BRASÍLIA – A base do PT no Congresso aceita o pacote de medidas de contenção de gastos enviado pelo governo Lula – ainda que a contragosto – desde que haja mudanças na proposta para o Benefício de Prestação Continuada (BPC). Sobre o salário mínimo, o entendimento é de que o limite de aumento até 2,5% ao ano acima da inflação é mais palatável, embora o partido preveja forte exploração política pela oposição – não só no Congresso, mas também nas redes sociais.
A insatisfação sobre o BPC – pago a idosos e pessoas com deficiência de baixa renda – foi levada ao secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Dario Durigan, que já fez um aceno positivo em prol de alterações na proposta, em conversa com jornalistas na terça-feira, 10.
Pelas redes sociais, o líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE), afirmou que o partido quer três mudanças.
“Junto com técnicos do Ministério da Fazenda, a bancada do Partido dos Trabalhadores debateu três questões fundamentais: o conceito de benefício, a composição da renda e a vedação de dois benefícios na mesma família.”
Pela proposta da Fazenda, essa proibição vai acontecer porque o benefício social recebido por um membro de uma família passará a contar para a renda per capita. Na prática, se duas pessoas receberem o BPC, por exemplo, isso levaria ao cancelamento de um dos benefícios – o que também é visto por lideranças do Centrão como uma proposta dura.
O partido também quer tornar menos rígido o critério para acesso ao BPC por pessoas com deficiência. Pelo texto enviado pela equipe econômica, a pessoa teria de estar “incapacitada para a vida independente e para o trabalho”. O trecho é visto como duro demais e poderia levar ao cancelamento de milhares de benefícios.
Leia mais
Além disso, pela proposta do governo, passa a contar para a renda familiar os rendimentos do cônjuge e companheiro não coabitante, além da renda de irmãos, filhos e enteados (não apenas solteiros) coabitantes. Isso também precisaria ser flexibilizado, na visão do partido.
No último sábado, resolução do Diretório Nacional do PT, recomendou avaliação com profundidade sobre o tema.
“O PT recomenda a nossas bancadas que avaliem com profundidade e debatam com o governo os impactos da proposta que envolve o BPC, de forma que ela venha a incidir sobre eventuais desvios e fraudes ao sistema, preservando integralmente os direitos estabelecidos na Constituição”, diz trecho do documento.
No PT, a sensação é de que as mudanças podem fazer com que eleitores deixem de votar no partido, como fizeram em 2022, para votar em políticos da extrema direita, principalmente na região Nordeste – que foi decisiva para a vitória nas últimas eleições. Esse eleitor não é visto como um voto fiel e garantido, e que estaria mais sujeito ao ambiente econômico e às políticas sociais.
Do jeito que foi enviado, a estimativa do Ministério da Fazenda é de uma economia de R$ 2 bilhões por ano com o BPC, o que geraria uma economia total de R$ 12 bilhões até 2030.
Outras pressões
O pacote de corte de gastos do governo foi enviado ao Congresso em três textos. O projeto de lei que trata sobre o BPC é o que tem atraído a maior resistência. O texto será relatado pelo deputado Isnaldo Bulhões (MDB-AL), parlamentar próximo ao governo e aliado do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL).
Parlamentares dizem que o projeto deve ser desidratado. Além do BPC, há pressão do governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha (MDB), e da bancada do DF para retirar o limite que o governo federal propôs para o Fundo Constitucional do Distrito Federal (FCDF), que banca o custeio da máquina pública de Brasília, incluindo os profissionais de saúde, os bombeiros e os policiais.
Isnaldo é do mesmo partido de Ibaneis, o que reforça a pressão pela retirada da limitação ao fundo do Distrito Federal.
O segundo projeto, que é para mexer na lei complementar do arcabouço, é menos polêmico na Câmara, mas um ponto desagradou os parlamentares e também é questionado: o bloqueio às emendas parlamentares. O governo Lula quer uma autorização para bloquear até 15% dos recursos indicados por deputados e senadores no Orçamento.
O dinheiro seria usado para bancar o crescimento gastos obrigatórios da União, como aposentadorias, e cumprir o arcabouço fiscal. O relator desse projeto é o deputado Átila Lira (PP-PI), aliado do presidente da Câmara e mais distante do governo.
O pacote ainda tem uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) com mais mudanças no BPC, no abono salarial, no Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb) e nos supersalários do funcionalismo público. O relator da PEC será o deputado Moses Rodrigues (União-CE), que é da ala do União Brasil mais próximo ao governo.
Líderes do Legislativo dizem que a PEC deve ficar para 2025, como admitiu o líder do governo no Congresso, Randolfe Rodrigues (PT-AP), em entrevista ao Estadão. A proposta exige 308 votos na Câmara para ser aprovada, número com o qual o governo atualmente não conta no plenário para aprovar a medida.
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.