O ex-ministro da Fazenda Rubens Ricupero afirmou nesta segunda-feira, 24, que, entre as discussões e inovações trazidas com a implementação do Plano Real, o elemento que “menos pegou” foi a responsabilidade fiscal. Ele considera que um governo prezar pela responsabilidade fiscal é difícil em qualquer lugar do mundo, mas que o Brasil “parece ter abandonado” a prática.
“Tínhamos melhorado, mas pioramos”, afirmou o ex-ministro, durante evento da Fundação FHC sobre os 30 anos da implementação do Plano Real.
Segundo ele, com o real, o povo brasileiro se convenceu da “malignidade” que a inflação causa, mas disse não tem certeza se o mesmo aconteceu com os políticos do País, “a começar pelos de mais alto escalão”.
“Eles compreendem que, como o povo não tolera, ele também não pode ser a favor (da inflação). Agora, eles não fazem a relação de causa e efeito, como, por exemplo, a questão do gasto público”, afirmou.
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Privatizações
Também presente no evento, a economista Elena Landau destacou o papel importante das privatizações para a consolidação do Plano Real após sua implementação. Ela, que ocupou a diretoria de privatizações do BNDES entre 1994 e 1996, relembrou que, assim que Fernando Henrique Cardoso assumiu o Ministério da Fazenda, foram aprovadas Propostas de Emenda à Constituição (PECs) que permitiam privatizações e o fim do monopólio da Petrobras na exploração de petróleo.
“Imediatamente, ele (FHC) colocou no programa de privatização a Vale, Eletrobras, e as telecoms. Seria mais ou menos como colocar a Petrobras no seu programa de privatização no início do seu governo”, relembrou Landau. “Ele (FHC) sabia que isso seria fundamental para consolidar a moeda. Foi impossível fazer o que fizemos com as privatizações, não fosse o FHC coordenando e sua firmeza”, reforçou.
Políticas fiscal, monetária e cambial
O ex-secretário do Tesouro Murilo Portugal disse nesta segunda, no evento, que, ao contrário de outros planos, o Plano Real observou um sincronismo entre as políticas monetária, fiscal e cambial. “É muito importante que a política fiscal comece antes da parte monetária, e foi isso que aconteceu no Real”, comentou. Ele foi secretário do Tesouro de 1992 a 1996.
Esse alinhamento de políticas, observou, não é comum porque as medidas fiscais não só demoram para serem implementadas, uma vez que dependem muitas vezes de votação no Congresso, como também não têm todo o seu impacto incorporado pelas contas públicas de imediato.
No caso do Plano Real, contudo, a arrecadação do governo contava com o reforço do Imposto Provisório sobre Movimentação Financeira (IPMF), que em 1994, ano de lançamento da moeda, já respondia por 1,3% do Produto Interno Bruto (PIB).
No mesmo ano, acrescentou Portugal, os Estados já estavam pagando totalmente as suas dívidas com a União, graças a um plano renegociação. Além disso, 20% das receitas do governo foram desvinculadas com o Fundo Social de Emergência (FSE), que permitiu com que recursos destinados a áreas como educação, saúde e Previdência pudessem ser usados para pagamentos de outras despesas consideradas prioritárias e na formação de superávit primário.
Dessa forma, lembrou o ex-secretário do Tesouro, o Brasil conseguiu fazer superávit de 5,17% do PIB, um saldo, lamentou, “infelizmente nunca mais igualado”. Portugal também já foi presidente da Febraban, a associação que representa os bancos.
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