RIO E SÃO PAULO - A escalada do dólar ampliou a defasagem entre os preços dos combustíveis da Petrobras e as cotações internacionais dos derivados de petróleo, calculada pela Associação Brasileira dos Importadores de Combustíveis (Abicom). Ainda assim, conforme o Estadão/Broadcast apurou com pessoas a par da gestão de preços da estatal, esse descompasso não coloca a empresa na rota do reajuste. Um aumento dos combustíveis nesse momento teria um impacto direto na inflação, que já está em tendência de alta.
Uma avaliação do Citi corrobora essa tendência. O banco prevê que a potencial queda na cotação do petróleo nos próximos meses, combinada com a taxa de câmbio mais elevada, manterá estáveis os preços da Petrobras.
O banco também estima que a estatal poderia ter elevado seus resultados se, em maio de 2023, no governo Lula, não tivesse abandonado a política de preço de paridade de importação (PPI). Pelos cálculos do banco, as receitas no segmento downstream (a fase final da cadeia de fornecimento de petróleo) e o Ebitda (Lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização) em 2024 gerariam US$ 3 bilhões (aproximadamente 3% em valor de mercado) a mais se tivesse vigorado o PPI.
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De quanto é a diferença no diesel e na gasolina
Segundo a Abicom, o diesel da Petrobras está 16% (ou R$ 0,55 por litro) mais barato do que a média do mercado internacional. Na sexta-feira passada, 3, havia alcançado 19%, nível observado pela última vez em 3 de julho. À época, a estatal não reajustou o combustível.
A defasagem da gasolina da Petrobras medida pela Abicom está em 10%, ou R$ 0,29 por litro, atualmente. Mas, da última vez em que a companhia aumentou o valor do combustível, em julho passado, ele estava cerca de 20% abaixo dos valores praticados no exterior.
Desde então, a Petrobras não aumentou mais os preços. E, no momento, a tendência é de que siga assim. A explicação está na cotação do barril do tipo Brent, que segue flutuando perto dos US$ 75, inferior à média de anos anteriores. Assim como o dólar, o barril é um dos parâmetros que influenciam a precificação.
Em que pese a valorização nos últimos dias, com o Brent chegando a mais de US$ 77 e fechando a sessão de quarta-feira, 8, a US$ 76,16, a perspectiva da Petrobras e de analistas é de que esse preço permaneça estável ou caia ainda mais em 2025, compensando descolamentos ainda maiores do dólar, pelos parâmetros da nova política da companhia.
Em entrevista ao Estadão/Broadcast em 27 de dezembro, o diretor financeiro da Petrobras, Fernando Melgarejo, indicou não haver inclinação em mexer nos preços no momento. Questionado sobre o efeito dólar, ele disse “não haver correria para reajustar”.
“Consideramos que não há necessidade de ajuste de preço. A gente está num patamar confortável e seguindo a política de comercialização”, afirmou. Naqueles dias, a diferença entre o PPI e os preços Petrobras girava em torno de 13% e 15%, segundo a Abicom.
Melgarejo disse, ainda, que estava “cedo” para assumir um novo patamar para o dólar. Ele lembrou que a Petrobras precisa praticar preços competitivos para não perder fatia de mercado, citando o etanol, concorrente natural da gasolina, e os combustíveis trazidos para o País por importadores.
Por que o petróleo está em queda
O diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE), Bruno Pascon, prevê “mar calmo” para a precificação de derivados da Petrobras em 2025.
“Esse dólar traz sim pressão de reajuste para o preço da Petrobras. Virou o ano acima dos R$ 6,00, valorização acima dos 20% no ano, e pode perdurar. É uma incógnita onde isso vai parar. Mas o que já trouxe alívio ao Jean Paul (Prates) e continua para a Magda (Chambriard) é um preço de petróleo mais baixo”, diz Pascon.
“Tudo leva a crer que vai ser um ano de tranquilidade para a commodity, com preço (do Brent) entre US$ 70 e US$ 80 por barril, o que não traz pressão de reajuste (para combustíveis)”, acrescenta.
Segundo o especialista, o CBIE tem rebaixado as estimativas para o preço médio anual do Brent, que já foi de US$ 85, caiu para US$ 79 e agora já está em cerca de US$ 75 por barril, muito em função da demanda chinesa menor e da transição energética em velocidade maior do que a esperada no país asiático.
O analista de Inteligência de Mercado da StoneX, Bruno Cordeiro, reforça essa linha: “O dólar tem se comportado de maneira bem inesperada, e não é possível definir expectativas, mas no caso do Brent há, sim, uma tendência de desaceleração, com um entendimento de que uma demanda global menor vai exercer pressões baixistas nas cotações”, disse Cordeiro, que prefere não comentar a precificação da Petrobras.
Petrobras questiona método da Abicom
A Petrobras questiona o método da Abicom para calcular a defasagem. A companhia afirma ter maior escala do que importadores de pequeno e médio portes; que o PPI da Abicom é baseado nos preços do Golfo do México (EUA), enquanto o mercado brasileiro segue inundado por diesel russo mais barato; e que os números usam parâmetros que não se aplicam à realidade da estatal, como frete internacional.
A consultoria StoneX criou o PPI Golfo e o PPI mínimo, que considera preços de outras origens, como a russa. No início da semana, segundo o PPI Golfo da StoneX, a defasagem do diesel era de 16% ou R$ 0,56, mas cai para 9,5% ou R$ 0,33 no PPI mínimo. No caso da gasolina, em que o Golfo ainda é preponderante, essa defasagem era de 11,9% ou R$ 0,35.
Uma pessoa integrante da gestão da estatal ouvida pelo Estadão/Broadcast chega a contestar a tese de defasagem.
Qual é a avaliação de banco
O Citi avalia que, mesmo com a potencial queda na cotação do petróleo nos próximos meses, a Petrobras provavelmente não reduzirá os preços dos combustíveis, considerando que a taxa de câmbio mais elevada, ao favorecer as exportações, tende a compensar a eventual baixa da matéria-prima.
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O Citi menciona ainda que, apesar de manter recomendação neutra para os papéis da estatal, permanece com uma visão positiva de curto prazo sobre a Petrobras.
“Vemos a companhia como um bom nome para navegar por este período turbulento (de juros e câmbio mais altos), à medida que a companhia deve anunciar dividendos ordinários atrativos no curto prazo e pode ser um bom investimento até a próxima eleição no Brasil (2026)”, escrevem os analistas Gabriel Barra, Pedro Gama e Andrés Cardona, em relatório.