Após quase três meses de atraso ante o cronograma original, o governo protocolou oficialmente no Tribunal de Contas da União (TCU) o projeto de privatização do Porto de Santos. Os sucessivos adiamentos para a entrega final da proposta fazem com que o tema chegue à Corte com poucas perspectivas. Apesar de o governo insistir em prever o leilão neste ano, fontes que observam o processo já reconhecem esse cenário como, no mínimo, improvável. Além dos atrasos e da complexidade inerente ao caso, o projeto foi apresentado ao tribunal com outro complicador: a indefinição sobre o que será feito com a área em que o Ministério da Infraestrutura planeja transformar em um superterminal para movimentação de contêineres em Santos.
Caso o certame não ocorra neste ano, as chances de a privatização do maior complexo portuário da América Latina sair do papel são reduzidas. Primeiro colocado nas pesquisas de intenção de voto à Presidência, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) avalia paralisar o projeto, se eleito. Pelo menos é o que indica a equipe do petista responsável pelas propostas para a área de infraestrutura. A ex-ministra do Planejamento Miriam Belchior afirmou ao Estadão/Broadcast que o time de Lula tem “enorme preocupação” com o modelo formatado pelo governo Bolsonaro e que avalia como alternativa fazer a concessão de serviços específicos das companhias docas, como o de dragagem.
Como mostrou o Estadão/Broadcast no início do mês, antes de o projeto de privatização chegar oficialmente ao TCU, auditores do tribunal estavam cientes de que o presidente da Corte e relator da privatização, ministro Bruno Dantas, queria examinar o caso no menor prazo possível. À época, o governo indicava que enviaria a modelagem até 16 de setembro - previsão que não se cumpriu. Na ocasião, apesar da boa disposição no tribunal, a possibilidade de o certame sair em 2022 já era vista com ceticismo. Antes de bater o martelo, o Executivo precisa da aprovação do TCU, o que é seguido pela publicação do edital. Só depois, o leilão pode ser realizado.
O projeto foi formalmente protocolado na Corte na última sexta-feira, 23. Passado quase um mês, as perspectivas se deterioraram mais. Junto ao cronograma extremamente apertado, a falta de entendimento sobre o arrendamento do terminal para movimentação de contêineres (STS10) em Santos piora a situação, apontam fontes. No plano original do governo, o porto seria concedido à iniciativa privada com a área do STS10 já resolvida. A possibilidade ou não de armadores (empresas de navegação) disputarem pela administração do terminal, no entanto, atrasou bruscamente o calendário do governo.
O Executivo ficou encurralado em meio à briga do setor - que opôs companhias de navegação, que querem participar do leilão do STS10, e a Associação Brasileira de Terminais Portuários (ABTP), contra a entrada dessas empresas no certame. Como resultado, o projeto do STS10 não foi nem mesmo aprovado pela Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq) até o momento.
Com as dúvidas que pairam sobre o futuro do terminal, localizado na região do Saboó, na margem direita do porto, o governo chegou a prever a possibilidade de o arrendamento ocorrer previamente à data de assinatura do contrato de compra e venda das ações da companhia portuária, ao definir que o ágio nesse caso deverá ser destinado à União.
Na avaliação de uma fonte, contudo, a questão só será decidida no momento da publicação do edital de leilão de cada um dos projetos. Se os arrendamentos, tanto do STS10 quanto do STS53 (destinado à fertilizantes) estiverem mais maduros, aponta, seria possível realizar o certame das duas áreas e do porto. Já no caso de o edital de privatização do complexo portuário ser publicado primeiro, o recomendado seria segurar os arrendamentos, comunicando o setor e a sociedade de que a áreas serão endereçadas pelo futuro operador privado de Santos.
Procurado, o Ministério da Infraestrutura apenas informa que pretende enviar em outubro as propostas de arrendamento do STS10 e STS53 à Corte de Contas. “Como os projetos de desestatização e de concessão já estão em análise no Tribunal de Contas da União (TCU), os processos dos terminais portuários STS10 e STS53 seguem tramitando concomitantemente, com previsão de envio à Corte de Contas em outubro”. Na nota, a pasta ainda afirma que mantém a previsão de realizar o leilão do Porto de Santos no quarto trimestre deste ano, “a partir do prognóstico de que há tempo hábil para a realização do certame”.
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