Após medidas arrecadatórias de Haddad, receita cresce 6,7% em janeiro e soma R$ 280,6 bi, um recorde

Só a tributação dos fundos dos ‘super-ricos’ rendeu R$ 4,1 bilhões, mas Fisco alerta que se trata de efeito não recorrente, devido ao incentivo dado aos investidores para a regularização dos ativos

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Atualização:

BRASÍLIA - A arrecadação do governo federal bateu recorde em janeiro e cresceu 6,67%, descontada a inflação. O resultado já reflete parte do efeito das medidas arrecadatórias enviadas pelo Ministério da Fazenda e aprovadas pelo Congresso ao longo de 2023. Foram R$ 280,6 bilhões recolhidos em tributos no primeiro mês do ano, uma cifra que pode ajudar a reduzir a necessidade do governo de bloquear despesas para alcançar a meta de déficit zero neste ano.

Os números, porém, ainda estão sendo refinados pela equipe econômica. De qualquer forma, a alta nas receitas representa uma reversão na tendência de moderação da arrecadação que vinha sendo observada até novembro. Isso porque, em dezembro, o governo já começou a recolher impostos sobre os fundos dos “super-ricos” – taxação instituída no âmbito das ações arrecadatórias.

Resultado de janeiro foi turbinado pelas medidas arrecadatórias enviadas pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e aprovadas pelo Congresso. Foto: Wilton Júnior/Estadão

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O movimento se repetiu em janeiro, quando houve o recolhimento de R$ 4,1 bilhões sobre esses fundos, referente à segunda parcela do pagamento de regularização dos ativos. Trata-se, porém, de um efeito não recorrente, em razão do incentivo inicial para essa regularização.

Já em relação aos fundos offshore (no exterior), que também passaram a ser taxados, os técnicos do Fisco explicaram que o prazo para início do recolhimento é mais longo e que, por isso, os efeitos começarão a aparecer nos próximos meses.

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Além da taxação desses investimentos, o governo aprovou a tributação dos sites de apostas online e das empresas que usufruem de benefícios tributários nos Estados por meio de subvenções. As duas medidas, no entanto, ainda não começaram a vigorar, à espera da regulamentação da Receita Federal.

Questionados se o resultado de janeiro é compatível com a projeção de R$ 168,5 bilhões de receitas extras em 2024, conforme previsto no Orçamento, os técnicos do Fisco afirmaram que o mês “veio bem”, mas ponderaram que “na forma de tributos e com explicações diferentes” do que se esperava.

“No caso dos fundos exclusivos, por exemplo, a gente não estava colocando nenhum valor no mês de janeiro”, diz o coordenador de Previsão e Análise da Receita Federal, Marcelo Gomide. Ou seja, segundo ele, houve um deslocamento temporal dessa arrecadação.

Pela nova lei, os fundos exclusivos passaram a ser taxados semestralmente, no sistema chamado de “come-cotas”. A alíquota é de 20% para os de curto prazo e de 15% nos de longo. A legislação, porém, concedeu um benefício para quem recolhesse o tributo de forma antecipada: uma alíquota de 8% sobre os rendimentos acumulados até 2023, com a primeira parcela sendo paga em dezembro.

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“O mundo mudou bastante em relação ao próprio Orçamento. Posso dizer que a arrecadação de janeiro veio bem, mas quão bem, eu não sei dizer”, frisou Gomide, deixando claro que os números apresentados nesta quinta-feira em relação às medidas arrecadatórias ainda são preliminares. A equipe econômica, segundo ele, precisará de mais subsídios para saber o real efeito das leis aprovadas no ano passado.

O desafio do Fisco, portanto, será reestimar o potencial arrecadatório de todas as medidas, bem como o prazo em que começarão a surtir efeito. Isso será fundamental para embasar a primeira revisão orçamentária, prevista para o fim de março.

Na ocasião, o governo terá de reavaliar receitas e despesas, bem como os novos parâmetros macroeconômicos, e concluir se conseguirá ou não cumprir a meta de déficit zero em 2024. E se, para isso, será necessário bloquear temporariamente gastos de ministérios – medida impopular do ponto de vista político, sobretudo em ano de eleição municipal.

Combustíveis e bancos

O Fisco também registrou incremento de arrecadação com a redução da renúncia do PIS/Cofins sobre os combustíveis e gás de cozinha. Além disso, o pagamento de Imposto de Renda de Pessoa Jurídica e CSLL registrou um incremento atípico de R$ 4 bilhões em janeiro, puxado pelo ajuste dos balanços das empresas que recolhem impostos pelo Lucro Real, sobretudo das instituições financeiras.

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Essas empresas tiveram um incremento de 33,74% no recolhimento de tributos no primeiro mês do ano, o melhor desempenho entre as atividades monitoradas pela Receita. Segundo Gomide, o resultado positivo apareceu tanto no recolhimento de PIS/Cofins quanto no de IRPJ.

“A maior parte do crescimento do recolhimento do IRPJ e da CSLL se deve ao comportamento das declarações de ajuste. E, nas declarações de ajuste, o componente mais importante está associado a receitas apuradas pelas entidades financeiras”, disse ele.

O recolhimento do IOF (Imposto sobre Operações Financeiras), no entanto, caiu 9% em janeiro, indicando que o resultado pode não ter origem em operações de crédito.

Em sua análise, a Receita afirmou que o aumento de arrecadação se deve, ainda, ao comportamento benigno de indicadores macroeconômicos, notadamente a ampliação do emprego com carteira assinada, o que melhora a arrecadação dos impostos sobre a folha e que financiam a Previdência Social.

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Compensações

Em janeiro, o Fisco voltou a registrar um volume elevado de compensações tributárias - mecanismo por meio do qual as empresas abatem do valor devido à Receita quantias a receber obtidas por vitórias na Justiça ou decorrentes de benefícios fiscais.

Em janeiro, as compensações tributárias somaram R$ 27,049 bilhões. No mesmo mês do ano passado, o valor havia sido de R$ 27,468 bilhões. Trata-se de um padrão na arrecadação federal, com valores altos de compensações no início de cada semestre, quando as empresas recolhem o Imposto de Renda.

Na véspera do Ano Novo, o governo baixou uma Medida Provisória limitando essas compensações de contribuintes com dívidas superiores a R$ 10 milhões, com o argumento de que esses descontos estavam dificultando o planejamento da arrecadação tributária. A iniciativa é parte da MP que provocou controvérsia ao restabelecer a reoneração da folha de pagamentos de 17 setores da economia.

Pelo acordo político que se desenha entre o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), a parte da reoneração será retirada da MP para tramitar por meio de um projeto de lei. Já as compensações e a extinção do benefício ao setor de eventos (Perse) deverão prosseguir numa nova MP.

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Segundo Claudemir Malaquias, chefe do Centro de Estudos Tributários da Receita, os contribuintes podem fazer compensações de outros direitos creditórios, além dos judiciais, e isso pode ter tido impacto no resultado de janeiro, uma vez que há um acúmulo desses direitos ao longo do ano anterior.

“Olhando simplesmente os números, a gente não vê uma alteração significativa”, admitiu Malaquias. “Mas não significa que ela (a MP) não terá efeito, mas que precisamos de mais informações para quando formos quantificar a utilização desses direitos creditórios, se elas (as empresas) efetivamente limitaram”.

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