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Economista, doutor pela Universidade Harvard e professor da PUC-Rio, Rogério Werneck escreve quinzenalmente

Opinião | A demagogia das isenções de IRPF: cobrança não deveria ser objeto de manipulações eleitoreiras

Uma base ampla de cobrança do Imposto de Renda é fundamental para ter uma cidadania capaz de exigir que o governo seja responsabilizado por seu desempenho

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Foto do author Rogério Werneck

O País continua ao sabor de convicções despropositadas do presidente da República. “Na minha cabeça, salário não é renda. Renda é de quem vive de especulação. Esse, sim, deveria pagar Imposto de Renda” (Estadão, 12/10/2024).

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É na sandice de que salário não é renda que se baseia o indefensável projeto de reforma do Imposto sobre a Renda das Pessoas Físicas (IRPF) no País. Ao apresentá-lo, o ministro da Fazenda instou o Congresso a refletir sobre “a sociedade que queremos”. Os parlamentares poderiam esclarecer ao ministro que queremos uma sociedade democrática e próspera de cidadãos que maciçamente paguem Imposto de Renda. Muitos, quase nada. Outros, bem mais, na medida de sua renda.

Uma base ampla de cobrança do Imposto de Renda é fundamental para ter uma cidadania capaz de exigir que o governo seja responsabilizado por seu desempenho. Dez milhões de pessoas deixarem de pagar Imposto de Renda seria um tremendo desserviço ao País.

Como bem notou, já há meses, Naercio Menezes Filho, professor do Insper e da USP, não há como considerar pobres os beneficiários da ampliação da isenção de IRPF agora contemplada pelo governo, que seriam contribuintes com renda mensal entre R$ 3 mil e R$ 7 mil. E que, portanto, seria injustificável agraciá-los com benesses fiscais, que, em princípio, poderiam ser destinadas, por outras vias, a segmentos incomparavelmente mais carentes da população (Valor, 29/11/2024).

É na sandice de que salário não é renda que se baseia o indefensável projeto de reforma do Imposto sobre a Renda das Pessoas Físicas (IRPF) no País Foto: Wilton Júnior/Estadão

O aparato de cobrança de IRPF é algo de que o País se orgulha. Não deve ser objeto de manipulações eleitoreiras. E, sim, de uma agenda séria de reformas, que torne a tributação da renda muito mais equânime e abrangente do que vem sendo.

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Mas o governo jamais se dispôs a levar tal agenda à frente. O que agora propõe, para compensar a perda de arrecadação que adviria das isenções, é um atalho grosseiro e ineficaz para a tributação de contribuintes de alta renda que passa ao largo das reformas que se fazem necessárias.

Sobram razões para apreensão. Tendo aberto a caixa de Pandora da cobrança do IRPF, o governo não terá nenhum controle sobre o que fará o Congresso. O que se teme é que o estrago seja similar ao perpetrado por Dilma Rousseff e seus aprendizes de feiticeiro quando decidiram propor que a contribuição patronal sobre folhas de pagamento de um grupo seleto de pequenos setores passasse a ser feita sobre faturamento. Três governos depois, o País ainda não conseguiu desmontar o gigantesco e desastroso esquema de desoneração da folha que acabou aprovado pelo Congresso. O PT não aprende.

Opinião por Rogério Werneck

Economista, doutor pela Universidade Harvard, é professor titular do departamento de Economia da PUC-Rio

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