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Opinião|Amazônia: de símbolo nacional a caminho de desenvolvimento

Região é abundante em pessoas em idade economicamente ativa e tem áreas abertas subutilizadas, que podem ser aproveitadas para atividades econômicas de reflorestamento

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Foto do author Renata Piazzon

O Brasil é a nação com a maior biodiversidade do planeta, abrigando a maior floresta tropical do mundo. O que é motivo de orgulho para quase todos os brasileiros não se traduz em proteção e benefícios para a região. Embora seja ainda lar de centenas de povos com culturas, línguas e tradições distintas, essencial na formação da identidade brasileira, a Amazônia enfrenta desafios econômicos e sociais significativos: 45% de sua população vive abaixo da linha da pobreza, 80% dos empregos rurais são informais, e a participação da Amazônia no PIB nacional é de apenas 10%, concentrada majoritariamente em Manaus e Belém.

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Nas cidades, onde reside mais de 70% da população, a economia é baseada em serviços, administração pública e, no caso de Manaus, na indústria, muito pouco integrada aos recursos florestais. Uma desconexão que remete à visão dos que migraram para a região nas décadas de 1960 e 1970 com o intuito não de conhecer a floresta, mas de substituí-la. A floresta como um empecilho, algo a ser eliminado, aspecto abordado por João Moreira Salles no seu livro “Arrabalde”.

Todos esses indicadores embora não sejam fator determinante para o desmatamento – ao contrário, também são resultado – tornam as parcelas mais vulneráveis da população fortemente dependentes de atividades ilegais e ambientalmente predatórias. E, por refletirem um problema sistêmico, precisam ser enfrentados de maneira transversal, com uma agenda integrada, como a que defende a iniciativa Uma Concertação pela Amazônia, rede com mais de 600 integrantes de vários setores que busca soluções para o desenvolvimento sustentável para a região e para o País.

Centro de Manaus; cidade tem economia baseada em serviços, administração pública e em uma indústria pouco integrada aos recursos florestais Foto: Pedro Kirilos/Estadão

Há, na verdade, um paradoxo na economia amazônica. Ainda que predomine a visão de escassez – de crédito, infraestrutura e de mão de obra qualificada –, a região é abundante em pessoas em idade economicamente ativa, em áreas florestais e de culturas e em áreas abertas subutilizadas, que poderiam ser aproveitadas para atividades econômicas de reflorestamento. Dos 70 milhões de hectares de pastagens, 25 milhões de hectares são áreas degradadas.

Se o Brasil contemporâneo passa pela Amazônia, é preciso pensar no bioma como provedor de soluções para o mundo. Nessa busca por alternativas, persiste uma tendência de homogeneização da região, ainda que a paisagem e os aspectos socioculturais se materializem em diversas configurações. Muitas soluções de curto prazo se concentram em evitar práticas prejudiciais, como a mineração ilegal e a pecuária especulativa. Mas cresce a aposta na bioeconomia, que deve ser contemplada em todas as suas possíveis formas, a fim de compor um conjunto de ações voltadas para as diversas realidades amazônicas.

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Na economia da floresta conservada, a chamada sociobioeconomia, o foco é promover produtos que possuam qualidades intrínsecas de regiões tropicais. Um exemplo são as mesas executivas da ApexBrasil, que facilitam a articulação entre setores público e privado, identificando desafios e oportunidades específicas. Uma dessas mesas explora o potencial da cadeia da castanha-do-pará, abordando questões como os padrões fitossanitários necessários para sua certificação e exportação. Atualmente, produtos florestais não madeireiros representam apenas 0,2% das exportações totais brasileiras, indicando um vasto potencial inexplorado.

No campo da economia em áreas sob ameaça de desmatamento ou já convertidas pela produção de commodities agropecuárias e minerais - a bioeconomia florestal -, há um crescente interesse na agenda de restauração, tema que já foi objeto desta coluna.

Mas é na Amazônia urbana que se encontram setores essenciais para o seu dinamismo econômico. Para isso, é necessária a formulação de programas destinados a aumentar a produtividade nos setores industrial e de serviços, a adoção de incentivos fiscais para promover a economia circular e iniciativas urbanas inspiradas em soluções baseadas na natureza.

É fundamental também que a indústria e os serviços se integrem às atividades de conservação e distribuam benefícios para outras áreas da Amazônia. Além disso, são cruciais investimentos em educação para incorporar a floresta à vida de quem nela vive e ao imaginário coletivo de todos os brasileiros. O Itinerários Amazônicos, programa que busca promover a Amazônia nas escolas brasileiras e oferecer formação continuada às secretarias estaduais de educação para a sua implementação, vai nessa linha.

A Zona Franca de Manaus, por meio do Programa Prioritário de Bioeconomia (PPBio), é outro exemplo com potencial de fortalecer a economia local com ênfase na geração e permanência de riqueza no território. O PPBio utiliza recursos de investimentos obrigatórios em P&D para desenvolver novos produtos e negócios associados à bioeconomia. Da mesma forma, o programa Zona Franca Verde, que isenta produtos com insumos regionais de Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), tem o potencial de promover a sustentabilidade empresarial na região. É fundamental que os incentivos estejam alinhados com os objetivos de conservação e aproveitamento da diversidade local.

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De acordo com pesquisa do Ibope de 2019, 88% dos brasileiros veem a Amazônia como uma fonte de orgulho e 95% acreditam que preservar a floresta é essencial para manter esse sentimento. Além disso, 94% dos entrevistados consideram que proteger a Amazônia é fundamental para a identidade do Brasil.

Orgulhar-se da Amazônia significa reconhecer e valorizar sua importância em várias dimensões — ecológica, cultural, simbólica e econômica. E considerar a floresta não apenas como parte fundamental do meio ambiente brasileiro, mas também como componente essencial da identidade nacional e fonte de oportunidades para se garantir um futuro sustentável para o país e para o mundo.

Opinião por Renata Piazzon

Diretora-geral do Instituto Arapyaú, cofacilitadora da Coalizão Brasil Clima Florestas e Agricultura e representante do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social Sustentável (CDESS)

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