RIO - Os preços no atacado vêm renovando recorde de quedas a cada nova divulgação do Índice Geral de Preços da Fundação Getulio Vargas (FGV). A deflação de custos, enfim, já chega ao varejo, e deve ajudar a moderar a inflação oficial do País nos próximos meses, aponta um estudo sobre a disseminação de aumentos de preços em diferentes estágios da atividade econômica, feito pelo Instituto Brasileiro de Economia da FGV (Ibre/FGV) a pedido do Estadão/Broadcast.
Dentro do Índice Geral de Preços - Disponibilidade Interna (IGP-DI) de maio, o índice de difusão do Índice de Preços ao Produtor Amplo (IPA-DI), que mostra a proporção de itens com aumentos de preços do atacado, ficou abaixo dos 30% pela primeira vez na série histórica iniciada em 2010: apenas 27,99% tiveram alta. No mês de junho, essa fatia caiu ainda mais, para 22,16%, ressaltou Matheus Peçanha, pesquisador responsável pelo levantamento do Ibre/FGV. O resultado significa que quase 80% dos produtos no atacado registraram queda ou estabilidade de preços no último mês.
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“Agora em junho foi também a primeira vez na série histórica que a difusão do IPA-Alimentos (itens alimentícios comercializados no atacado) ficou abaixo dos 30%: 28,21%”, acrescentou Peçanha.
Os cortes de preços de alimentos no atacado são os que mais se refletem em reduções também no varejo, cuja variação é medida pelo Índice de Preços ao Consumidor (IPC-DI), ressalta o pesquisador.
“Quanto ao IPC, agora em junho foi a primeira vez desde outubro de 2019 que a difusão do IPC-Alimentação ficou abaixo de 50% (48,03%), ou seja, mais da metade dos alimentos no supermercado nesse último mês caíram de preço ou ficaram com preço estável”, frisou Peçanha.
O IGP-DI de junho caiu 1,45%, com quedas de preços tanto no atacado, -2,13%, quanto no varejo, -0,10%. O IGP-DI acumulou uma retração de 7,44% em 12 meses, taxa mais negativa da série histórica iniciada em 1944. O resultado foi puxado pela deflação no atacado: o IPA-DI acumulou uma queda também recorde de 11,21% em 12 meses.
“Esses efeitos do IPA ainda não se materializaram integralmente no varejo. Ainda têm alguns repasses de quedas que podem favorecer um número mais baixo para a inflação ao consumidor este ano. Boa parte disso pode acontecer em alimentos ainda”, previu André Braz, coordenador dos Índices de Preços do Ibre/FGV.
Segundo Braz, repasses mais intensos das quedas de custos do atacado para o varejo podem levar o IPC a encerrar o ano de 2023 em patamar mais baixo do que o previsto. O mesmo vale para a inflação medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), apurado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
“Acontece o impacto no atacado, e três meses depois ele se transmite para o varejo”, calculou Braz. “O varejo tem uma série de coisas que podem influenciar: concorrência, margem de lucro, frete. Às vezes, o que gente vê no produtor não chega ao consumidor com a mesma intensidade”, ponderou.
O pesquisador Matheus Peçanha, do Ibre/FGV, construiu a série histórica do índice de difusão para a inflação pelo IPA-DI e pelo IPC-DI, fazendo diferentes exercícios de itens investigados para testar a lógica de repasse de custos do atacado para o varejo ao longo do tempo.
“Dentro dos bens livres, já é conhecido que os alimentos possuem uma dinâmica muito mais ativa nesse quesito de repasse de custos”, lembrou Peçanha. “Mesmo olhando para o curtíssimo prazo da trajetória da difusão dos itens alimentícios do IPA, já dá para ter um bom ‘insight’ do que vai ocorrer com a trajetória da difusão dos alimentos no IPC”, acrescentou.
Os produtos agropecuários, que concentram a maior parte dos itens alimentícios, acumulam uma queda de preços de 15,14% no atacado nos 12 meses encerrados em junho de 2023. Peçanha lembra que os alimentos respondem por quase 20% da cesta de consumo das famílias, ou seja, praticamente um quinto do cálculo da inflação ao consumidor.
“Se o IPA ainda está muito negativo, isso ainda é uma notícia favorável ao consumidor. Quer dizer, ainda há espaço para os alimentos caírem mais ao consumidor”, corroborou André Braz.
Braz prevê que o IPCA encerre 2023 com alta de 4,8%, seguido por aumento de 3,8% em 2024.“A inflação pode ficar dentro do intervalo de tolerância da meta de inflação em 2023″, ressaltou Braz. A meta de inflação para este ano perseguida pelo Banco Central é de 3,25%, com teto de tolerância de 4,75%.
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