As novas tarifas anunciadas na quarta-feira, 2, pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, geraram perplexidade, ameaças de retaliação e pedidos urgentes de mais negociações para tornar as regras comerciais mais justas. Mas as respostas foram comedidas, destacando a falta de apetite entre os principais parceiros comerciais para uma guerra comercial total com a maior economia do mundo.
Trump apresentou os impostos de importação, que variam de 10% a 49%, em termos mais simples: os EUA farão com seus parceiros comerciais o que ele disse que eles vêm fazendo com o país há décadas. Ele argumenta que essas medidas atrairão fábricas e empregos de volta aos Estados Unidos. “Os contribuintes foram enganados por mais de 50 anos”, disse ele. “Mas isso não vai mais acontecer.”
O anúncio de Trump de uma nova tarifa de 20% sobre a União Europeia trouxe uma forte repreensão da presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen. Para ela, o anúncio foi um “grande golpe para a economia global”.

“As consequências serão terríveis para milhões de pessoas em todo o mundo”, disse von der Leyen. Alimentos, transporte e medicamentos custarão mais caro”, disse ela, ao visitar o Uzbequistão, “e isso está prejudicando, em especial, os cidadãos mais vulneráveis”.
No entanto, Von der Leyen não anunciou nenhuma nova medida de retaliação e enfatizou que a UE estava pronta para negociar com os EUA.
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Alguns analistas dizem que há pouco a ganhar com uma guerra comercial total, seja nos EUA ou em qualquer outro lugar.
“Se Trump realmente impuser tarifas altas, a Europa terá de responder, mas o paradoxo é que a UE estaria melhor se não fizesse nada”, disse Matteo Villa, analista sênior do Instituto de Estudos Políticos Internacionais da Itália.
“Por outro lado, Trump parece entender apenas a linguagem da força, e isso indica a necessidade de uma resposta forte e imediata”, disse Villa. “Provavelmente a esperança, em Bruxelas, é que a resposta seja forte o suficiente para induzir Trump a negociar e, em breve, a recuar.”
Até o momento, a estratégia da Europa tem sido limitar a retaliação às primeiras rodadas de tarifas, anunciadas anteriormente, a apenas alguns produtos politicamente simbólicos, como uísque bourbon e motocicletas, em uma tentativa de trazer os Estados Unidos para a mesa de negociações, em vez de entrar em uma guerra comercial total que poderia prejudicar sua economia, muito dependente de exportações.
Os economistas dizem que o próximo alvo podem ser as empresas de tecnologia dos EUA. Essas empresas se enquadram na categoria de serviços, na qual os EUA exportam mais do que importam para a Europa e, portanto, estariam mais expostas a retaliações.
A resposta de Bruxelas, que provavelmente estará pronta até o final de abril, inclui a opção de um imposto sobre os gigantes digitais dos EUA, disse a porta-voz do governo francês, Sophie Primas.
“Vamos visar serviços, como, por exemplo, serviços digitais que não estão sendo tributados no momento e que poderiam ser, como o GAFAM”, disse ela na rádio francesa RTL, usando um acrônimo coloquial para Google, Apple, Facebook, Amazon e Microsoft.
O chanceler alemão que está deixando o cargo, Olaf Scholz, disse que a UE não poderá simplesmente dizer que as tarifas são prejudiciais e que a região precisa mostrar que tem “músculos fortes”.
“Mas isso com o objetivo de chegar a um acordo, porque essa é a melhor coisa para a prosperidade dos Estados Unidos, para a prosperidade da Europa e para a prosperidade do mundo”, acrescentou.
‘Ninguém quer uma guerra comercial’
O primeiro-ministro britânico, Kier Starmer, disse que o governo do Reino Unido reagiria às tarifas de 10% com “cabeça fria e calma”, e informou aos líderes empresariais em Londres que espera suspender as tarifas com um acordo comercial com Washington. “Ninguém ganha em uma guerra comercial, isso não é de nosso interesse nacional”, disse Starmer.
O Japão, o aliado mais próximo dos Estados Unidos na Ásia, planeja analisar atentamente as tarifas de 24% dos EUA e seu impacto, disse Yoshimasa Hayashi, secretário-chefe do gabinete do primeiro-ministro. Ele evitou falar em retaliação.
Economia global atingida
Os mercados financeiros foram abalados, com os futuros de ações dos EUA caindo até 3% no início da quinta-feira. Uma queda de 2,8% no índice de referência de Tóquio liderou as perdas na Ásia. Os preços do petróleo caíram mais de US$ 2 por barril.
A avaliação dos analistas foi de que a medida abala a ordem comercial global e reverte décadas de esforços para reduzir as tarifas por meio de negociações comerciais e acordos de livre comércio.
“A magnitude da implementação — tanto em escala quanto em velocidade — não foi apenas agressiva; foi uma ruptura macroeconômica a todo vapor”, disse Stephen Innes, da SPI Asset Management, em um comentário.
Jim Reid, do Deutsche Bank, chamou o anúncio de “realinhamento radical de políticas” e disse que os EUA agora têm uma tarifa média de 25% a 30%, o “pior extremo das expectativas” e o mais alto desde o início do século XX.
Embora as ramificações de longo prazo possam incluir o desmantelamento de cadeias de suprimentos construídas ao longo de décadas, uma preocupação mais imediata é o aumento do risco de recessão.
“A taxa média de tarifas dos EUA sobre todas as importações está agora em torno de 22%, acima dos 2,5% em 2024. Essa taxa foi vista pela última vez por volta de 1910″, disse Olu Sonola, chefe de pesquisa econômica dos EUA na Fitch Ratings, em um relatório.
“Essa é uma mudança divisora de águas, não apenas para a economia dos EUA, mas para a economia global. É provável que muitos países acabem entrando em recessão. Eles podem descartar a maioria das previsões, se essa taxa tarifária permanecer em vigor por um longo período de tempo”, disse Sonola.
Minimizando os danos
Os países asiáticos, que estão entre os maiores exportadores para os Estados Unidos, prometeram tomar medidas rápidas para apoiar as montadoras e outras empresas que provavelmente serão afetadas.
O primeiro-ministro sul-coreano, Han Duck-soo, pediu às autoridades que trabalhassem com grupos empresariais para analisar o possível impacto da nova tarifa de 25% para “minimizar os danos”, informou o Ministério do Comércio.
O Ministério do Comércio da China afirmou que Pequim “tomará resolutamente contramedidas para salvaguardar seus próprios direitos e interesses”, sem especificar quais medidas específicas poderiam ser tomadas contra as tarifas de 34% anunciadas na quarta-feira, 2. O governo chinês reagiu a rodadas anteriores de aumento de tarifas impondo tarifas mais altas sobre as exportações de produtos agrícolas dos EUA e limitando as exportações de minerais estrategicamente importantes usados em indústrias de alta tecnologia, como a de veículos elétricos.
A presidente do México, Claudia Sheinbaum, disse que esperaria até esta quinta-feira para tomar medidas, quando ficasse claro como o anúncio de Trump afetaria o México, que, assim como o Canadá, foi isento da mais recente rodada de tarifas sobre produtos que já se qualificavam sob seu acordo de livre comércio com os Estados Unidos, embora as tarifas de 25% anunciadas anteriormente sobre as importações de automóveis tenham entrado em vigor nesta quinta-feira.
‘Estamos perplexos’
Alguns países, como a Austrália e a Nova Zelândia, criticaram as tarifas de 10%, mas afirmaram que não fariam retaliações. “Isso levaria a preços mais altos para os consumidores da Nova Zelândia e seria inflacionário”, disse o ministro do Comércio da Nova Zelândia, Todd McClay.
A tarifa de 29% imposta à pequena Ilha Norfolk, no Pacífico Sul, causou comoção. O território australiano tem uma população de cerca de 2 mil pessoas e sua economia gira em torno do turismo.
“Até onde sei, não exportamos nada para os Estados Unidos”, disse o administrador da Ilha Norfolk, George Plant, representante do governo australiano na ilha, à AP na quinta-feira. “Não cobramos tarifas sobre nada. Também não me lembro de nenhuma barreira não tarifária que tenha sido implementada, por isso estamos confusos.”/AP