Setores afetados pela decisão do governo de revogar a desoneração da folha de pagamento afirmaram, em nota conjunta divulgada na tarde desta quinta-feira, 28, que a medida provisória que deverá ser editada para elevar a arrecadação “traz insegurança jurídica para as empresas e para os trabalhadores já no primeiro dia do ano de 2024″. Eles criticaram o modo como o governo atuou.
A nota é uma resposta ao anúncio feito mais cedo pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, de que o governo editará uma medida provisória até o fim deste ano com três iniciativas para recuperar receitas perdidas com renúncias tributárias e com o pagamento de créditos judiciais. A mais importante delas revoga a lei que havia prorrogado a desoneração da folha de pagamentos para 17 setores econômicos.
Adotada em 2011, a desoneração é um benefício fiscal que substitui a contribuição previdenciária patronal de 20%, incidente sobre a folha de salários, por alíquotas de 1% a 4,5% sobre a receita bruta. Na prática, a medida reduz a carga tributária devida pelas empresas. O benefício, porém, perderia a validade no fim deste ano.
O Congresso aprovou em outubro um projeto que prorroga até 2027 a desoneração da folha de pagamentos de 17 setores e reduz a alíquota de contribuição previdenciária de pequenos municípios. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva vetou o projeto em novembro, mas o Congresso derrubou o veto integral em 14 de dezembro, com placares folgados.
Segundo o Ministério da Fazenda, com as mudanças anunciadas nesta quinta-feira, as empresas terão desconto na tributação referente ao primeiro salário mínimo pago aos seus funcionários. Os setores, agora, serão divididos segundo as atividades que desempenham.
O primeiro grupo, formado por 17 classes de atividades, passará a recolher a contribuição patronal de 10% sobre o primeiro salário mínimo de seus funcionários. Se o trabalhador receber, por exemplo, o equivalente a cinco salários, o desconto valerá somente sobre o primeiro salário recebido.
No segundo grupo, de 25 classes de atividades, as empresas recolherão 15% de contribuição patronal sobre o primeiro salário mínimo de seus funcionários.
A previsão do Ministério da Fazenda é a de que a desoneração da folha teria um custo de R$ 12 bilhões. Com a MP, esse valor deve recuar para R$ 6 bilhões e será compensado com as mudanças no Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse).
O que dizem os setores?
“Não é, em absoluto, razoável que ela (a lei nº 14784/23, que prorroga a desoneração da folha de pagamento por quatro anos) seja imediatamente alterada ou revogada por meio de uma MP, contrariando uma decisão soberana do Congresso Nacional, ratificada pelas duas Casas na derrubada ao veto presidencial”, diz o texto publicado pelas entidades setoriais.
As associações afirmaram que as propostas mencionadas por Haddad não “estão claras e sinalizam alterações importantes que não foram discutidas com o Congresso, com o setor empresarial e tampouco com os representantes dos trabalhadores”. “São propostas que não devem ser impostas à sociedade sem discussão prévia ampla e abrangente, por meio de uma Medida Provisória.”
Para as entidades, propostas sobre a tributação da folha de pagamento devem ser discutidas na próxima etapa da reforma tributária. “Isso, sim, permitirá um debate produtivo sobre as diversas alternativas e o alcance da melhor solução para o Brasil a longo prazo.”
Ainda segundo o documento publicado pelas associações, a desoneração da folha é “extremamente benéfica” para o Brasil e permitiu que os setores favorecidos ampliassem a contratação de trabalhadores formais em 18,9% de janeiro de 2019 a agosto de 2023. No mesmo período, os demais setores aumentaram em 13% o total de empregados com carteira.
Assinaram a nota a Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert), a Associação Brasileira das Empresas de Software (Abes), a Associação Brasileira das Indústrias de Calçados (Abicalçados), a Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), a Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (Abit), a Associação Brasileira de Rádio e Televisão (Abratel), a Associação Brasileira de Telesserviços (ABT), a Associação Nacional de Jornais (ANJ), a Federação das Associações das Empresas Brasileiras de Tecnologia da Informação (Assespro), a Associação das Empresas de Tecnologia da Informação e Comunicação e de Tecnologias Digitais (Brasscom), o Centro das Indústrias de Curtumes do Brasil (CICB), a Associação Nacional dos Fabricantes de Ônibus (Fabus), a Federação Nacional das Empresas de Informática (Fenainfo), a Federação Nacional de Instalação e Manutenção de Infraestrutura de Redes de Telecomunicações e de Informática (Feninfra) e o Instituto Gestão de Excelência Operacional em Cobrança (Igeoc).
Presidente executivo da Associação Brasileira das Indústrias de Calçados (Abicalçados), Haroldo Ferreira, reforçou que a MP que o governo planeja editar cria insegurança jurídica. Disse também que a lei 14.784/23 é que “mantém os empregos e a competitividade” para os 17 setores afetados.
“Qualquer outra medida deverá ser analisada e discutida com os setores para se verificar a viabilidade. Todos estamos abertos ao diálogo, porém, depois de quase um ano de trabalho junto ao Congresso, uma MP alterando as regras no apagar das luzes de 2023 causa muita insegurança para os negócios”, destacou Ferreira.
Em nota, a Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (Abit) afirmou receber “com preocupação a decisão do governo de acabar com a desoneração da folha”. “A Abit reconhece o esforço do governo para atingir o déficit zero em 2024, porém não poderia deixar de se preocupar com a proposta de reoneração gradual da folha, que pode impactar parte dos 1,5 milhão de postos de trabalho formais mantidos pelo setor em todo o território nacional.”
Na opinião do Sindicato Nacional da Indústria de Componentes para Veículos Automotores (Sindipeças) , a lei aprovada pelo Congresso é muito mais benéfica para as empresas e, consequentemente, para a manutenção e geração de empregos, que a minuta de proposta apresentada pelo ministro Fernando Haddad. A entidade não assinou a carta conjunta divulgada por várias associações.
A Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), que também não assinou a nota por não ser afetada diretamente pela medida, afirmou que, mesmo que para o setor automotivo a desoneração da folha de pagamento seja uma medida de baixo impacto, “defende e apoia todas as medidas que combatam os elementos do Custo Brasil que tanto prejudica o crescimento do nosso mercado interno, quanto a competitividade de nossas exportações”.
Quais são os setores incluídos?
Os 17 setores que podem realizar a desoneração da folha são:
- confecção e vestuário
- calçados
- construção civil
- call center
- comunicação
- empresas de construção e obras de infraestrutura
- couro
- fabricação de veículos e carroçarias
- máquinas e equipamentos
- proteína animal
- têxtil
- TI (tecnologia da informação)
- TIC (tecnologia de comunicação)
- projeto de circuitos integrados
- transporte metroferroviário de passageiros
- transporte rodoviário coletivo
- transporte rodoviário de cargas
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