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BAMIN. Foto: Bamin/Divulgacao
Foto: Bamin/Divulgacao

Projeto da Bahia Mineração é atrativo, mas avaliação é que investimento alto pode ser um entrave

Empreendimento, em fase de negociação com Vale, Cedro e BNDESPar, está desenhado para produzir 26 milhões de toneladas de minério com alto teor de ferro; projeto precisa de R$ 30 bi para sair do papel

Foto do author Ivo Ribeiro
Foto do author Bianca Lima
Atualização:

SÃO PAULO e BRASÍLIA - A Bahia Mineração (Bamin) vai completar 15 anos sob a gestão do Eurasian Resources Group (ERG), com origem no Cazaquistão e sede em Luxemburgo, sem concretizar seu projeto. Mas, para especialistas do setor, isso não significa que não é um investimento atrativo.

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No momento, o empreendimento está na fase de garantir um pacote bilionário de financiamento para ser concluído até o final de 2028. Os governos federal e estadual trabalham várias fontes de recursos, entre elas o BNDES. Ao mesmo tempo, a Vale negocia a compra do controle da empresa, que desde 2010 é do grupo ERG, do Cazaquistão, em parceria com a Cedro Participações e o BNDESPar (leia mais aqui).

O projeto integrado da Bamin, desenhado para fazer 26 milhões de toneladas de minério com alto teor de ferro (de 65,5% a 68%), é classificado como de “porte relevante”. Um fator importante nessa análise é o tipo de produto final, o pellet-feed, de alta qualidade, um material muito desejado pela indústria do aço.

É um minério usado para fabricar pelotas de ferro, insumo que as siderúrgicas buscam para seus altos-fornos, por exemplo. E não há grande oferta no mercado. Na fabricação do aço, contribui para reduzir emissões de dióxido de carbono (CO₂), hoje um dos grandes desafios da siderurgia mundial. Geralmente, apresenta teores de ferro acima de 67%.

A título de comparação, a Bamin é um projeto similar ao da Anglo American, localizado em Conceição do Mato Dentro (MG), que tem capacidade de produzir 26,5 milhões de toneladas de pellet-feed ao ano. Voltado para exportação, o minério concentrado é escoado, na forma de polpa, até um terminal no Porto do Açu, litoral do Rio de Janeiro, por meio de um mineroduto de 525 km. Ali, o minério é secado e colocado em navios que vão para o mercado asiático.

Também em Minas Gerais, em Congonhas, a CSN Mineração extrai e processa cerca de 33 milhões de toneladas da mina Casa de Pedra. O material, com elevado teor de ferro, é escoado pela ferrovia da MRS e exportado pelo Porto de Itaguaí (RJ). O foco da mineradora do grupo CSN, um dos controladores da MRS e dona integral do porto, é investir em novas plantas para expandir a produção de pellet-feed.

Reserva de minério de ferro da Bamin em Caetité (BA), na mina Pedra de Ferro, que deve produzir 26 milhões de toneladas por ano Foto: Bamin/Divulgação

Inicialmente, a expectativa da Bamin era extrair 19 milhões de toneladas ao ano. Suas reservas de minério de ferro ― formadas por rochas de hematita e itabirito ― foram descobertas em 2005 pelo geólogo e engenheiro de minas João Cavalcanti, em Caetité, município no sudoeste da Bahia, com 52 mil habitantes.

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Cavalcanti, no mesmo ano, fundou a empresa, mas logo a vendeu para a Zamin Ferrous, do investidor indiano Pramod Agarwal. Segundo informações de pessoas do setor, o geólogo baiano fez a transação por cerca de US$ 150 milhões. Em 2010, a Zamin transferiu o controle da empresa ao então grupo cazaque Eurasian Natural Resources Group (ENRC), ao vender os demais 50% da empresa. O ENRC passou a adotar o nome ERG em 2013, após enfrentar dificuldades no Reino Unido e ter de fechar o capital na Bolsa de Londres.

A mineradora baiana só iniciou operação comercial em janeiro de 2021, em escala reduzida, com a primeira exportação de minério de ferro em julho do mesmo ano para um cliente na Holanda. Até o final de 2023, produziu e vendeu 1,6 milhão de toneladas de minério tipo hematita (aflorado na terra), que requer pouco beneficiamento. Desde dezembro de 2023, por se tornarem não rentáveis com a logística atual, as operações estão paralisadas e a empresa teve de desligar boa parte dos seus funcionários.

Empresa precisa de R$ 30 bilhões para viabilizar mina, ferrovia e porto

O problema para o projeto sair do papel, desde o início, foi a combinação da logística ferroviária e portuária com a mina, formando um sistema integrado. Projetos dessa dimensão só se viabilizam no conceito de corredor logístico, com operação heavy haul (transporte de grande volume), para despachar a produção da mina ao porto.

O ponto crucial é que o negócio requer alto volume de recursos financeiros para ser implementado: a empresa informa que serão necessários mais US$ 5 bilhões (o equivalente a R$ 27 bilhões). Especialistas do setor ouvidos pelo Estadão estimam que pode chegar a US$ 6 bilhões (ou R$ 32,5 bilhões).

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O projeto é interessante, atrativo pela qualidade do seu produto, mas complexo, de elevado volume de investimento e de alto risco para um único investidor, dizem especialistas do setor. Para a Vale, seria o primeiro projeto totalmente greenfield (feito do zero) de minério de ferro desde Carajás (década de 1980).

Os estudos de criação da Fiol, em 2008, foram um alento para a nascente mineradora baiana, pois o traçado da ferrovia, com 1.527 km, entre Ilhéus e Figueirópolis, passava a 3 km da mina Pedra de Ferro. A Fiol teve as obras iniciadas em 2014. Após várias interrupções, elas foram paralisadas em dezembro de 2016.

Em 2021, o governo federal realizou a concessão do trecho 1 (Ihéus-Caetité), cujo leilão foi vencido pela Bamin. Dez anos se passaram desde o início das obras da ferrovia e a Fiol está inacabada em dois trechos e nem iniciada no terceiro (Barreiras-Figueirópolis).

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Dois anos e meio após vencer o leilão de concessão, a Bamin retomou as obras no início de 2023, num dos quatro trechos em que foi dividida, de 126 km, no sentido Ilhéus-Caetité. Segundo informação da empresa, por cláusula do contrato, ela teve de criar a Bamin Ferrovias e aportar R$ 670 milhões, com compromisso de entregar os 537 km desse trecho operando no segundo semestre de 2027. Se não fizer, poderá perder a concessão.

Embora já tivesse cerca de 60% de obras realizadas pela antiga estatal Valec — há informações de que são em torno de 50% —, o montante para concluir a obra está orçado em R$ 6,5 bilhões, segundo informa o diretor financeiro da Bamin, Alexandre Aigner.

Compromisso é entregar porto e ferrovia em 2027

O complexo portuário Porto Sul, em Ilhéus, já teve o compromisso de R$ 4,6 bilhões do Fundo da Marinha Mercante (FMM). Os recursos, por lei, só podem ser alocados em obras do terminal. O porto foi viabilizado somente após um convênio entre a empresa (obras offshore) e o governo baiano (obras onshore).

O primeiro estudo de impacto ambiental foi apresentado ao Ibama em 2009. Após vários entraves ambientais na área de instalação inicialmente prevista para o projeto, levando à mudança de local, a licença de instalação foi emitida em 2014.

Na área do porto, o governo baiano investiu na liberação de áreas para dar lugar ao TUP (Terminal de Uso Privado) dentro do porto, a cargo da mineradora, em alocação de famílias e em diversas obras de acesso, como pontes, viadutos, rotatórias e outras.

Falta dar partida às grandes obras, com altos investimentos ― a dragagem, o quebra-mar de 3,5 km desde a costa e a construção dos berços de atracação dos navios graneleiros, que vão levar mais de 200 mil toneladas de minério a cada carregamento. O compromisso de conclusão do porto e da ferrovia, com as agências de regulação, Antaq e ANTT, é setembro de 2027.

A Bamin admite que carrega uma dívida da ordem de R$ 2,5 bilhões no balanço anual de 2023, conforme informação divulgada em julho. Todo o valor, destaca a empresa, é com o próprio grupo controlador. O ERG aportou recursos na forma de mútuo direto (empréstimo entre acionista e empresa controlada). Apenas no ano passado, segundo a companhia, foram colocados R$ 800 milhões no projeto.

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