Quando os três irmãos Rubens, Vanessa e Fábio Martinez decidiram empreender no setor calçadista com a marca Santa Lolla, eles queriam ter uma empresa nos moldes tradicionais. Um grande centro de distribuição centralizaria a produção de sapatos das fábricas, que seria distribuída para as lojas.
O ano era 2004 e os três sócios egressos de outras carreiras, dois deles sem afinidade com o varejo – Rubens é engenheiro civil, Vanessa é nutricionista e só Fábio é administrador de empresas –, não tinham dinheiro para bancar um empreendimento nesse formato verticalizado.
Por conta da falta de recursos, o plano inicial para ingressar no varejo calçadista, seguindo a tradição do pai e do tio, donos da loja de calçados Martinez em São Paulo, teve de ser adaptado. Acabaram construindo uma empresa horizontal, praticamente sem ativos. “A gente não tinha capital para comprar todo estoque do fabricante, centralizar e depois vender”, lembra Rubens Martinez, sócio-fundador.
A saída foi virar um grande gestor “do meio”. Isto é, fazer a intermediação entre as indústrias e as lojas. Os sócios desenvolviam as coleções e contratavam as fábricas para produzi-las. Os calçados eram faturados e entregues diretamente dos fabricantes para as lojas. E eles ganhavam um porcentual sobre a venda.
Vinte anos depois, ainda funcionando nesse formato, o grupo SL Company, dono das marcas Santa Lolla, Degalls e SL3, com 325 lojas, quase a totalidade franqueada, é uma das emergentes do varejo, segundo o Ranking Cielo-SBVC de 2024. A empresa faturou R$ 2,4 bilhões em 2023, deve fechar 2024 com R$ 2,7 bilhões e projeta vendas de R$ 3,2 bilhões para o ano que vem.
Além da grande aceitação do produto, os sócios atribuem a escalada da empresa a essa estrutura “leve”. O formato de negócio imposto pela falta de condição financeira virou estratégia.
“Somos o Uber e o Airbnb dos calçados, só que fizemos isso antes deles”, compara Rubens. O Uber e o Airbnb são as maiores empresas de transporte e de hospedagem, respectivamente, sem ser ter um veículo ou um único quarto de hotel próprio.
Coordenar as diversas peças desse vasto ecossistema é um desafio complexo: são 35 fábricas estrategicamente contratadas em diferentes regiões do Brasil para assegurar a capilaridade das entregas, 325 franquias — com previsão de chegar a 360 em 2025 — e mais de 2 mil pontos de venda multimarcas. Apesar da complexidade, “esse ecossistema flui”, afirma Rubens.
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Entre as vantagens dessa estrutura “leve” está o custo fixo menor. Com isso, é possível vender produtos similares ao da concorrência com preço entre 20% e 30% mais baixo. “Não pensamos mais em verticalizar a empresa e quando a gente pensa, passa rápido a vontade”, brinca Rubens, argumentando que muitas empresas gostariam de ter essa estrutura enxuta.
‘Feeling’ e filhotes
Os sócios também atribuem à grande aceitação dos produtos pelo consumidor como o outro o pulo do gato da marca. No início, a criação dos calçados era feita de forma autoral. Isto é, o que os sócios achavam bonito e criativo, eles transformavam em produto. “Eu ia na (rua) 25 de Março, pegava tecido, pedra, juntava e fazia um sapato”, lembra Fábio Martinez, sócio-fundador.
Os três irmãos chegavam a ficar dias dentro de uma fábrica rabiscando, desenhando, misturando couro com tecidos até sair uma coleção, conta Vanessa Martinez, sócia-fundadora. “Continuamos participando da criação”, diz ela. Só que hoje a empresa tem uma equipe com 20 designers. Eles criam as coleções também com base no que está acontecendo nas passarelas internacionais.
Esse processo tem rendido vários filhotes. Além da Santa Lolla, voltada para antecipar as tendências dos calçados femininos de moda, o Grupo SL criou outras marcas.
A marca Degalls é mais voltada para calçados, majoritariamente femininos, clássicos e atemporais. Atualmente são seis lojas franqueadas. Já a SL3 foca em calçados masculinos, vendidos em lojas multimarcas. E a SL Handbags é exclusiva em bolsas e acessórios. Hoje são quatro lojas físicas e a meta é chegar a 15 franquias em 2025.
Há planos para ingressar em 2025 no mercado de calçados infantis e óculos. Esses produtos serão licenciados com a marca Santa Lolla e vendidos em lojas multimarcas. Em 2023, a companhia já lançou perfumes licenciados da marca.
A estratégia de licenciar a marca para outros itens, além de calçados e bolsas, nos quais a Santa Lolla é reconhecida, visa buscar novas avenidas de crescimento em outros mercados, diz Rubens.
Por meio de distribuidores e lojas locais, os produtos da marca já estão presentes nos Estados Unidos e na França. A exportação é tímida, mas para 2025, o plano é iniciar vendas para Portugal, Espanha, Itália e Angola.
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