Especial para o Estado
Entre as 100 companhias de capital aberto com ambientes mais diversos e inclusivos no mundo, só há uma brasileira. A Natura subiu sete posições e ficou em 4º lugar no ranking Refinitiv, que avaliou cerca de 7 mil companhias globais segundo critérios sociais, ambientais e de governança. Em uma escala de pontuação que vai de 0 a 100, a empresa obteve 79,25 pontos e foi a única do setor de cosméticos entre as 10 primeiras colocadas.
O ranking é feito pela Refinitiv, um consórcio que envolve a Reuters e a empresa de private equity Blackstone e fornece dados e serviços para profissionais do mercado financeiro. O Índice D&I (Diversidade & inclusão) da Refinitiv mede, desde 2016, o nível de diversidade de companhias de capital aberto segundo 400 critérios.
O desempenho da Natura é resultado de uma série de ações, diz a empresa, que visam a transformação do meio corporativo. Em maio, enquanto enfrentava protestos por conta de uma campanha protagonizada por casais lésbicos, a companhia reafirmou seu princípio: "A Natura acredita no valor da diversidade", destacou em nota.
Na prática, isso significa não só melhorar a cultura empresarial para funcionários LGBT+, mas também ampliar a representatividade de negros, mulheres e pessoas com algum tipo de deficiência. Cerca de 56% dos cargos de liderança são ocupados por mulheres, que representam 62% do quadro de funcionários. No centro de distribuição da marca, em São Paulo, a cada cinco colaboradores um tem algum tipo de deficiência.
Para alcançar esse estágio de igualdade, foram necessárias algumas décadas de ações afirmativas. "Desde a década de 1990, por exemplo, temos berçários para que as mães possam deixar seus filhos de até 3 anos. Agora, passamos a oferecer esse serviço também para os pais", conta a gerente de diversidade e inclusão da Natura, Milena Buosi.
No processo de seleção de estagiários deste ano, a fabricante realizou vários ajustes para atrair um grupo mais diverso. As entrevistas foram marcadas fora do horário comercial, porque muitos participantes estudam e trabalham durante o dia. Além disso, opções de transporte foram disponibilizadas em pontos centrais de São Paulo. "Fazendo essas adaptações, tivemos 50% do grupo formado por jovens negros", diz Milena.
Diversidade desde o recrutamento
Na IBM Brasil, que há mais de uma década tem um departamento dedicado à inclusão, os esforços por diversificar a força de trabalho também começam no recrutamento. "Isso começa por não procurar candidatos apenas em universidades que são de ponta e unir forças com coletivos que possam trazer pessoas de todos os cantos do País", cita Adriana Ferreira, líder de diversidade e inclusão da IBM.
Além das equipes de recursos humanos, o trabalho inclui ainda outros setores da empresa. "Os gerentes e lideranças têm papel importante por gerar ambientes livres de piadas e microagressões geralmente direcionadas a pessoas que são marcadores sociais, como negros, gordos e mais velhos", afirma a executiva.
Medidas como essas contribuem para o desenvolvimento de equipes igualitárias. Uma pesquisa realizada pela consultoria Consulting Group, em parceria com a Universidade Técnica de Munique, em 1.700 empresas de oito países incluindo o Brasil, concluiu que empresas com nível de diversidade acima da média tiveram 19% mais receita de inovação.
De olho nessa tendência, a consultoria CKZ Diversidade já trabalhou com mais de 60 companhias que buscavam melhorar seus ambientes. "O maior desafio é mudar a cultura, de um modelo militar de hierarquia para um mais orgânico, em que as pessoas possam participar do processo de inclusão", explica a CEO da empresa, Cris Kerr. A seguir, Cris indica ações que podem ajudar na transformação dentro das empresas.
Dicas para mais diversidade na empresa
- Inclusão antes da diversidade. Para Kerr, antes mesmo de atuar na ampliação da diversidade, as empresas precisam tornar a cultura do ambiente corporativo mais inclusiva. "Um primeiro ponto a ser trabalhado é desconstruir as piadinhas. Quando temos um ambiente com piadas machistas, racistas ou homofóbicas, pessoas dessas minorias não se sentem incluídas", explica.
- Cuidado com os 'vieses inconscientes'. Nem todo preconceito é emitido de forma explícita. Por isso, a consultora acredita que é preciso trabalhar os vieses inconscientes, isto é, noções preconcebidas sobre determinada questão. "É preciso criar uma conscientização ao longo do tempo", diz.
- Saia da bolha. Diante da abertura de uma vaga em determinada empresa, Kerr aponta que a tendência é o gestor procurar candidatos em seu próprio círculo social - amigos da faculdade, conhecidos de familiares, entre outros. Para a consultora, o ideal é evitar essa atitude. "Para termos diversidade, precisamos sair de onde estamos acostumados a procurar e buscar fora das indicações", recomenda.
- Pessoas com deficiência têm qualidades. Na avaliação da consultora, pessoas com deficiência não devem ser contratadas apenas por conta de suas deficiências. "Se eu apenas vê-la pelo lado da deficiência, e não da sua competência, ela não vai se sentir bem na empresa", afirma.
- Não tolere, respeite. No caso da comunidade LGBT+, Kerr entende que a perspectiva da tolerância pressupõe que existe uma relação de superioridade. "As empresas não podem partir da premissa de que apenas toleram ou aceitam essas pessoas. Elas devem trabalhar o respeito", sugere.
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