O ouro ultrapassa a casa dos US$ 3 mil, com as turbulências de Trump no radar de investidores e BCs

Preço do produto tem sido impulsionada mais recentemente pelas preocupações de investidores com os rumos da economia global, em meio a uma guerra tarifária

Por Bloomberg
Atualização:

Os preços do ouro ultrapassaram a casa dos US$ 3 mil a onça (31,1 gramas) pela primeira vez na história, impulsionados por uma onda de compras dos bancos centrais, pela fragilidade econômica em todo o mundo e pelas tentativas do presidente Donald Trump de reescrever as regras do comércio global, impondo tarifas a aliados e rivais estratégicos.

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O ouro subiu até 0,4% nesta sexta-feira, 14, atingindo US$ 3.001,20.

Esse movimento faz com que o ouro volte a desempenhar seu papel secular como reserva de valor em tempos turbulentos e como indicador do medo nos mercados. No último quarto de século, o preço do produto aumentou 10 vezes, superando até mesmo o S&P 500, a referência para as ações dos EUA, que quadruplicou no mesmo período.

Ouro ganha cada vez mais espaço como reserva de valor Foto: Akos Stiller/Bloomberg

Com aumento de tarifas no horizonte, os preços do ouro nos EUA subiram acima de outras referências internacionais, o que levou os negociantes a correr com o produto para os Estados Unidos em grandes volumes antes que as tarifas entrassem em vigor. Mais de 23 milhões de onças de ouro, no valor de cerca de US$ 70 bilhões, entraram nos depósitos da bolsa de futuros Comex, de Nova York, entre o dia da eleição e 12 de março. O influxo foi tão grande que ajudou a levar o déficit comercial dos EUA a um recorde em janeiro.

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Os saltos no preço do ouro normalmente acompanham tensões econômicas e políticas mais amplas. O metal ultrapassou a marca de US$ 1 mil por onça após a crise financeira de 2008 e passou de US$ 2 mil durante a pandemia de covid. Os preços caíram para US$ 1,6 mil após a pandemia, mas começaram a subir novamente em 2023, impulsionados pelos bancos centrais, que compraram barras de ouro para ter uma alternativa ao dólar, temendo que a moeda os tornasse vulneráveis a ações punitivas dos EUA.

No início de 2024, o mercado deu um novo salto, impulsionado pelas compras na China, onde as preocupações com a economia do país estavam crescendo. A recuperação ganhou mais impulso após a eleição dos EUA, pois os mercados absorveram a política comercial agressiva do novo governo.

“O ouro é um ativo capaz de preservar o valor sob a maior variedade de turbulências macroeconômicos que já vimos”, disse Thomas Kertsos, cogerente de portfólio da First Eagle Investment Management. “Temos visto que, ao longo dos séculos, o ouro tem sido capaz de - apesar da volatilidade - sempre reverter a média e sempre manter seu poder de compra, ao mesmo tempo em que proporciona uma liquidez significativa”.

A recente recuperação do ouro ocorreu apesar do que normalmente seriam ventos contrários: taxas de juros mais altas e um dólar americano forte. Quando os títulos ou o dinheiro no banco oferecem um retorno sólido, o ouro, que não gera juros, torna-se menos atraente. O dólar americano é a principal moeda na qual o ouro é comprado e vendido. Quando ele se torna mais caro para os detentores de outras moedas, isso normalmente leva a uma pressão de venda sobre o metal.

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Desta vez, essas mesmas forças trouxeram novos compradores para o mercado. Com o afundamento do yuan em relação ao dólar, os investidores chineses se juntaram a eles. A inflação persistentemente alta em todo o mundo também aumentou o apelo do ouro como reserva de valor. Além disso, há o receio dos investidores de perder o ganho mais recente do ouro.

“Muitos investidores perderam a chance quando o ouro passou por US$ 2,4 mil, US$ 2,5 mil, US$ 2,6 mil. Ficamos dizendo: ‘Isso não vai durar, haverá uma correção e ele se consolidará’”, disse Philip Newman, fundador da consultoria Metals Focus. “Não foi nada disso que aconteceu. Acho que houve uma sensação de que os investidores não querem perder a chance de ganhar”.

Mas é a política comercial agressiva e imprevisível do novo governo dos EUA que tem sido o fator mais importante para o ouro em 2025. O presidente Trump impôs tarifas sobre o Canadá, o México e a União Europeia, e impôs taxas sobre produtos chineses e sobre todas as importações de aço e alumínio. Depois que a UE revidou com suas próprias tarifas, os EUA indicaram que aumentariam a crescente guerra comercial.

O governo Trump ameaçou com interrupções mais amplas na ordem global. O presidente indicou que os EUA estão dispostos a usar a coerção econômica - ou até mesmo a força - para assumir o controle da Groenlândia e do Canal do Panamá; e propôs um plano de reconstrução altamente controverso para Gaza. Desde que surpreendeu os aliados europeus em fevereiro ao anunciar que os EUA abririam negociações com a Rússia sobre o futuro da Ucrânia, o governo Trump colocou em questão as garantias de segurança americanas sobre a Europa, que sustentaram a paz e a estabilidade por décadas.

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“Há uma enorme incerteza em relação à política dos EUA, que também está se refletindo na economia global este ano”, disse Ian Samson, gerente de portfólio de múltiplos ativos da Fidelity em Cingapura.

As bases para a alta do ouro

A recuperação do ouro foi parcialmente estabelecida pela cautela dos bancos centrais globais em confiar fortemente no dólar americano, também um reflexo da incerteza geopolítica.

Após a invasão da Ucrânia pela Rússia em 2022, muitos ativos russos em dólares mantidos no exterior foram congelados. Os bancos centrais tomaram nota: o dólar poderia ser usado como uma arma, com seu acesso ao sistema financeiro fechado por ordem dos EUA. Desde a invasão, a compra de ouro pelos bancos centrais dobrou, passando de cerca de 500 toneladas métricas por ano para mais de 1.000.

A China, que sucessivos governos dos EUA têm visto como um rival geopolítico, aumentou significativamente suas compras em 2022. Embora suas compras tenham diminuído à medida que os preços subiram, outros bancos centrais compensaram a falta, com a Polônia, a Índia e a Turquia liderando o ranking dos maiores compradores no ano passado, de acordo com o Conselho Mundial do Ouro.

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Apesar de sua recuperação, o ouro ainda está muito longe de seu pico histórico ajustado pela inflação, que foi estabelecido em 1980 e equivale a cerca de US$ 3,8 mil a onça. Naquela época, foi uma combinação de fraco crescimento econômico, inflação descontrolada e crescentes atritos geopolíticos que fizeram os preços dispararem, e alguns analistas acreditam que forças semelhantes manterão o ouro se movendo ainda mais para um território desconhecido em 2025.

A alta para US$ 3 mil foi mais rápida do que a maioria dos principais analistas previu. No último ano, quando o preço ultrapassou de forma decisiva os principais marcos psicológicos de US$ 2 mil e US$ 2,5 mil, a maioria dos analistas aumentou suas previsões, em vez de mudar de opinião. Alguns analistas já estão vendo o próximo grande marco.

“Para atingir US$ 3,5 mi/onça, a demanda de investimento precisaria aumentar 10%”, disseram os analistas do Bank of America, liderados por Michael Widmer, em uma nota de 12 de fevereiro. “Isso é muito, mas não é impossível”.

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