Salários de CEO das 90 empresas do Ibovespa superam marca de R$ 1,1 bilhão em 2021

No ano passado salários dos executivos subiram, na média, 30%; só o ‘top 10′ dos executivos mais bem pagos recebeu o equivalente a R$ 400 milhões

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Foto do author Fernanda Guimarães
Atualização:

A remuneração anual conjunta dos 90 CEOs das empresas que compõem o Ibovespa, principal índice de ações da Bolsa brasileira superou a marca de R$ 1,1 bilhão em 2021, o que significa um salário médio de mais de R$ 1 milhão por executivo. E, mesmo com a pandemia e o crescimento lento da economia, a remuneração de quem ocupa os cargos do topo das organizações brasileiras, está em crescimento: o aumento desses executivos foi de 30%, em média, em relação ao ano anterior.

O tema da remuneração dos executivos é alvo de discussão não apenas no Brasil, mas no mundo todo. Nos Estados Unidos, a questão gera polêmicas. Recentemente, por exemplo, a gigante do e-commerce Amazon foi questionada pela remuneração de Andy Jassy, seu CEO, que recebeu, sozinho, R$ 1,1 bilhão em um ano.

Banco Santander liderou lista de salários a executivos em 2021 Foto: Nilton Fukuda/Estadão

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O levantamento dos ganhos foi feito a partir da documentação pública sobre remuneração total que as empresas listadas têm de entregar à Comissão de Valores Mobiliários (CVM), tendo sido tabulados por Renato Chaves, especialista em governança corporativa. Os dados não informam o nome do executivo que recebe o maior salário, mas, no geral, o CEO tem a maior remuneração.

No Brasil, a regulação exige a divulgação dos salários dos executivos das empresas de capital aberto desde 2019. A regra, na época, foi alvo de muitas reclamações. Algumas empresas chegaram a entrar na Justiça para evitar a abertura dessa informação, justificando riscos de segurança aos executivos.

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Ranking

E os dados mostram que, mesmo entre quem recebe salários de dar inveja a qualquer um, há um grupo de “super vips”. Do volume bilionário dos salários pagos pelas 90 empresas do Ibovespa, R$ 400 milhões, ou 30% do total, estão nas mãos de apenas dez executivos.

No topo da lista está o ex-presidente do banco espanhol Santander no Brasil Sergio Rial, que embolsou R$ 59 milhões no ano passado. Na sequência está o líder da mineradora Vale, Eduardo Bartolomeo, com uma remuneração anual de R$ 55 milhões, seguido de Milton Maluhy, do Itaú Unibanco, que recebeu um cheque de R$ 53 milhões. Logo depois vêm Pedro Zinner, que preside a Eneva (R$ 52,7 milhões), e Gilberto Tomazoni, da JBS, que ganhou R$ 52,6 milhões em 2021.

Eduardo Bartolomeo, presidente da mineradora Vale Foto: Ben Hider

Em relação ao salto de 30% na remuneração de altos executivos de um ano para o outro, a principal explicação das empresas se refere ao fato de que, em 2020, primeiro ano da pandemia de covid-19, muitos dos salários não sofreram reajuste algum – e que o ano passado foi o momento de compensar parte dessas perdas.

Existe valor ideal?

Apesar dos avanços em termos de governança corporativa no Brasil, ainda não existe por aqui um levantamento estruturado que mostre a diferença entre os salários do alto escalão e o ganho médio dos trabalhadores das companhias. Nos Estados Unidos, o Economic Policy Institute já fez esse mapeamento, que deixou evidente o abismo salarial dentro de uma mesma empresa.

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O resultado mostrou que, em 2020, os presidentes das 350 maiores empresas americanas ganharam, na média, 351 vezes mais que seu funcionário “médio”. O salário dos presidentes, conforme o levantamento, cresceu 18,9% naquele ano, enquanto o ganho do trabalhador comum avançou só 3,9%. O estudo mostra ainda que, em 1965, essa diferença salário entre CEO e o restante da empresa era de 21 vezes.

“A pandemia trouxe uma dinâmica importante para o tema, chamando atenção para distanciamento de salários entre a base e o topo da pirâmide corporativa, em meio a demissões e reduções de salários. E é cada vez mais comum as empresas incorporarem metas para executivos atreladas a temas relacionados ao ESG (ambiental, social e governança), incluindo métricas de diversidade em postos de trabalho”, afirma o presidente da Amec, associação que representa investidores, nacionais e estrangeiros, Fabio Coelho.

Já o gerente de Pesquisa e Conteúdo do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC), Luiz Martha, reforça que uma métrica que vem sendo analisada por investidores é exatamente se o crescimento do salário médio dos empregados de uma empresa segue o mesmo ritmo do que o do CEO, mesmo que os valores em si não sejam comparáveis. Ele frisa, contudo, que a análise de um salário de um executivo do alto escalão de uma grande empresa precisa computar uma série de variáveis.

Holofote

Dentro do levantamento feito para o Estadão, quando é analisado o conjunto dos salários de diretoria da empresa, chama a atenção o caso do Bradesco. O alto escalão do banco somou uma remuneração de R$ 818 milhões, muito por conta do volume de membros da diretoria, que tem um total de 88 executivos. O maior valor de 2021 foi recebido pelo presidente do banco, Octavio de Lazari: R$ 23,7 milhões.

Outra empresa cuja remuneração da diretoria salta aos olhos, mas que está de fora da lista dos dez maiores, é a da agência de turismo CVC, que ainda tenta se recuperar da crise com a pandemia. A remuneração total da diretoria soma R$ 28 milhões, sendo que 64% desse valor foram pagos apenas para seu presidente, Leonel Andrade. Procurada, a empresa não comentou.

A preocupação dos investidores, do ponto de vista de governança corporativa, está em um eventual enriquecimento excessivo, às custas dos acionistas.”

Fabio Coelho, presidente da Amec

“Falta transparência sobre os critérios utilizados na distribuição da verba global aprovada pelos acionistas em assembleia. Quando analisamos a distribuição pelos dados dos formulários de referência são constatadas algumas discrepâncias, quase sempre beneficiando administradores ligados aos acionistas controladores”, afirma Renato Chaves, que organizou o estudo para o Estadão. Essa diferença, diz ele, se refere ao salário do presidente de algumas empresas em relação ao restante da equipe de diretores.

Coelho, da Amec, aponta que o tema remuneração é sempre um dos mais acalorados durante a temporada de assembleias das companhias de capital aberto. “A preocupação dos investidores, do ponto de vista de governança corporativa, está em um eventual enriquecimento excessivo, às custas dos acionistas, quando há desalinhamento entre valores pagos e entrega de resultados de longo prazo”, afirma.

E essa discussão se espalha pelo mundo. Uma das maiores empresas do mundo, a Apple, foi questionada neste ano sobre a remuneração de seu presidente Tim Cook. “Ninguém duvida de sua capacidade executiva, com histórico de muito sucesso, mas a ausência de divulgação de metas a serem atingidas despertou questionamentos diante de valores pagos tão expressivos”, explica Coelho. Cook recebeu US$ 100 milhões em 2021.

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O que dizem as empresas

Procurada, a Vale disse que a remuneração, além de seguir práticas de mercado, levando em conta as responsabilidades, competências e valor dos serviços de cada executivo, recebeu recomendação de aprovação pelas agências ISS e Glass Lewis. Foi aprovada também na assembleia da companhia por 99% dos acionistas. A mineradora disse ainda que remuneração do ano passado foi impactada pelos resultados positivos apresentados pela empresa em 2021 e frisou que 87% do pagamento tem componente de performance.

O Bradesco disse, em nota, que “o montante global da remuneração é aprovado em assembleia de acionistas”. Destacou ainda que os valores individuais “estão em linha com a média de mercado, e levam em consideração também o grau de responsabilidade perante o conglomerado, bem como o porte e a performance da empresa”.

A Rede D’Or, por sua vez, informou que, de acordo com o código de ética da companhia, não comenta assuntos pessoais.

As demais empresas citadas preferiram não comentar.

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