PIB cresce 1,2% no segundo trimestre, acima da expectativa do mercado

Aumento do consumo puxou tanto os serviços, que representa cerca de 70% da economia, como a indústria; analistas esperavam alta de 0,9%

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RIO - Com a onda de contágios por causa da variante Ômicron do novo coronavírus, em janeiro, ainda mais para trás, os brasileiros puderam voltar a frequentar cada vez mais bares e restaurantes, hotéis, cinemas e salões de beleza, impulsionando o crescimento econômico do segundo trimestre. Puxado pelo setor de serviços, o Produto Interno Bruto (PIB, a soma de todo o valor gerado na economia) avançou 1,2% na comparação com o primeiro trimestre, informou nesta quinta-feira, 1, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

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O crescimento veio acima do 0,9% estimado por analistas em pesquisa do Estadão/Broadcast e foi generalizado: o setor de serviços apresentou alta de 1,3%; a indústria, de 2,2%; e agropecuária, de 0,5%, voltando a crescer após a queda verificada no início do ano, por causa da quebra da safra de soja.

Em seguida à divulgação dos dados, começou um processo de revisão para cima das projeções para o crescimento econômico do ano. Economistas do Bank of America (BofA) elevaram a estimativa para 3,25%, ante 2,5% anteriormente. A XP Investimentos vê o desempenho mais próximo de 3%. O banco Goldman Sachs elevou a projeção para 2,9%, ante 2,2% anteriormente. Em relatório, a equipe da Rio Bravo Investimentos vê um avanço anual mais próximo de 2,5%, em vez dos 2,0% atualmente projetados.

A força da “normalização” das atividades do setor de serviços, que já havia puxado a economia nos três primeiros meses do ano, garantiu um desempenho melhor do que o esperado na primeira metade de 2022. Antes mesmo da divulgação dos dados do PIB do segundo trimestre, economistas já esperavam um crescimento econômico em torno de 2% neste ano fechado, bem acima das projeções de variação perto de zero, consenso em janeiro.

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“A demanda reprimida da pandemia e a geração maior de empregos foram os principais fatores para o crescimento (no segundo trimestre). Ele está mais associado a uma melhora estrutural da economia do que a uma melhora cíclica por impulsos do governo”, afirma a economista-chefe do Banco Inter, Rafaela Vitoria.

Clientes frequentam restaurante em São Paulo: normalização do funcionamento de negócios do setor de serviços puxou a economia no segundo trimestre Foto: Tiago Queiroz/Estadão

A demanda ficou “reprimida” porque as famílias passaram dois anos sem poder frequentar normalmente bares e restaurantes e demais serviços que dependem de contato pessoal. Neste ano, os consumidores retomaram esses gastos com força. Com isso, pela ótica da demanda do PIB, o consumo das famílias – cerca de metade dele é direcionado para os serviços – avançou 2,6% ante o primeiro trimestre, enquanto a formação bruta de capital fixo (FBCF, a conta dos investimentos no PIB) avançou 4,8%.

Com o crescimento, o consumo das famílias atingiu no segundo trimestre o maior nível da série histórica do PIB, iniciada em 1996, mostram os dados do IBGE. Embora seja positivo, o recorde, que anteriormente fora registrado no quarto trimestre de 2014, aponta para uma economia estagnada num período de oito anos. O PIB agregado ainda está 0,3% abaixo do nível máximo, registrado no primeiro trimestre de 2014.

Para Silvia Matos, pesquisadora do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV) e coordenadora do Boletim Macro Ibre, a alta do consumo pode ser classificada como um “mini-boom”. A economista lembrou que, desde meados do ano passado, analistas vinham ressaltando que o fim da pandemia poderia provocar tal impulso, pois as famílias, especialmente as de maior renda, seriam liberadas para gastar parte relevante de seus rendimentos em serviços, como sempre costumavam fazer.

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Inicialmente, se esperava a recuperação da demanda reprimida para as festas de fim de ano de 2021, mas ela não veio. Em seguida, uma parte do movimento ocorreu no primeiro trimestre deste ano. Agora, ele parece ser vindo com força no segundo trimestre. “Neste (segundo) trimestre parece ter sido isso. As pessoas foram para festas, casamentos. Acumulou tudo”, diz Matos.

Para além dessa recuperação “cíclica”, relacionada à normalização, Vitória, do Banco Inter, cita o desempenho dos serviços administrativos e de tecnologia da informação como sinais de “melhora estrutural” da economia. “Atribuímos isso aos novos marcos regulatórios aprovados, como a Lei da Liberdade Econômica”, diz a economista.

Empregos

Além disso, como as atividades que voltaram ao normal estão entre as que mais empregam no País, a geração de vagas de trabalho também ajuda a sustentar a demanda doméstica. No segundo trimestre, a população ocupada aumentou em 3,1% na comparação com os três primeiros meses do ano, o que indica a abertura de 2,994 milhões de postos de trabalho, entre formais e informais, conforme dados já divulgados pelo IBGE.

Para a economia, o efeito é positivo, ainda que as vagas paguem salários, em média, menores e que a inflação corroa a renda. Pode não ser um ciclo virtuoso de aumento da demanda sustentada pelo mercado de trabalho, mas é mais um fator a impulsionar a demanda doméstica.

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“O salário médio real deverá ter queda no ano de 3%. Por outro lado, a ocupação (o número total de empregados) deverá crescer cerca de 9%. A massa de rendimento, que é a composição entre a ocupação e o salário médio, terá um crescimento importante”, diz Alessandra Ribeiro, sócia da Tendências Consultoria.

O ritmo de geração de empregos tem surpreendido economistas. Segundo Ribeiro, a quantidade de vagas criadas tem sido superior à estimada por modelos matemáticos que estabelecem correlações entre o nível de atividade econômica e o mercado de trabalho, com base nos padrões históricos. Por isso, diz a economista, já se debate, entre especialistas em mercado de trabalho, se a reforma das regras trabalhistas de 2017 não estaria incentivando a geração de empregos – a redução do risco de litígios trabalhistas no Judiciário e a flexibilização de regras estariam incentivando as contratações em meio à retomada, num ritmo superior ao padrão de outras recuperações da economia.

Um terceiro fator a impulsionar a demanda doméstica são as medidas do governo federal para apoiar a renda das famílias mais pobres. Entre elas, se destacam a elevação do Auxílio Brasil, programa que sucedeu o Bolsa Família, para R$ 400 ao mês – o aumento mais recente, para R$ 600, não teve efeito no segundo trimestre –, a antecipação do pagamento do 13º-salário de aposentados e pensionistas e a liberação de saques do FGTS. A normalização pode pesar mais, mas cálculos da Tendências estimam que somente a liberação de saques do FGTS adicionará 0,2 ponto porcentual no crescimento do PIB de 2022, conforme Ribeiro.

Inflação e juros

Os três fatores – a normalização das atividades, a geração de empregos e as medidas do governo – venceram dois obstáculos ao crescimento da demanda doméstica, a inflação elevada e a elevação dos juros para esfriar o ritmo da economia e, dessa forma, combater a pressão de preços. O IBGE ressaltou ainda que o crédito cresceu, apesar das taxas mais altas. O saldo das operações para pessoas físicas saltou 25,6%, em termos nominais, na comparação com o segundo trimestre de 2021, informou o IBGE.

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Segundo Matos, do Ibre/FGV, não é que a forte alta na taxa básica de juros empreendida pelo Banco Central (BC) – a Selic passou de 3,5% ao ano, no segundo trimestre de 2021, para 12,75% ao ano, em igual período deste ano – não tenha surtido efeito. O aperto monetário já apareceu no consumo de bens duráveis.

Só que os três fatores falaram mais alto do que os juros elevados na dinâmica da demanda doméstica, pelo menos até o segundo trimestre. “Isso prejudica o consumo das famílias, baixando a renda, aumentando o preço dos produtos e com juros mais altos nos empréstimos, mas, além da melhora no mercado de trabalho e do aumento do crédito, também temos recursos que foram liberados pelo governo a partir de abril”, afirma Rebeca Palis, coordenadora de Contas Nacionais do IBGE.

Para a segunda metade do ano, economistas seguem esperando que esses obstáculos ganhem protagonismo, levando a uma desaceleração no ritmo do crescimento. A dúvida é sobre a intensidade da freada. “A avaliação geral ainda é de desaceleração, depois de um primeiro semestre muito robusto. A discussão tem a ver com o grau dessa desaceleração. No nosso cenário, existe esse arrefecimento gradual”, diz Rodolfo Margato, economista da XP Investimentos.

Neste terceiro trimestre, as novas medidas do governo – além da elevação do Auxílio Brasil para R$ 600 por mês, são destaque os auxílios emergenciais para determinadas categorias profissionais, como taxistas e caminhoneiros – deverão dar um fôlego novo para a demanda, mas o efeito tende a ser temporário. Palis, do IBGE acha que ainda é cedo para estimar o quanto haverá de impacto.

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No lado dos mais otimistas, a economista Laiz Carvalho, do banco BNP Paribas, vê as novas medidas do governo federal mantendo o ritmo do crescimento econômico, com um avanço de 1% no PIB deste terceiro trimestre. No lado dos mais pessimistas, o economista-chefe da consultoria MB Associados, Sérgio Vale, viu os dados do segundo trimestre como positivos, mas acha que o fôlego pode ter se esgotado. A projeção da MB Associados para o quarto trimestre é de retração de 0,5% na comparação com o terceiro trimestre.

“O resultado foi bem positivo, mas muitos dos números do segundo trimestre são menos uma tendência e mais um ponto fora da curva do que ainda vamos ter no ano. O crescimento até continua, mas o segundo semestre tem desafios um pouco maiores, com o efeito da desaceleração nos preços das commodities (as matérias-primas com cotação internacional, um dos destaques da produção nacional) e dos juros elevados, que devem começar a impactar, principalmente, o quarto trimestre”, diz Vale, lembrando que o fim deste ano ainda deverá ser “tumultuado”, por causa das eleições gerais de outubro. / Colaboraram Isabela Bolzani, Marianna Gualter, Guilherme Bianchini e Cícero Cotrim

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