Como a demanda no mercado internacional pode ajudar a manter os preços dos ovos nas alturas

Maior parte da produção brasileira permanece no País, mas se oferta global continuar em baixa e demanda em alta, preços internos serão pressionados

Foto do author Pablo Santana

Não é apenas o Brasil que enfrenta um cenário de alta nos preços dos ovos neste início de ano. A produção de ovos em grandes economias tem sido impactada por surtos de gripe aviária e, para atender à demanda crescente por essa fonte de proteína, muitos países aumentaram suas importações − condição que afeta o preço do produto no mercado internacional.

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Nos últimos dias, a Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO) emitiu um alerta cobrando mais ações globais para conter o avanço da doença. Segundo a agência, a propagação da gripe aviária já impactou a segurança alimentar e o fornecimento de alimentos em diversos países, provocando uma disparada dos preços do ovo.

Na Europa, Polônia, Hungria, Reino Unido e Alemanha enfrentam restrições na produção. No entanto, a situação mais crítica ocorre nos Estados Unidos. Com 40 surtos confirmados em nove Estados, cerca de 30,3 milhões de aves foram sacrificadas em 2025, de acordo com o Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA). Essa perda representa 8,5% do total de 355 milhões de aves poedeiras do país. Em dezembro do ano passado, outras 13 milhões de aves morreram devido à doença.

Para mitigar a crise, o governo Trump anunciou no último mês um plano de US$ 1 bilhão para reduzir os preços dos ovos. A estratégia inclui medidas para facilitar a importação, reforço na biossegurança, auxílio a produtores e investimentos em vacinas.

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Pressão americana

Os Estados Unidos são o segundo maior exportador de ovos do mundo e no ano passado produziu cerca de 93 bilhões de ovos. No entanto, passam por uma crise que deve encarecer − no varejo −, os preços do produto em 41% somente neste ano, conforme projeções do USDA.

Na falta, o governo americano tem recorrido às importações para compensar a queda na produção de ovos. Em fevereiro, a redução foi de 9% em relação ao mês anterior. Brasil, Turquia e Coreia do Sul estão entre os novos fornecedores.

A Turquia informou recentemente o envio de cerca de 15 mil toneladas de ovos para os Estados Unidos, como parte de um acordo temporário firmado até julho. Mas analistas têm sido bem céticos sobre a validade da parceria, tendo em vista a guerra comercial promovida por Trump e a escalada da demanda − não só pela maior procura no mercado internacional. Internamente, o mês sagrado muçulmano do Ramadã intensifica a procura por alimentos, entre eles, o ovo.

Além disso, os EUA vêm flexibilizando normas de importação para atrair novos fornecedores europeus, a Holanda, atualmente a maior exportadora mundial, é uma das alternativas. Fatores logísticos também dificultam a importação de ovos da Europa pelos Estados Unidos, como o alto custo do frete aéreo e a necessidade de controle rigoroso de temperatura no transporte marítimo, o que pode comprometer a qualidade do produto.

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Gripe aviária tem feito EUA recorrerem às exportações de ovos e aumentado o preço no mercado global.  Foto: Pedro Kirilos/Pedro Kirilos/Estadão

Nesse cenário, o Brasil desponta como um dos principais fornecedores. Em fevereiro, as exportações brasileiras para o mercado americano cresceram 93,4% na comparação anual e 128,6% em relação ao mês anterior, totalizando 503 toneladas enviadas. Com esse desempenho, os Estados Unidos passaram a ocupar a segunda posição entre os importadores, segundo a Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA)

O aumento da presença do produto brasileiro no mercado americano foi por conta de mudanças nas normas locais, que agora permitem o uso de ovos brasileiros no processamento de alimentos para consumo humano. Embora a venda direta ao consumidor ainda não seja permitida, os especialistas acreditam que a tendência é de aumento nas vendas e possíveis revisões regulatórias, caso a oferta interna dos EUA continue insuficiente.

Impactos no mercado brasileiro

Apesar do crescimento das exportações para os EUA, ainda não é possível afirmar que essa demanda tem impactado na oferta interna ou nos preços do ovo no Brasil, segundo Juliana Pila, analista de mercado da Scot Consultoria.

“No Brasil, a atual alta de preços é mais sazonal e também reflete o aumento dos custos de produção da avicultura de postura. As exportações representam apenas 1% da produção nacional. Ou seja, a maior parte da produção abastece o mercado interno”, explica a analista.

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Nos dois primeiros meses de 2025, o Brasil exportou 4.884 toneladas de ovos, um aumento de 38,2% em relação ao mesmo período do ano anterior. No mesmo intervalo, as receitas avançaram 41,8%, totalizando US$ 9,122 milhões, contra US$ 6,433 milhões em 2024. Entre os principais destinos do ovo brasileiro estão Emirados Árabes Unidos, México, Chile, Japão e Angola.

No entanto, caso os Estados Unidos não consigam conter o surto e outros países busquem o Brasil para suprir a menor oferta global, o mercado externo pode continuar atraente e se tornar um fator adicional na escalada dos preços domésticos do ovo que, segundo a inflação oficial do País, acumulam alta de 16,4% no ano.