Orçamento secreto: Congresso já tem planos para perpetuar esquema

Líderes do Centrão querem vincular execução do Plano Plurianual (PPA) ao pagamento de emendas secretas, garantindo manutenção do esquema sob pretexto de resgatar planejamento estratégico do Orçamento

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Atualização:

BRASÍLIA - Líderes do Centrão na Câmara e no Senado querem usar o Plano Plurianual (PPA), proposta que define os programas prioritários do governo federal durante quatro anos, para validar o orçamento secreto e blindar essas emendas de cortes durante o próximo mandato presidencial. A articulação faz parte da estratégia para evitar que as emendas sejam derrubadas pelo Supremo Tribunal Federal (STF).

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No desenho feito por líderes da Câmara e do Senado, o PPA seria usado para carimbar programas de interesse dos deputados e senadores. Essas ações, por sua vez, seriam irrigadas com dinheiro do orçamento secreto. Com essa manobra, parte dos programas prioritários só seria executada com as emendas secretas, amarrando o projeto às verbas de maior interesse do Congresso.

O orçamento secreto, revelado pelo Estadão, consiste no pagamento de emendas carimbadas pelo relator-geral do Orçamento para redutos eleitorais de deputados e senadores sem transparência. O governo libera esses recursos em troca de apoio político no Legislativo.

Para 2023, estão reservados R$ 19,4 bilhões para o orçamento secreto, que aumenta o domínio do Legislativo sobre os investimentos federais e a manutenção dos órgãos públicos. O Congresso age para manter o controle independentemente do resultado das eleições presidenciais.

Atualmente, as emendas já estão vinculadas a programas do PPA. Pelas regras do Congresso, um recurso só entra no Orçamento se estiver de acordo com o plano plurianual. O projeto, no entanto, traz programas genéricos e abarca praticamente qualquer recurso que um parlamentar queira destinar para sua base eleitoral. A ideia agora é condicionar a execução do PPA às emendas secretas, sob o pretexto de tornar o projeto efetivo e ao mesmo tempo manter o esquema.

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O PPA é enviado pelo presidente da República sempre no primeiro ano de mandato e define os programas que deverão ter prioridade no Orçamento nos quatro anos seguintes, como saneamento básico e moradia. Ou seja, o presidente eleito terá que enviar a proposta para os anos de 2024 a 2027. O Congresso tem duas opções para mexer no PPA: alterar o projeto em vigor (2020-2023), que depende de proposta inicial do presidente da República ao Congresso, ou alterar o próximo plano, que vai valer para os anos de 2024 a 2027.

A prioridade dos deputados e senadores é efetivar a mudança logo, mas ainda não há uma definição de quando isso será feito. O Congresso está de olho no PPA justamente para garantir a execução do orçamento secreto nos próximos anos e apresentar uma defesa ao STF com o argumento de que está vinculando as emendas a projetos estratégicos do País. Dessa forma, os parlamentares esperam blindar o mecanismo.

Judiciário

Uma decisão do Judiciário contra as emendas é vista com preocupação pelos parlamentares. Nos bastidores, líderes do Centrão ameaçam retaliar o Supremo, com corte de verbas e até com a aprovação de uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) para derrubar decisões dos ministros. A presidente do STF, Rosa Weber, avalia pautar um julgamento que pode acabar com o orçamento secreto após o segundo turno das eleições. Essa possibilidade ganharia força se o candidato do PT à Presidência, Luiz Inácio Lula da Silva, for eleito, de acordo com dirigentes do Legislativo.

Os congressistas esperam emplacar uma narrativa de que as emendas atendem a interesses nacionais e necessidades da população, mesmo sendo distribuídas no varejo entre os parlamentares. A ausência de planejamento estratégico e a desigualdade regional na transferência dos recursos são pontos questionados no STF, que julga um processo sobre a validade do orçamento secreto, além da falta de transparência. O Tribunal de Contas da União (TCU) apontou ilegalidades na distribuição e classificou as emendas secretas como inconstitucionais.

O uso do PPA é uma alternativa à aprovação de uma PEC que inclua o orçamento secreto de forma definitiva na Constituição, opção que continua no radar. Parlamentares dizem que a aprovação de uma PEC acabaria com qualquer risco de o STF derrubar o esquema. Uma proposta como essa, no entanto, depende da aprovação de 308 deputados e 49 senadores em dois turnos de votação e não precisa passar pelo crivo do Executivo.

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O PPA não dependeria de mudança na Constituição e pode garantir maior segurança e até a obrigatoriedade de pagamento das emendas nos próximos anos. As emendas secretas não estão previstas na Carta Magna e entraram no Orçamento por meio de alterações na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e de uma resolução do Congresso. Em 2019, o próprio presidente Jair Bolsonaro enviou o projeto que criou o esquema, após vetar uma proposta relacionada ao tema.

A presidente do STF, Rosa Weber, avalia pautar um julgamento que pode acabar com o orçamento secreto Foto: Dida Sampaio/Estadão

Controle de Orçamento

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A articulação do Congresso passa por aumentar o poder da Comissão Mista de Orçamento (CMO) na aprovação das emendas do orçamento. Em 2023, todos os recursos dependerão da assinatura do presidente da comissão, deputado Celso Sabino (União-PA), aliado do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), para serem pagos, além da decisão do governo de liberar os repasses. Anteriormente, a indicação só dependia da assinatura do relator-geral e já ficava pronta para o Executivo efetuar o pagamento. O relator do Orçamento de 2023 é o senador Marcelo Castro (MDB-PI), aliado do ex-presidente Lula.

A intenção dos parlamentares é transformar a CMO no “coração” do orçamento secreto e assim validar a indicação das emendas. Integrantes do colegiado dizem que, usando o PPA para fixar as emendas, é possível dar continuidade a obras e projetos de interesse do Congresso e evitar paralisações e questionamentos dos órgãos de controle.

O deputado Celso Sabino (União-PA) é o presidente da Comissão Mista de Orçamento (CMO).  Foto: Alexssandro Loyola/PSDB

“A participação do Congresso do Brasil precisa se adequar à realidade global de protagonismo no Orçamento, claro que à luz dos holofotes dos órgãos de controle”, afirmou o presidente da CMO, Celso Sabino, ao falar que o colegiado tem adotado medidas para planejar a distribuição dos recursos entre as regiões do País.

O PP e o União Brasil, partidos de Lira e de Sabino, respectivamente, negociam formar uma federação partidária ou até uma fusão depois das eleições, o que transformaria a nova legenda no maior partido da Câmara, com 106 deputados. Na prática, a junção garante o controle da CMO e da elaboração do Orçamento pelos próximos quatro anos. O maior partido da Casa tem preferência na escolha de cargos estratégicos, como o de presidente da comissão e de vagas na CMO. “É uma força gigante”, disse Sabino. No cenário atual, o PL, partido do presidente Jair Bolsonaro, poderia reivindicar o comando do colegiado.

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Nos bastidores, dirigentes do Congresso afirmam que o orçamento secreto continuaria sendo executado em caso de reeleição do presidente Jair Bolsonaro (PL). A vitória do candidato do PT, Luiz Inácio Lula da Silva, por outro lado, provocaria uma disputa maior pelo controle dos recursos. Lula prometeu acabar com o esquema e quer retomar o poder de escolha sobre o Orçamento. A cúpula do Legislativo age para proteger o mecanismo e diz que os deputados e senadores não vão recuar do que conquistaram até o momento.

Em discurso na capital paulista, nesta segunda-feira, 17, Lula criticou o Congresso eleito e admitiu que não conseguirá mexer no Orçamento de 2023, que deve ser aprovado ainda neste ano com R$ 19,4 bilhões emendas do orçamento secreto. Nas palavras do petista, o Congresso eleito “mudou para pior”.

“Como é que eu posso enfrentar o orçamento secreto?”, disse Lula em um evento com líderes religiosos. “Eu não sei se é possível, Haddad, mas nós podemos incluir, tanto a nível de Estado quanto a nível nacional o orçamento participativo”, afirmou o petista, se dirigindo ao candidato do PT ao governo de São Paulo, Fernando Haddad. “Só para 2024, porque o Orçamento de 2023 já está pronto.”

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