Uma nova fake news é ensaiada. Bolsonaristas mais radicais têm sugerido que a votação do presidente foi maior no 1.º turno. A fraude não alcançaria o voto para deputados e senadores. Como se um software ou algoritmo tivesse tirado votos apenas de Bolsonaro.
A eleição de bolsonaristas para o Congresso não desmentiria a tese de fraude nas urnas, neste argumento. Na verdade, seria evidência de que Bolsonaro teve votos subtraídos. A lógica é a seguinte: pela força demonstrada na eleição para o Parlamento, em que Bolsonaro conseguiu transferir votos a ex-ministros, sua votação deveria ter sido mais significativa.
Os resultados do 1.º turno indicariam que o eleitor votou para candidatos de Bolsonaro para vários cargos, mas em Lula para presidente – o que não teria explicação razoável.
A ideia foi jogada no ar, por exemplo, por Alexandre Garcia, o ex-jornalista da TV Globo. Ele lista bolsonaristas eleitos no 1.º turno, em particular para o Senado, questionando quem é que vota nesses candidatos “e no fim registra 13?”. Outro influenciador neste campo, também sem fazer afirmações, twittou: “O curioso caso do presidente que elege todos os seus candidatos, mas não confirma o mesmo número de votos para ele mesmo”. Os seguidores é que arrematam: foi fraude.
Se bolsonaristas venceram no 1.º turno, por que Bolsonaro também não levou a eleição no 1.º turno? A primeira parte da resposta é simples: o bom resultado em eleições locais não necessariamente se traduz no mesmo resultado na eleição nacional, já que há uma clara concentração regional do voto nos dois presidenciáveis. Lula também elegeu vários dos seus no domingo.
Mas o que é verdadeiramente falacioso no argumento, e pode convencer incautos, é o uso do resultado para o Senado como evidência. A eleição para senador não é majoritária, mas “segundo o princípio majoritário”. Não é preciso ter 50% + 1 dos votos para ganhar: apenas ser o mais votado. Não existe 2.º turno. Há bolsonarista eleito com 40%.
Vários dos listados por Alexandre Garcia tiveram menos votos, e não mais votos, do que Bolsonaro em seus Estados. Essa diferença aconteceu no RS, no DF, em SC, em RR ou no ES – nestes últimos três casos, por uma vasta margem.
Isto é, muitos eleitores votaram em Bolsonaro para presidente, mas não em seu candidato para senador, que ainda assim conseguiu ser eleito. O contrário do que se quer convencer.
O bolsonarista que vota Lula, talvez criado na sala-secreta do TSE, é o novo mito dessa eleição.
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