BRASÍLIA – O projeto de lei que isenta contribuintes com rendimento até R$ 5 mil mensais, apresentado pelo governo Lula nesta terça-feira, 18, chega ao Congresso sob resistência da oposição e de parte do Centrão, que promete propor alterações na parte que tributa os mais ricos.
O Estadão/Broadcast ouviu integrantes de diversos partidos – entre eles PT, PSD, MDB, União Brasil, PP e PL –para colher as primeiras impressões sobre o projeto.
A percepção geral, inclusive de integrantes da oposição, é de que a proposta tem apoio popular e de que será difícil se posicionar contra ela. As principais críticas ao texto foram em relação à medida compensatória sugerida pelo governo.

Já congressistas da base de apoio ao governo federal apostam na popularidade do aumento da faixa de isenção do Imposto de Renda para fazer com que a proposta, que também prevê a taxação do que o governo chamou de “alta renda” como compensação, seja aprovada.
“Somos contra aumento de imposto pra quem quer que seja. Não votamos aumento de impostos de jeito nenhum”, afirmou o líder do PL na Câmara, Sóstenes Cavalcante (PL-RJ).
A Lei de Responsabilidade Fiscal, no entanto, impede a criação de renúncias de receitas sem que esteja acompanhada de “medidas de compensação (...) por meio do aumento de receita, proveniente da elevação de alíquotas, ampliação da base de cálculo, majoração ou criação de tributo ou contribuição”.
“Sou a favor do aumento da faixa de isenção do IR, desde que não seja acompanhada de aumento de imposto”, disse o senador Marcos Rogério (PL-RO). Questionado sobre o fato de a compensação taxar a “alta renda”, Rogério respondeu que uma das alternativas seria adotar medidas de corte de gastos. A LRF, no entanto, determina que a compensação tem de ser via aumento de receita.
“O governo que resolva”, resumiu Cavalcante.
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Como mostrou o Estadão, pesquisa realizada pelo instituto Ranking dos Políticos em fevereiroa apontava um Congresso rachado diante da proposta.
‘Bomba no colo da oposição’
Reservadamente, políticos de oposição disseram que será difícil se posicionar contra o projeto. A iniciativa do governo de apresentar a proposta já com a medida compensatória foi citada por um integrante do PL como uma “bomba no colo” da oposição. Será difícil para os parlamentares se manifestarem contra o texto – já que isso significaria ser contrário a um benefício a cerca de 10 milhões de brasileiros da classe média.
Parlamentares de partidos de centro e do Centrão, que compõem a base governista, por outro lado, defenderam o projeto do governo Lula, mesmo com a compensação. Para o líder do PSD no Senado, senador Omar Aziz (AM), “será uma batalha de rico contra pobre”. “Quem for a favor dos ricos, que se posicione a favor dos ricos. E quem for a favor dos pobres, que se posicione a favor dos pobres”, disse.
A dicotomia exposta por Aziz soa reducionista, mas é o principal discurso que os governistas tentarão impor durante a tramitação do projeto. O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, repetiu em diversas oportunidades que a tributação sobre os mais ricos seria a forma de compensar a desoneração do Imposto de Renda sobre as pessoas que ganham até R$ 5 mil.
Há uma cobrança para que a Câmara crie uma comissão especial para a discussão do projeto. O líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE), indicou na noite desta terça-feira, 18, que o cronograma de tramitação da proposta deve ser definido quando o presidente da Casa, Hugo Motta, retornar de viagem. Ele pretende ir ao Japão no fim deste mês, em agenda que também contará com o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP).
“Não tem muita pressa, não; o importante foi o anúncio”, afirmou, ao deixar a reunião de líderes em que foram divididas as comissões permanentes da Câmara.
Mudanças à vista
No discurso feito durante o anúncio, no Palácio do Planalto, o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB) indicou que o texto deverá ser alterado no Congresso.
“O Congresso, com certeza, na sua diversidade, fará alterações nessa matéria, não tenho dúvidas, pela importância que ela tem. Alterações que, com certeza, visarão a melhorar a proposta. Tanto na Câmara como no Senado, nós procuraremos dar a prioridade de que a matéria necessita para que, ao longo dos próximos meses, tenhamos a condição de elaborar a melhor proposta possível para o País”, disse. Ele acrescentou que pretende discutir outros tipos de renúncia fiscal concedidas, além de tributar os mais ricos.
“Esta tributação simplesmente afugenta um vultoso capital e investimento para outros países com menor taxa do Imposto de Renda”, avalia Fausto Pinato (PP-SP).
O líder do PT na Câmara, Lindbergh Farias (PT-RJ), minimizou o recado dado por Motta ao governo. “É uma falsa polêmica, é natural que o Parlamento sempre modifique. Será um debate rico na sociedade”, afirmou Lindbergh.
O PT vê nessa discussão a chance de reconectar com eleitores da classe média baixa, que se desapontaram com a alta da inflação e a falta de uma agenda que atenda ao empreendedor que está fora do mercado de trabalho formal – o que explica a queda na popularidade do Lula.
“Eu acho que o projeto vai ser aprovado, em especial, pela vontade do povo para que ele seja aprovado. Não é justo que um professor da rede do ensino médio pague mais imposto do que alguém que tem uma renda muito alta”.
O senador Cid Gomes (PSB-CE) afirma que “é preciso ter coerência” na discussão sobre a necessidade de a isenção ser aprovada com uma medida compensatória.
“Tenho a compreensão do papel que o Estado deve cumprir, de reduzir a desigualdade, e é isso que este projeto faz”, airmou o senador, que integra a base do governo.
O parlamentar enxerga, porém, problemas nos Estados com a redução esperada no Imposto de Renda Retido na Fonte dos servidores. Como mostrou o Estadão, o Conselho dos Secretários Estaduais de Fazenda (Comsefaz) estima que haverá uma perda de R$ 11 bilhões aos Estados com a isenção de até R$ 5 mil.
“Significará perdas para Estados e municípios, e o Parlamento pode discutir uma saída para isso, talvez que a União faça uma compensação”, afirma.
Técnicos consultados pela reportagem, em análise preliminar da proposta, consideraram o texto simples, com as compensações necessárias, mas reconhecem a tributação da alta renda como um ponto sensível. Na análise de um técnico de um partido do Centrão na Câmara, a compensação deve sofrer mudanças, e a tendência é de que os deputados tentem restringir mais o rol daqueles que vão ser taxados.
Para o deputado Carlos Zarattini (PT-SP), o projeto deve ser votado no Congresso antes do recesso parlamentar, em julho. Zarattini considera que o texto apresentado aos parlamentares é bom, destacando o fato de não haver alterações nos descontos relacionados à área da saúde – mudança que chegou a ser anunciada pelo Ministério da Fazenda, mas foi descartada a pedido de Lula.
Ele também reforçou o discurso governista de que o impacto do imposto mínimo recairá sobre 141 mil pessoas, enquanto 10 milhões de brasileiros seriam beneficiados. “Não tem sentido não ser feito”, defendeu.