‘Com seca, tendência é conta de luz continuar na bandeira vermelha’, diz diretor-geral da Aneel

Sandoval Feitosa se diz alerta para questões climáticas, e avisa que agência não participa do debate sobre volta do horário de verão

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Foto: CLEIAVIANA
Entrevista comSandoval FeitosaDiretor-geral da Aneel

BRASÍLIA - A eventual persistência da seca histórica no País e o consequente impacto nos reservatórios nos próximos meses levará à manutenção da bandeira tarifária vermelha 1 ou o acionamento da bandeira vermelha 2, o que significa preços mais altos na conta de energia elétrica para o consumidor, informou o diretor-geral da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), Sandoval Feitosa, em entrevista ao Estadão/Broadcast. Ele aponta que essa “grande tendência” ainda pode ser alterada e não há um prognóstico definitivo.

“Se o período seco continuar da forma como está, há uma grande tendência de que a gente continue com a bandeira vermelha, patamar 1 ou patamar 2, e um eventual agravamento dessa situação vai depender de alguns mecanismos que nós já estamos tomando”, declarou.

Sandoval também adiantou que deve terminar neste mês o processo de fiscalização iniciado pela área técnica do órgão regulador após a indefinição de inconsistência que resultou em revisão extraordinária e inédita da bandeira tarifária. Na entrevista, o diretor-geral falou da ausência do quinto diretor na diretoria dos órgão e da possibilidade de retorno sobre o horário de verão.

A seguir, os principais trechos da entrevista:

São quase 10 anos de bandeira tarifária, quais os efeitos práticos?

A bandeira tarifária já faz parte do cotidiano da sociedade brasileira, é uma conquista para a população. Uma das questões positivas é a educação, o uso eficiente da energia elétrica. O outro ponto é o ponto da economia de juros para a população. São mais de R$ 4 bilhões em 10 anos.

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Sandoval Feitosa afirma que a Aneel não participa do debate sobre a volta do horário de verão Foto: Cleia Viana/Aneel

Cobrança de valores corridos com juro na tarifa?

Antes da bandeira tarifária, quando havia um grande aumento do custo de energia, as distribuidoras pagavam esse custo. Quando chegava no processo tarifário, elas tinham que cobrar esse valor que elas pagaram a mais, acrescido de juros. Hoje, quando você tem o acionamento de um recurso mais caro, imediatamente, no mês seguinte, aquilo já é cobrado do consumidor. Daí a economia com juro.

O erro de cálculo que levou a revisão da bandeira vermelha 2 para 1 foi inédito?

Sim. Erros eventuais ou inconsistências, durante o processo de análise dos dados, podem ocorrer e são corrigidos. O grande problema foi a consideração de uma Usina duas vezes (usina de Santa Cruz), em dois arquivos computacionais. O ONS (Operador Nacional do Sistema Elétrico) já tinha rodado o custo marginal de operação e a CCEE (Câmara de Comercialização de Energia Elétrica) o cálculo da função de custo futuro e o Preço da Liquidação das Diferenças (PLD). E nós já tínhamos que a bandeira era vermelha 2.

O erro veio depois então?

Identificou-se que tinha essa duplicidade. A regra diz que erros ou inconsistências encontradas, você considera no dia seguinte e não recalcula a bandeira. Isso aconteceu no sábado e o dia seguinte era domingo. Como foi no início do mês, conseguimos corrigir isso sem trazer nenhum dano maior ao consumidor, porque os consumidores que eventualmente foram faturados no início do mês, nós temos uma regra que aquele erro de faturamento é devolvido, é automático.

Quantitativamente qual o impacto?

A receita do segmento de distribuição custa R$ 250 bilhões por ano. Essa correção da bandeira foi uma diferença de R$ 900 milhões. Então, nós estamos falando de um erro de 0,4% na tarifa. Ou seja, é um erro muito pequeno.

Qual o andamento da fiscalização que a Aneel abriu?

Nós designamos três técnicos da Agência, porque nós entendemos que o significado da bandeira tarifária na sociedade brasileira hoje é um significado muito caro. E não pode pairar nenhuma dúvida para a população brasileira da transparência, da credibilidade desse instrumento. Os técnicos foram já na CCEE e no ONS na semana passada. Já reportaram aqui que o processo transcorreu na sua tranquilidade. Nós vamos simular os dados aqui na Aneel. Então, nesse momento ainda estamos na fase de apuração das informações.

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Vai considerar a usina de Santa Cruz na fiscalização?

Não, a inconsistência foi que a usina foi considerada duas vezes, só isso.

Tem prazo?

Eu estou pedindo para a equipe tentar fazer isso antes do início da publicação da próxima bandeira. Se eventualmente não conseguir, na próxima, seguramente nós já teremos isso pronto. Tanto o ONS como a CCEE já receberam orientações da Aneel para que erros como esse não ocorram mais.

Novos aprimoramentos no sistema de bandeira tarifária estão sendo planejados?

Nós aprimoramos recentemente o mecanismo das bandeiras tarifárias. Atualizamos as faixas de acionamento. Nós inserimos também uma variável importante que é a influência dos despachos termoelétricos fora da ordem de mérito, porque antes esses despachos eram definidos pelo CMSE e não influenciavam na bandeira. Agora, pela metodologia que já foi aprovada este ano ainda, essa variável influencia no valor da bandeira.

Essa possibilidade de retomada do horário de verão encontra respaldo técnico na Aneel?

A Aneel não participa dessas discussões. Então, essa é uma discussão que ocorre estritamente no âmbito do Ministério e do ONS. Porque há perspectivas técnicas, e aí essa é a visão que cabe ao Operador Nacional do Sistema Elétrico. No Ministério de Minas e Energia, há questões técnicas e há questões políticas associadas a outras indústrias que, de alguma forma, são influenciadas pelo horário de verão, a questão do turismo, comércio, segurança pública. Então, isso são componentes políticas que cabem ao Ministro, juntamente com a presidência da República avaliarem.

Com o cenário climático do País, como fica a perspectiva para bandeiras tarifárias nos próximos meses?

Nos preocupa toda a questão ambiental associada. O ano de 2023 foi o mais quente da história e 2024 caminha para superar o ano de 2023. Então, se essas altas temperaturas se confirmarem, temos uma tendência de um maior deplecionamento (diminuição do volume de água) dos reservatórios. Precisamos observar quão desfavorável será o período seco e quão generoso será o próximo período úmido para que possamos ter uma perspectiva melhor sobre aumento de tarifas, acionamento de bandeiras e, claro, maior custo para a sociedade como um todo.

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Mas há uma tendência?

O que eu posso dizer é que este ano nós temos uma desfavorabilidade grande com relação ao custo da energia elétrica. Nós não podemos assegurar com grande certeza como a bandeira vai se comportar, por exemplo, até dezembro, ou além de dezembro. Mas, certamente, se o período seco continuar da forma como está, há uma grande tendência que a gente continue com a bandeira vermelha, patamar 1 ou patamar 2, e um eventual agravamento dessa situação vai depender de alguns mecanismos que nós já estamos tomando, enquanto governo no sentido amplo, Aneel, Ministério e ONS.

Quais ações com maior potencial?

Nós aprovamos a resposta da demanda, que é um mecanismo importante, para conter o consumo nos horários de ponta e evitar despacho de termoelétricas mais caras. Nós também temos hoje uma complementaridade de energias renováveis muito grande, o que nós não tínhamos em anos anteriores, então a gente está em outro ponto de operação.

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