O próximo sábado vai marcar dez anos de um momento crucial para a economia global: a quebra do banco Lehman Brothers, considerada o início oficial da crise originada na farra de financiamentos imobiliários nos EUA, que, num efeito dominó, derrubou mercados de todo o mundo. Por aqui, o tsunami foi apelidado de “marolinha” pelo governo da época, após medidas de estímulo terem amenizado a recessão. No entanto, uma década mais tarde, enquanto o mundo surfa uma onda positiva, o Brasil ainda luta para se livrar de uma das maiores crises de sua história. E a gênese dessa troca de papéis pode estar precisamente no remédio aplicado pelo País em 2008.
O problema, segundo economistas ouvidos pelo Estado, reside menos nas medidas tomadas há dez anos – liberação de dinheiro de bancos públicos, cortes de impostos e incentivo ao consumo –, mas na insistência em aplicar o mesmo remédio sempre que a economia deu sinais de desaquecimento desde então. “Quando o Brasil voltou a apresentar problemas, no início do governo Dilma Rousseff, a equipe econômica dobrou a aposta. E repetiu o que foi feito em 2008 e 2009, mas numa situação fiscal totalmente diferente”, diz Samuel Pessôa, economista do Ibre/FGV.
Em outras palavras: a política econômica virou um “samba de uma nota só”, levada no batuque da intervenção estatal. A crise de 2008 ajudou a justificar essa fórmula de expansão, pois vários mercados maduros, EUA à frente, endureceram a regulação e injetaram dinheiro na economia, lembra o economista-chefe do Itaú Unibanco, Mário Mesquita. “A crise de 2008 foi, de certa forma, equivalente à queda do Muro de Berlim. Se a queda do muro provou que o socialismo real tinha falido, a crise financeira validou, para pessoas de um certo viés ideológico, que o neoliberalismo teria falido”, compara.
A turbulência no mundo desenvolvido foi o pretexto para pôr em prática uma posição que era latente no governo Lula desde 2006 – como indicou a escolha de Guido Mantega para substituir Antonio Palocci no Ministério da Fazenda. Do ponto de vista intelectual, a disposição do PT em fazer do Estado o motor central da economia e o fato de a crise ter sido originada na frouxa regulação bancária lá fora juntaram a “fome com a vontade comer”, na visão de Simão Silber, professor da FEA/USP.
O governo, porém, não comprou sozinho a tese de que a intervenção era necessária, afirma Sérgio Lazzarini, professor do Insper e autor do livro Capitalismo de Laços. “Virou uma cartilha de ação estatal, de apoio e de promoção”, lembra. “Na época eu lembro de conversar com empresários que diziam: ‘É isso mesmo, esse é o nosso modelo’. E perguntavam: ‘você quer ser igual aos Estados Unidos’?”.
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.