Por que o preço do petróleo está caindo enquanto a guerra assola o Oriente Médio

Analistas afirmam que conflitos não alcançam, por ora, grandes produtores de petróleo; além disso, Estados Unidos continua tendo produção robusta, o que tranquiliza mercado

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Por Stanley Reed

THE NEW YORK TIMES - Conflitos intensos estão ocorrendo numa região onde está boa parte das reservas de petróleo do mundo. No entanto, depois de alguns dias de apreensão após o ataque do Hamas a Israel em 7 de outubro, os mercados de energia vêm caindo. O barril de petróleo Brent, referência internacional da commodity, está sendo vendido a cerca de US$ 80, mais barato do que quando os combates começaram.

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Por que os preços não estão mais altos? Uma das principais razões, segundo os analistas, é que o conflito, por mais terrível que seja, pouco impacta a oferta de petróleo, levando os fornecedores a concluir que não há ameaça direta.

“Embora eles percebam que há um risco maior, isso não levou a mais compras por precaução”, disse Richard Bronze, chefe de geopolítica da Energy Aspects, empresa de pesquisa de mercado com sede em Londres.

Em relação ao Oriente Médio, os mercados estão “efetivamente descartando que algo possa dar errado”, disse Raad Alkadiri, diretor de energia e clima do Eurasia Group, empresa de risco político.

A produção robusta de petróleo nos EUA tem tranquilizado os mercados Foto: Lucy Nicholson/Reuters

Para Alkadiri, é pouco provável que os fornecedores aumentem os preços, a não ser que vejam “os barris sumindo de verdade” do mercado.

Queda na demanda em evidência

O mercado parece estar ignorando a guerra e ter retomado o clima de pessimismo em relação à demanda futura de petróleo, dominado por preocupações econômicas com a China, o maior importador da commodity, e com outros grandes consumidores. A Arábia Saudita e outros produtores têm tentado manter os preços reduzindo sua produção de petróleo.

Os analistas estão chamando a atenção para a possibilidade de 2024 ser um ano difícil para os mercados de petróleo. Na semana passada, a Administração de Informações de Energia dos Estados Unidos calculou que o consumo de gasolina no país diminuiria no próximo ano por causa da maior eficiência dos motores dos veículos, do número crescente de carros elétricos e da redução de deslocamentos conforme mais pessoas trabalham em regimes híbridos.

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O clima pessimista fez com que os preços caíssem bastante antes do conflito entre Israel e o Hamas, e parece estar impactando o mercado mais uma vez, apesar dos riscos de uma guerra mais ampla.

A produção robusta de petróleo nos EUA também tem tranquilizado os mercados, com a oferta do maior produtor mundial atingindo recentemente um recorde mensal, de pouco mais de 13 milhões de barris por dia. “A base forte do mercado de petróleo está prevalecendo sobre quaisquer temores no momento”, disse Jim Burkhard, vice-presidente e chefe de pesquisa para mercados de petróleo, energia e mobilidade da S&P Global Commodity Insights.

Os ricos e os pobres

À medida que o conflito avança, os fornecedores descobriram que, quando o assunto é petróleo, há os ricos e os pobres no Oriente Médio. Gaza não produz petróleo, já Israel produz pouco. Para que haja um impacto real na oferta, os efeitos da guerra precisariam se espalhar para os campos de petróleo gigantescos da Arábia Saudita, do Iraque ou do Irã.

No início do conflito, o ministro das Relações Exteriores do Irã solicitou um embargo ao petróleo contra Israel, evocando memórias daquele de 50 anos atrás. Mas os tempos mudaram: devido às preocupações com o papel dos combustíveis fósseis na mudança climática e com a dependência do petróleo para as receitas, qualquer medida desse tipo correria o risco de sair pela culatra para os países que impusessem tal proibição. O Irã correria o risco de se indispor com a China, o principal cliente da república islâmica.

“É pouquíssimo provável que o risco à oferta venha de uma decisão independente de restringir as vendas de petróleo pelo Irã ou pela Opep”, disse o Eurasia Group em um comunicado recente. “Qualquer medida desse tipo provocaria danos tanto para os produtores – se não mais para eles – como para os consumidores.”

Ainda há riscos

Uma interrupção não é impossível. Quatro anos atrás, um ataque com mísseis contra uma instalação saudita importante – que as autoridades americanas atribuíram ao Irã – interrompeu temporariamente cerca de metade da produção de petróleo do país.

Na pior das hipóteses, o Irã, principal apoiador do Hamas, poderia tentar bloquear o estreito de Ormuz, através do qual volumes enormes de petróleo chegam ao restante do mundo. “Ainda acho que há um risco considerável de que isso se espalhe”, disse Helima Croft, chefe de commodities do RBC Capital Markets, um banco de investimento.

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Ela disse que a aparente complacência em relação ao impacto da guerra pode ter como origem, em parte, o prejuízo dos fornecedores quando o preço do barril disparou para mais de US$ 120 depois da invasão da Ucrânia pela Rússia, mas depois caiu rapidamente.

“O mercado simplesmente não tem mais limiar de atenção para esse tipo de questão”, afirmou.

Helima, ex-analista da CIA, disse que o aparente sucesso dos primeiros dias da invasão do Iraque em 2003 pelos EUA acabou levando a um conflito que se prolongou durante anos. “Ainda podemos ser pegos de surpresa por algo desagradável no Oriente Médio”, afirmou.

O governo Biden está tentando impedir que a guerra se espalhe. As potências do petróleo na região, entre elas o Irã, também prefeririam manter o tráfego dos navios-tanque no Golfo Pérsico. Qualquer interrupção prejudicaria os lucros de suas exportações, enquanto o aumento dos preços arriscaria atrapalhar e afastar seus clientes mais valiosos.

“É provável que o conflito continue limitado e não se espalhe para os grandes produtores de petróleo da região ou para as principais rotas marítimas”, disse Bronze, da Energy Aspects. “Os riscos maiores são de um cálculo errado ou avaliação incorreta”, acrescentou.

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