Dos 33 novos bilionários brasileiros, segundo a mais recente lista divulgada pela revista Forbes, quase um terço – dez – estão ligados à gigante industrial catarinense Weg. A empresa familiar, fundada por três descendentes de alemães em 1961, agora tem 13 herdeiros no seleto clube do bilhão. Essa ascensão está relacionada à impressionante valorização das ações da empresa nos últimos 12 meses, que supera a marca de 240% e elevou seu valor de mercado para mais de R$ 150 bilhões.
Mas qual é, afinal, o segredo da Weg? Há tempos a companhia é considerada um investimento seguro, por seus sólidos e constantes resultados, mas de um ano para cá o mercado financeiro despertou de vez para seus predicados. Apesar da pandemia do novo coronavírus, o papel da Weg subiu 120% neste ano, de acordo com a Economática, liderando a lista de companhias com maior valorização no Ibovespa, principal índice de ações da B3, a Bolsa paulista.
A inclusão dos herdeiros dos fundadores na lista de bilionários tem razão de ser. Apesar de estar listada na Bolsa desde 1971, quase dois terços da Weg continuam a pertencer, direta e indiretamente, aos familiares de Werner Ricardo Voigt, Eggon João da Silva e Geraldo Werninghaus (os três já falecidos). Inicialmente criada como Eletromotores Jaraguá – referência a Jaraguá do Sul, cidade que até hoje abriga sua matriz –, alguns anos depois a empresa recebeu o nome atual, Weg, aproveitando as iniciais dos nomes dos fundadores. Weg também quer dizer “caminho” em alemão.
A Weg é constantemente citada como um “oásis” de prosperidade no cada vez mais combalido setor industrial brasileiro. Em recente entrevista ao Estadão, o presidente da Itaúsa, Alfredo Setubal, classificou a empresa como uma “outlier” – um ponto fora da curva. Reconhecida nos quesitos cultura organizacional, recursos humanos e inovação, a Weg se viu beneficiada por uma confluência de fatores positivos em meio à turbulência da covid-19.
Segundo a analista Thais Cascello, do Itaú BBA, a companhia mostrou resiliência à crise no segundo trimestre por ter sido beneficiada pela performance do negócio internacional, especialmente em produtos de “ciclo longo”, como motores para indústrias e usinas produtoras de energia. Com 61% da receita arrecadada fora do País, a companhia viu sua receita em real ser inflada pela recente disparada do dólar. Resultado: a geração de caixa atingiu R$ 732 milhões, alta de 36% em relação ao mesmo período de 2019.
Em recente relatório, o Itaú BBA redobra a aposta nesse ciclo positivo para os resultados do terceiro trimestre. O banco coloca a Weg como provável líder em resultados entre julho e setembro e menciona que a empresa pode bater recordes no período. Isso porque outros fatores favoráveis se somam ao quadro do trimestre anterior. “As vendas dos produtos de ciclo curto da Weg, como motores para linha branca e tintas e vernizes para o setor de construção, parece ter tido uma recuperação em ‘V’”, explica Thais.
Trajetória da Weg
E pensar que tudo começou com três carros velhos. Os fundadores da Weg começaram a empresa com um capital equivalente a três Fuscas – cada um entrou com um capital que, à época, comprava uma unidade do mais popular dos automóveis do Brasil. A companhia já começou fabricando motores – um dos carros-chefes de seu portfólio até hoje – e, mesmo em meio ao milagre econômico brasileiro, partiu para as exportações em 1970.
Os primeiros passos foram dados nos vizinhos Argentina e Paraguai. Aos poucos, a experiência se estendeu para outras regiões, ganhando velocidade a partir dos anos 2000. Ao fim de 2019, a companhia tinha 58% de seus negócios fora do País. Além de vender produtos fabricados por aqui, a empresa abriu indústrias em mais de uma dezena de mercados, com China e México (responsável por atender o mercado dos EUA) como os mais relevantes. Hoje, a Weg tem 30 mil funcionários pelo mundo, sendo 12 mil no Brasil.
Presidente da Weg há 12 anos, Harry Schmelzer Júnior trabalha na companhia desde 1980. O executivo explica que a companhia deve muito do que é hoje à atuação internacional: essa aposta não só abriu novos mercados, mas – mais importante – deu à Weg acesso a conhecimento e tecnologias que não existiam por aqui. “A gente sabia que, para brigar com nossas concorrentes, precisávamos ter um produto de qualidade global”, afirma Schmelzer Júnior. Ele lembra que a companhia investe 2,5% de sua receita líquida anual em pesquisa e desenvolvimento.
Outra característica da Weg, segundo analistas, é a consistência da operação. E isso se reflete em uma longeva equipe de executivos que, assim como o atual presidente, foi criada dentro de casa. Em 59 anos, a empresa teve só três presidentes: o cofundador Eggon João da Silva, seu filho Décio da Silva e, agora, Schmelzer Júnior. “De todos os meus executivos internacionais da área industrial, nesses 40 anos de Weg, só um pediu demissão para ir trabalhar em outro lugar”, orgulha-se Schmelzer.
E o que mantém a equipe motivada? Segundo “seu” Eggon, morto em 2015, são as oportunidades. Para gerar desafios e inovar, ele pregava que a empresa não poderia se restringir – deveria buscar sempre crescer e abrir fronteiras. “A inovação não vem da máquina, vem das pessoas”, costumava dizer.
Energia limpa e digitalização
A estratégia de crescimento da Weg sempre priorizou a absorção de tecnologia e a criação de novos negócios correlatos à atividade principal.
Seguindo as necessidades de seus clientes em motores, a empresa catarinense se tornou também uma força na área de geração de energia, que hoje representa mais de um terço de sua receita total. De olho nesse potencial, a companhia faz agora uma nova grande aposta, com investimentos em fontes alternativas de geração de eletricidade.
De acordo com o presidente da Weg, Harry Schmelzer Júnior, a companhia começou a atuar nessa linha com as PCHs (pequenas centrais hidrelétricas), passou a fornecer equipamentos para energia eólica e também a produzir painéis solares. Agora, conta o executivo, está de olho em tecnologias que ainda não fazem parte do “mainstream” da cadeia energética: o armazenamento de energia em baterias e a geração a partir da queima do lixo.
A transformação dos rejeitos que se acumulam em lixões no Brasil em energia é um projeto possível com a transformação dos resíduos sólidos urbanos em gás – o projeto foi lançado pelo braço de energia da Weg em 2019 e será viabilizado em parceria com governos. Já as baterias são uma forma de a empresa conservar a energia que hoje é produzida por parques eólicos e solares, mas acaba desperdiçada quando o sistema não consegue absorver a oferta.
Dentro da proposta de buscar segmentos correlatos, a companhia também anunciou recentemente sua entrada no desenvolvimento de motores elétricos para veículos. “No nosso caso, o nosso foco é a tração elétrica para veículos utilitários, como caminhões e ônibus. Além disso, também estamos trabalhando na criação de uma infraestrutura para abastecimento de carros elétricos”, diz Schmelzer Júnior.
Aquisições na pandemia
Outras duas novas frentes são a automação e a digitalização de processos – sempre com prioridade para a área industrial.
“A Weg é uma empresa que, de tempos em tempos, se reinventa. Vinte anos atrás começou a investir no setor de energia, que hoje é um de seus principais negócios. Ela está sempre buscando a inovação – e tem um balanço que permite esse investimento”, explica Thais Cascello, analista do Itaú BBA.
Essa característica pôde ser percebida em plena pandemia de covid-19, quando a empresa anunciou duas aquisições. Em questão de semanas, entre junho e julho, comprou duas startups paulistas voltadas a diferentes aplicações de inteligência artificial a processos industriais: a Mvisia e a BirminD.
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