Preço da comida: por que carne e café devem continuar em alta e impedir um alívio maior na inflação

Supersafra deve ajudar a reduzir preços, mas efeito será limitado com carne e café mais caros devido a questões como o dólar ainda alto e a expansão das exportações; inflação preocupa governo

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Embora a expectativa do mercado seja a de uma supersafra de soja para 2025, o que deve contribuir para um alívio nos preços agropecuários no atacado, as carnes e o café devem barrar uma desaceleração mais expressiva para os preços ao produtor — e, por consequência, ao consumidor ―, segundo economistas consultados pelo Estadão/Broadcast.

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A inflação dos alimentos tem sido uma das principais preocupações do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Sob a pressão da disparada dos preços, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad disse na semana passada esperar que um recuo no dólar, associado à esperada supersafra deste ano, viessem aliviar a inflação na mesa dos brasileiros.

O governo anunciou que irá avaliar a redução de tarifas de importação de alguns alimentos, além de trabalhar para diminuir os custos do vale-alimentação e do tíquete-refeição. A capacidade de essas iniciativas terem influência efetiva na inflação dos alimentos, porém, é vista com ceticismo.

Para economistas, carne vai ficar cara e ter efeitos políticos Foto: Werther Santana/Estadão

A safra recorde de grãos, cuja colheita começa neste trimestre, e o recuo recente do dólar podem fazer com que a inflação dos alimentos saia da casa dos 8%, em 2024, para algo em torno de 6% neste ano, segundo economistas.

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O número, porém, ainda elevado. Ao longo do ano, a expectativa é a de que o crescimento da economia perca fôlego com o aumento da taxa de juros, reduzindo a demanda e, com ela, a pressão sobre a inflação.

A perspectiva de uma carne mais cara, que contribuiria para frear essa desaceleração nos preços, é sustentada pelo ciclo pecuário atual do boi gordo, além dos efeitos climáticos e depreciação do câmbio, que marcaram o fim de 2024. Adicionalmente, observam os analistas, a expectativa de um aumento das exportações brasileiras deve ser mais um vetor de pressão.

Por consequência, o aumento da carne bovina contamina os preços de proteínas alternativas, como carne de frango, de porco, e também, o consumo de ovos.

“A carne vai ficar cara, e isso vai ter efeitos políticos. Vai ficar cara também em 2026 e 2027. Se tivesse de fazer uma aposta, a mais segura que eu teria é: o boi gordo vai ficar mais caro em 2025 e vai demorar um pouco para cair”, avalia o economista Francisco Pessoa, da LCA 4intelligence. O cenário da casa conta com alta de 17% do boi gordo na ponta e de mais de 35% na média anual em 2025.

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As carnes no atacado acumularam alta de 37,40% em 2024, segundo a Fundação Getulio Vargas (FGV).

Viés de alta nos preços

O economista Fabio Romão, também da LCA 4intelligence, avalia que, embora a expectativa seja de uma supersafra de soja para este ano, o viés para os preços no atacado é de alta. Segundo ele, as carnes seguirão em alta por razões setoriais. Há problemas de produção nos Estados Unidos e uma perspectiva de menor abate no Brasil.

“O raio de manobra para moderar os preços de alimentos é pequeno. Reduzir taxas para importação tem pouco ou quase nada de efeito, pode ajudar, mas com efeito muito pequeno. Mesmo que tivesse estoque regular, não sei quanto isso poderia ajudar. E, neste ano, os preços das carnes, bovinos principalmente, vão ter uma alta importante”, diz.

Ele reforça que a dinâmica atual das carnes exclui a possibilidade de uma queda nos agropecuários neste ano, que deve fechar em 4,7%, mais moderado que a alta de 15,20% em 2024. “Esse cenário de proteínas para este ano vai estar bem apertado”, frisa o economista.

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O economista da FGV Matheus Dias também descarta uma queda dos preços agropecuários neste ano, e lembra do cenário de dólar pressionado e dos repasses que foram adiados pela demanda de alguns setores, como o cafeeiro.

Só em 2024, o café em grão no atacado encerrou o ano com avanço de 120,40%, de acordo com a FGV.

“Boa parte da cesta que compõe o IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo, índice oficial de inflação) é de alimentos produzidos internamente e exportados, porque são competitivos, como arroz, carnes e café”, afirma Dias.

“O café possui um peso grande no IPA-Agro (índice de preços ao produtor amplo), a tendência é de que ele continue pressionando a inflação em 2025, mesmo que em um nível menor”, avalia. Além disso, Dias diz que o grupo de carnes deve se manter em alta e firmar a pressão no IPA em 2025.

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A quanto deve ir o IPCA dos alimentos

Romão, da LCA, avalia que, em menor medida, o IPA-Agro também pode contribuir para compreender a dinâmica da alimentação no domicílio do IPCA.

“Percebemos que as proteínas são um ponto de pressão importante no ano”, alerta o economista. A estimativa da casa é de que as carnes registrem elevação ainda na casa dos dois dígitos no IPCA em 2025, de 16,4%, após o avanço de 20,84% em 2024. Já a alimentação no domicílio deve passar de 8,23% para 8,2%./Com Mariana Carneiro e Ivo Ribeiro

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