BRASÍLIA – As diretrizes para a reforma tributária, apresentadas na última terça, 6, pelo grupo de trabalho da Câmara, preveem que o agronegócio seja tratado de forma diferenciada, mas distinguindo produtores rurais – com acesso a uma alíquota mais baixa de tributação – das empresas que atuam na agroindústria.
Durante as negociações do grupo de trabalho da reforma, houve debate sobre a aplicação do termo exato a ser empregado no relatório que lança as bases para a proposta de reforma tributária, que será relatada na Câmara pelo deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB).
A discussão girou em torno de usar o termo “cadeia rural” ou “produção rural”, prevalecendo, por fim, a segunda opção. Segundo parlamentares que integram o grupo, trata-se de uma sinalização de que apenas o produtor merece o tratamento diferenciado, e não a agroindústria.
“Vamos tratar (de forma diferenciada) o produto in natura. Mas se ele for modificado, não”, disse ao Estadão o deputado Reginaldo Lopes (PT-MG), que coordenou o grupo de trabalho.
A decisão, no entanto, não é consenso e pode se transformar em mais um ponto de atrito com a bancada do agronegócio no Congresso, que já apresenta fortes resistências à reforma. Isso porque boa parte dos pequenos agricultores e dos produtores familiares que fornecem para cooperativas ou agroindústrias, quando recolhem impostos que incidem sobre o consumo (ISS, ICMS, PIS ou Cofins), o fazem pelo modelo de crédito presumido – um benefício tributário que permite, na prática, a redução do valor a ser pago. Esse crédito é usado para pagar outros tributos ou pode ser ressarcido em dinheiro.
Com a implantação do IVA (Imposto sobre Valor Adicionado), como proposto na reforma, não haverá mais a figura do crédito presumido, e o produtor será taxado por uma alíquota a ser definida na negociação política da reforma. Como compensação, esse imposto passará a gerar créditos para os elos seguintes da cadeia.
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A alíquota, segundo indicado pelo grupo de trabalho, deverá ser inferior à cobrada dos demais bens e serviços, mas apenas para quem é produtor.
“A gente tem que ter cautela para não colocar a agroindústria (no regime diferenciado), porque a indústria já terá o benefício próprio dela da não-cumulatividade plena”, afirma o deputado Mauro Benevides (PDT-CE), que integrou o grupo de trabalho.
O relatório do grupo de trabalho da Câmara prevê a não-cumulatividade plena, ou seja, o imposto pago em todos os gastos que contribuam para atividade econômica do contribuinte dará direito a crédito, independentemente se ligados à função administrativa ou à atividade fim da empresa. Isso garantiria a neutralidade quanto à carga fiscal de todos os contribuintes.
Integrante do grupo de trabalho destacado para defender os interesses da Frente Parlamentar do Agronegócio (FPA), o deputado Newton Cardoso Jr. (MDB-MG) questiona a separação defendida pelos colegas.
“Querem limitar o tratamento diferenciado ao produtor porque a indústria vai ter o benefício da não-cumulatividade. Não necessariamente”, diz “É preciso saber se a não-cumulatividade vai cobrir a atual cumulatividade do crédito presumido”.
Carnes
Presidente da FPA, Pedro Lupion (União-PR) afirma que é preciso esperar pelo texto definitivo do relator antes de se posicionar, mas vê com ceticismo a diferenciação entre os dois segmentos. “O produtor que engorda o frango para os frigoríficos é produtor ou indústria? Hoje, ele é um prestador de serviços”, afirma Lupion.
O setor de carnes, que poderia ser atingido pela diferenciação, afirma não ver risco para a sua operação, uma vez que produtos como frango e ovos deverão ser atendidos pelo tratamento diferenciado a produtos da cesta básica
O relatório do grupo de trabalho não cravou que a desoneração da cesta será mantida, mas asseverou com pelo menos uma redução de alíquota com possibilidade de suplementação via cashback – redução parcial do imposto pago.
“O relator foi claro ao dizer que não haverá aumento de carga tributária, e o relatório (do grupo de trabalho) apresentado afirma que haverá desoneração da cesta básica. Estamos aguardando”, afirma Ricardo Santin, presidente da Associação Brasileira de Proteína Animal. “As empresas sabem que a simplificação tributária traz uma desoneração em relação ao que se paga hoje com o custo financeiro, de demora para compensar (créditos) e de outras engrenagens para enfrentar esse emaranhado todo dia, além da insegurança jurídica. A simplificação vai desobstruir a economia e por isso apoiamos a reforma”.
O tema da cesta básica foi assunto de almoço na sede da FPA nesta terça-feira, 13. Segundo o deputado Sergio Souza (MDB-PR), que integra a bancada, pelos cálculos apresentados na entidade, o governo gastará o dobro para criar e manter o sistema de devolução de recursos do cashback do que mantendo a atual desoneração da cesta básica.
“É preciso ter em conta que a desoneração da cesta básica não é para o produtor, mas para o consumidor de alimentos”, disse.
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