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Economista, doutor pela Universidade Harvard e professor da PUC-Rio, Rogério Werneck escreve quinzenalmente

Opinião|Relação de Lula com Galípolo está fadada a ser mais complexa do que se imagina

Chamado de ‘menino de ouro’, futuro presidente do Banco Central terá de contrabalancear expansão fiscal do governo

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Na semana passada, houve quem se apressasse em ver na decisão unânime da diretoria do Banco Central (BC), de voltar a elevar a taxa básica de juros, evidência de que Gabriel Galípolo teria “beijado a cruz”. A verdade, contudo, é que ainda falta muito para que o País se convença de que Galípolo abraçou para valer os cânones que norteiam a condução coerente da política de metas para inflação.

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O que de fato importa não é se Galípolo concordou com uma elevação momentânea da taxa básica de juros, mas se será capaz de liderar o BC no papel crucial que terá de desempenhar nos próximos meses, para contrabalançar o expansionismo fiscal promovido pelo governo e assegurar que a inflação será mantida na meta.

O que preocupa é a visão completamente primitiva sobre a condução da política de metas para a inflação que Lula da Silva ainda se permite exibir. Há duas semanas (13/9), 17 dias após ter submetido o nome de Galípolo ao Senado, o presidente, em um dos discursos mais populistas de sua longa carreira política, não deixou margem a dúvidas sobre o que pensa a respeito.

Gabriel Galípolo foi secretário-executivo do Ministério da Fazenda, o segundo cargo em importância da pasta, atrás apenas do ministro Fernando Haddad Foto: Washington Costa / Ministério da Fazenda

Lula chegou ao cúmulo de perguntar onde teria estudado o atual presidente do BC e se seria verdade que Roberto Campos Neto acreditava em Deus, por ter ele manifestado preocupação, mais do que justa, com os efeitos inequívocos que a superindexação do salário mínimo vem tendo sobre o desequilíbrio fiscal subjacente ao aquecimento excessivo da economia. Só ler a transcrição do que foi dito não basta. É preciso ver como foi dito. São pouco mais de 30 segundos:

Como o próprio Galípolo logo perceberá, a presidência do BC não é cargo para quem espera continuar a ser considerado “menino de ouro” no Planalto. Se fizer o que precisa ser feito, ou seja, impedir que a farra fiscal eleitoreira em que Lula vem apostando se traduza em aceleração da inflação, seus dias de “menino de ouro” estarão contados. E é bem possível que logo passe a ser execrado como um ingrato que se deu ao desplante de deixar que o BC conspirasse contra a reeleição do presidente.

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Não é de hoje que Lula anseia pela chegada de 2025, quando, afinal, passará a “ter o presidente do Banco Central” (Folha de S.Paulo, 27/6). Mas Galípolo bem sabe que terá de disputar três partidas simultâneas em tabuleiros interdependentes: com Lula, com o mercado e a mídia e, claro, com a inflação. Se entregar o jogo a Lula, estará fadado a sofrer derrotas rápidas e desmoralizantes nas outras duas partidas.

Bem mais complexo do que Lula imagina.

Opinião por Rogério Werneck

Economista, doutor pela Universidade Harvard, é professor titular do departamento de Economia da PUC-Rio

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