governo em agosto do ano passado. Após a apresentação do relatório, houve alterações votadas diretamente na Comissão Mista de Orçamento (CMO) e no plenário do Congresso, e as quantias finais ainda não foram divulgadas.
Mais verbas para trator e asfalto e menos para combate à violência contra a mulher e cultura
Nas despesas específicas, o Congresso aumentou a verba para o Auxílio Gás em R$ 3 bilhões para viabilizar o pagamento do benefício em 2025, após o governo não colocar os recursos necessários e propor uma nova modalidade de repasse fora do Orçamento da União. O programa Pé-de-Meia, por outro lado, só ficou com R$ 1 bilhão, sendo que o governo espera gastar até R$ 15,5 bilhões com a poupança do ensino médio neste ano. O Tribunal de Contas da União (TCU) determinou que o Pé-de-Meia volte para o Orçamento, e a decisão ainda não foi cumprida.
Na Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf), o orçamento dobrou de R$ 1 bilhão para R$ 2 bilhões. O órgão é controlado pelo União Brasil e uma das pastas por onde passam recursos do orçamento secreto, esquema revelado pelo Estadão, e das outras emendas parlamentares. No Ministério da Integração e Desenvolvimento Regional, uma ação voltada à compra de tratores e pavimentação de ruas nos municípios havia recebido uma programação de apenas R$ 110 pelo governo federal, mas saiu com R$ 2,6 bilhões no Orçamento aprovado, um valor 24 milhões de vezes maior.
Os cortes atingiram as ações de combate à violência contra a mulher. O projeto que tem mais recursos para essa política está no Ministério da Justiça e Segurança Pública. O governo havia projetado R$ 162,9 milhões para essa ação ao mandar o Orçamento para o Congresso. Os parlamentares cortaram R$ 110 milhões e o recurso caiu para R$ 52,9 milhões. O dinheiro serve para a construção e aparelhamento de equipamentos voltados ao atendimento de mulheres vítimas de violências, como as Casas da Mulher Brasileira.
O governo Lula também deu aval a cortes na cultura que irritaram deputados da sua própria base, como o corte de R$ 2,5 bilhões na política Aldir Blanc, de fomento à produção cultural. O programa, que inicialmente receberia R$ 3 bilhões, ficou com apenas R$ 478 milhões. O Fundo Setorial do Audiovisual também foi desidratado em 25% e ficou com R$ 350 milhões.
O saneamento básico, por sua vez, sofreu um corte de R$ 150,9 milhões, saindo de R$ 1,9 bilhão para 1,74 bilhão. As ações voltadas à proteção, recuperação da biodiversidade e combate ao desmatamento e incêndios caíram de R$ 522 milhões para R$ 509 milhões.
Políticos governistas, como o líder do governo no Congresso, Randolfe Rodrigues (PT-AP), prometeram que os recursos serão recompostos ao longo do ano, mas a queda de braço por verba pública dá prioridade a gastos obrigatórios, como Previdência e pagamento de programas sociais, que têm previsão de despesa abaixo do efetivamente orçado.
Como adiantou o Estadão, o governo Lula ampliou os recursos para a reforma agrária no Orçamento, que aumentou 54%, de uma proposta original de R$ 686 milhões para R$ 1,058 bilhão no texto final aprovado nesta quinta-feira.
Há duas semanas, Lula esteve pela primeira vez no atual mandato em um assentamento do Movimento dos Sem-Terra, até então insatisfeito com o que considerava ser pouca atuação do governo nesta agenda. Na ocasião, ele prometeu apoiar o movimento e disse saber quem são os aliados históricos e os de ocasião, referindo-se provavelmente aos políticos do Centrão.
A área da saúde subiu de R$ 209,9 bilhões para R$ 234,4 bilhões, pois a maior parte das emendas vai para o setor. A educação, porém, foi atingida por cortes, e saiu de R$ 177,5 bilhões para R$ 175,4 bilhões. Uma das áreas que foram reduzidas foi o ensino em tempo integral. A pedido do governo, o Congresso retirou R$ 4,8 bilhões desse programa, zerando o recurso.
O pacote de corte de gastos aprovado no ano passado transferiu esse valor para o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb). O governo, no entanto, começou a repassar os valores do Fundeb sem a parcela a educação em tempo integral, como o Estadão revelou, e não incorporou a medida. O Executivo prometeu corrigir os repasses.
Dentro de outro programa social, o Minha Casa, Minha Vida, o Orçamento reserva mais recursos para a classe média do que para a parcela mais pobre atendida pelo programa.
A verba destinada ao Fundo de Arrendamento Residencial (FAR), que financia os imóveis da faixa 1 do programa (para famílias com renda de até R$ 2,640 mil), é de R$ 9,2 bilhões. Houve uma desidratação de R$ 1,2 bilhão em relação à proposta original do governo, de agosto do ano passado.
Já os recursos destinados à parte do programa que financia habitação a famílias de classe média recebeu um aporte de R$ 18,13 bilhões do Fundo Social, formado por receitas do pré-sal. Desse montante, R$ 15 bilhões serão usados para bancar a criação de uma nova faixa do programa, voltada para famílias com renda até R$ 12 mil — hoje, o limite é de R$ 8 mil.