São Paulo - O Santander entrou com recursos na Justiça para suspender a Recuperação Judicial (RJ) das Americanas. O Santander, em dois documentos com a data de hoje, argumenta que o “pior já aconteceu” e alega que a Justiça do Rio de Janeiro não é a mais apropriada para julgar o pedido da rede de varejo, que deveria transcorrer em São Paulo, onde a maior parte das decisões da rede é tomada.
“O processamento da recuperação judicial deve, sempre, se dar no foro em que o devedor centraliza a direção geral dos seus negócios”, argumentam os advogados do Santander, em documento que o Estadão/Broadcast teve acesso. No pedido, há até fotos de um prédio, que o documento diz ser a sede da Americanas no Rio.
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Há ainda um pedido para que a Justiça determine que a Americanas apresente, em 24 horas, documentos que “comprovem cabalmente” que a cidade do Rio de Janeiro é de fato o principal local de sua sede.
Pedido do Safra é negado
Já o Safra, que tem R$ 2 bilhões em linhas de crédito com a varejista, alegou que seria necessária uma perícia mais detalhada para saber as condições reais da rede de varejos e que ela não apresentou os três últimos balanços, um dos requisitos em um processo de recuperação judicial.
A Justiça do Rio de Janeiro negou o pedido da defesa do Safra. A desembargadora Leila Santos Lopes barrou ainda o pedido do banco para não ter de devolver R$ 95 milhões da companhia mantidos em contas no banco, e que haviam sido retidos para fazer frente à liquidação de dívidas da empresa.
De acordo com Lopes, a alegação dos advogados do Safra, de que diante das datas das decisões favoráveis à Americanas o banco não teria de devolver os recursos, não cabem neste caso. Além disso, a desembargadora não considerou que o perigo de má utilização dos recursos, alegado pela defesa do banco, está verificado.
Na decisão em que a aceitou o pedido de recuperação judicial da Americanas, a Justiça do Rio determinou que os bancos que haviam retido dinheiro da companhia para fazer frente ao vencimento antecipado de dívidas devolvessem os recursos em até seis horas, sob pena de multa de 10% dos valores. O Safra era um dos bancos atingidos pela decisão.
O BTG Pactual foi a exceção, porque é beneficiado por liminar que permite o bloqueio dos recursos, de R$ 1,2 bilhão, até o mandado de segurança pedido pelos advogados do banco seja analisado. O Safra, bem como outros bancos, como o BV, vinha tentando estender os benefícios da liminar a si.
Relação com os bancos se deteriora com carta do trio de acionistas
O posicionamento dos acionistas de referência da Americanas enfureceu ainda mais os bancos credores da varejista, que começam a falar nos bastidores sobre possíveis retaliações. Algumas instituições já teriam começado a reduzir o crédito a outras empresas que têm o trio Jorge Paulo Lemann, Carlos Alberto Sicupira e Marcel Telles, como a Ambev. Nos bastidores, o tom é de revolta, agravada por uma briga judicial entre as duas partes que não parece estar perto de terminar.
O movimento entre as instituições seria, primeiro, o de reduzir limites de crédito das empresas ligadas ao grupo, e depois, não conceder mais crédito. Com isso, as companhias teriam de se financiar no exterior, com custos mais altos, mesmo para linhas mais simples, como capital de giro, e teriam que lidar ainda com questionamentos de governança suscitados pelo episódio Americanas.
No domingo, Lemann, Sicupira e Telles, acionistas de referência da varejista, emitiram uma nota pública em que se posicionaram pela primeira vez desde o estouro do caso Americanas. Um trecho enfureceu os bancos: o que sugere que as instituições deixaram o rombo contábil passar, ou seja, teriam parte da culpa.
“Ela (a auditoria PwC), por sua vez, fez uso regular de cartas de circularização, utilizadas para confirmar as informações contábeis da Americanas com fontes externas, incluindo os bancos que mantinham operações com a empresa. Nem essas instituições financeiras nem a PwC jamais denunciaram qualquer irregularidade”, afirmou o trio através da nota.
O texto piorou o clima entre o grupo e os bancos, que vinha estremecido desde o começo das negociações, quando os acionistas, através do então assessor Sergio Rial, propuseram que os bancos convertessem 20% das dívidas da Americanas em ações. Para os bancos, o trio precisaria injetar ao menos R$ 15 bilhões na Americanas, para mostrar compromisso com a companhia.
A pisada no freio do crédito seria uma reação ao texto, mas desde a eclosão do rombo da Americanas, e a dificuldade de negociação que se seguiu, os bancos já vinham encarando com mais cautela a liberação de linhas de financiamento para outras empresas deles. Para uma fonte da Faria Lima, “certamente” alguns bancos deixarão de relacionar-se com o grupo, e em alguns de forma imediata.
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