Piora dos mercados preocupa Fazenda, que teme efeito no juro e ‘bombas’ no Congresso; leia bastidor

Revisão das metas de 2025 e 2026 coincidiu com agravamento do cenário externo e com demandas crescentes de parlamentares por mais gastos

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Atualização:

BRASÍLIA – O dia seguinte à mudança nas metas fiscais de 2025 e 2026 foi de ressaca e preocupação no Ministério da Fazenda. O anúncio foi avaliado pela pasta como correto e ainda coerente com uma trajetória de estabilização da dívida pública, mas o timing não poderia ter sido pior.

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Coincidiu com o agravamento do cenário externo, que levou o dólar ao maior patamar em mais de um ano, e com notícias negativas vindas do Congresso Nacional – que podem tirar mais alguns bilhões de reais dos cofres públicos neste e nos próximos anos.

E tudo isso com o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, fora do País, em reunião do Fundo Monetário Internacional (FMI) em Washington, nos Estados Unidos. O Estadão apurou que a nova trajetória esperada para os juros norte-americanos, que tira a atratividade de países emergentes, não estava no cenário-base da equipe econômica, que teme os efeitos do repique do dólar sobre a inflação e, consequentemente, sobre a taxa de juros brasileira.

Haddad, em fala durante evento do FMI, atribuiu dois terços da piora do mercado ao cenário externo e apenas um terço às questões fiscais internas. Foto: Marcelo Camargo/Marcelo Camargo/Agência Brasil

Nesse cenário, o debate sobre um ciclo mais curto de cortes da Selic ganhou força, com parte do mercado já revendo os números. Uma taxa de juros estacionada em patamar mais elevado significa crédito mais caro, com impacto no PIB e na geração de empregos – tudo o que a ala política do governo não quer nem ouvir falar, em meio à queda de popularidade do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e a às vésperas das eleições municipais.

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Haddad, em fala durante evento do FMI, atribuiu dois terços da piora do mercado ao cenário externo e apenas um terço às questões fiscais internas. Mas esse um terço também está tirando o sono da equipe econômica – sobretudo após as últimas notícias vindas do Congresso.

Nesta terça-feira, a extinção do Perse, o programa que concede benefícios tributários ao setor de eventos, foi retirada de uma medida provisória (MP) editada pelo governo com o objetivo de eliminar o socorro criado na pandemia, visto como falho e suscetível a uma série de fraudes. Agora, a Fazenda tem até o fim de maio para construir um acordo de meio-termo em torno do projeto de lei que trata do mesmo assunto e já calcula os prejuízos.

As negociações com a relatora do tema, Renata Abreu (Podemos-SP), giram em torno da manutenção do limite de R$ 78 milhões para empresas que possam usufruir do benefício ou um faseamento mais curto para o fim do programa. O governo prevê gastar R$ 8 bilhões neste ano, caso o Perse não seja desidratado – valor que amplia o desequilíbrio fiscal.

A Fazenda se ressente, pois considera que age sozinha no esforço ligado às contas públicas – mesmo o ajuste ainda estando focado na parte arrecadatória, com pouca ênfase na reavaliação dos gastos. Há pautas no Congresso que beneficiam tanto o Legislativo quanto o Judiciário e que implicam forte aumento de despesas. Já o reajuste de servidores do governo, ao menos por enquanto, ficou mais distante, com as negociações voltadas para 2025 e 2026.

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Dentre as “pautas-bomba” está a PEC do Quinquênio, que ressurgiu no Senado sob patrocínio do presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (PSD-MG). A medida concede promoção automática a membros do Judiciário e faz pagamentos retroativos, o que teria impacto fiscal. Mas não é só isso: o benefício tem potencial de provocar um carrossel nas carreiras de Estado, gerando uma busca por privilégios também em outros setores do serviço público.

Pacheco tem dito que a expansão dos gastos ocorrerá dentro do Orçamento do Poder Judiciário e oferece em troca a aprovação do projeto de lei dos supersalários, que limita os pagamentos de servidores ao teto salarial do serviço público, atualmente em R$ 44 mil.

A leitura na Fazenda é que o ambiente no Congresso se tornou mais adverso neste ano. Se em 2023 foi possível aprovar medidas de ampliação de receitas por meio de negociações com líderes partidários no Congresso, neste ano, os líderes estão menos empoderados. Ganharam relevância os prefeitos e as demandas regionais e, neste contexto, ninguém deseja aprovar projetos que possam desagradar apoiadores locais.

Ao mesmo tempo, a eleição para as presidências da Câmara e do Senado, no início de 2025, deu mais poder ao baixo clero, eleitorado que vai escolher quem vai suceder Arthur Lira (PP-AL) e Rodrigo Pacheco (PSD-MG).

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Judicialização

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Neste cenário, é difícil barrar medidas que ampliam gastos como as desonerações da folha de pagamentos de prefeituras e de setores econômicos. E a previsão é que a divergência sobre esse tema seja levada ao Judiciário no “curtíssimo prazo”, segundo um interlocutor ouvido pela reportagem. Improvável, também, restringir o pagamento de emendas parlamentares.

Para dar lastro a essas despesas, a Fazenda cedeu no jabuti que permite a antecipação de até R$ 15,7 bilhões em novos gastos, o que era previsto apenas para o fim de maio mas que deve ocorrer ainda neste mês. A liberação antecipada foi uma decisão da Casa Civil, para honrar negociações políticas com parlamentares.

Segundo o líder do governo no Congresso, Randolfe Rodrigues (sem partido-AP), esses recursos serão usados para honrar o pagamento de R$ 3,6 bilhões em emendas parlamentares de comissão, que serão restabelecidas com a provável derrubada do veto do presidente Lula.

O restante bancará as desonerações, que não constavam no Orçamento deste ano, além do rescaldo da revisão do Perse.

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Novas medidas

Dessa forma, um novo cardápio de medidas arrecadatórias já está no radar da Fazenda, com ações que seriam apresentadas ainda em 2024 para que pudessem ter efeito a partir de 2025 – quando o cenário fiscal será ainda mais desafiador.

A equipe econômica rejeita a ideia de que reduzir a meta fiscal a zero em 2025, como anunciado nesta semana, seja desistir do compromisso com o ajuste nas contas do governo. Sem receitas extraordinárias, como em 2024, e com o aumento de despesas obrigatórias, a previsão é que será difícil obter a marca zero.

A estratégia da equipe de Haddad é tentar mostrar ao mercado que, apesar do mal-estar com a revisão do alvo, a mudança foi necessária para que o objetivo não caia em descrédito.

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