Uma hecatombe nas finanças estaduais e municipais é esperada a partir de 2023. Por um lado, pisos salariais têm sido aprovados no Congresso Nacional, para além de 80 projetos de piso em tramitação. Por outro, houve um brutal e não planejado corte na receita desses entes. Não se objetiva avaliar o mérito dos atos, mas pontuar que a conta não fecha.
Em junho de 2022, o Executivo federal sancionou duas Leis Complementares (LCs). A LC 192 obriga os Estados a cobrarem o ICMS dos combustíveis de forma monofásica, com alíquota por litro (ad rem) e única no Brasil. A LC 194 determina que os combustíveis, as comunicações, a energia elétrica e o transporte coletivo passem a ter alíquota do ICMS em 18% e não mais em 30%. As perdas permanentes anuais para os 27 entes são da ordem de R$ 100 bilhões a partir de julho de 2022.
Além disso, o contencioso sobre a incidência das tarifas Tusd e Tust na base de cálculo da energia elétrica foi inserido na LC 194 e trará perdas adicionais permanentes anuais de R$ 34 bilhões. Por fim, há o Difal, que, para 2022, provocará perda extra de R$ 13 bilhões.
Depois de 16 Estados judicializarem e terem liminares favoráveis, o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), deu o prazo até 1/4/2023 para a União e os Estados fazerem um acordo. Além da Tusd/Tust e do Difal, há a “não essencialidade” da gasolina. Como esses três temas não causam prejuízo ao Tesouro Nacional, os Estados esperam apoio do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, que tem sido parceiro, assim como os 27 governadores foram empáticos acerca do voto de qualidade do Carf.
O único item com ônus para a União concerne à compensação relativa às perdas estaduais decorrentes da LC 194 restritas ao período de julho a dezembro de 2022. A partir de 2023, as perdas serão permanentes e sem compensação.
Os Estados almejam, destarte, ter entendimentos favoráveis sobre a “não essencialidade” da gasolina e Tust/Tusd, e garantir algum caixa (Difal e compensação), para minimizar as perdas permanentes estruturais.
Anseia-se, pois, selar um novo pacto federativo, iniciando com acordo entre a União e os Estados, patrocinado pelo STF e anuído pelo Congresso Nacional. Ademais, e mais importante, deve-se refletir qual o nível de gastos e tributação que queremos ter e, com isso, desenhar uma reforma tributária que traduza esse desejo social. Como responsabilidade fiscal precede responsabilidade social, como os vulneráveis precisam do Estado, e como os Três Poderes querem ver o Brasil crescer com maior justiça social, seria desejável que as autoridades evitassem uma crise fiscal nos Estados a partir de 2023. Seria um desastre também para a União, logo, para o País. / DOUTORA EM ECONOMIA PELA FGV EPGE, SECRETÁRIA DE ECONOMIA DE GOIÁS, VICE-PRESIDENTE DO COMSEFAZ E FOI CONSELHEIRA DO CADE
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