RIO - No Brasil há 110 anos, a Shell prevê que a última gota de petróleo extraída pela empresa no mundo deve vir daqui, onde ainda pretende operar por muitos anos e completar a transição energética para fontes renováveis. Para tanto, o presidente da companhia no Brasil, Cristiano Pinto da Costa, diz que o País precisa acelerar as licenças para investimentos em petróleo e gás e correr com o marco regulatório da energia eólica offshore (em alto-mar), sob risco de o capital que poderia ser investido no Brasil ir para outros países onde a empresa atua.
“O Brasil é hoje para a companhia um país prioritário”, afirma Pinto da Costa na primeira entrevista exclusiva desde que assumiu a direção da empresa, em agosto de 2022. Engenheiro químico de formação, o executivo está há 25 anos na petroleira e atuou na sede, em Londres, e em praças como Haia e Houston, antes de voltar ao Brasil, em 2018.
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“A Shell continua a ter muito investimento nos campos onde atua (no Brasil), além de novas unidades de produção. O E&P (exploração e produção) ainda é e vai continuar a ser o carro-chefe da companhia no Brasil, mas damos passos concretos para abrir novas frentes de negócios, em linha com a estratégia do grupo de já se preparar para a transição energética”, diz.
Atualmente, a Shell tem 17 navios-plataforma ativos, outros três já contratados e mais três planejados para serem incorporados no futuro. “Visualizamos mais de 20 unidades de produção até o fim da década”, comenta o presidente da Shell no Brasil.
Investimentos
Sem faltar a nenhum leilão no Brasil desde 1999, quando começaram as licitações de exploração de petróleo e gás no setor, quebrando o monopólio de décadas da Petrobras, a Shell é hoje a maior produtora de petróleo privada no Brasil, com média de 400 mil barris diários. O recorde, de 448 mil barris em um dia, aconteceu em 9 de outubro do ano passado. E a tendência é crescer.
A lista de 32 países onde a Shell produz petróleo atualmente será reduzida para nove, e o Brasil está entre os escolhidos. Também estão na lista Brunei, Estados Unidos, México, Reino Unido, Nigéria, Cazaquistão, Omã e Malásia. Com isso, os investimentos locais também devem subir, afirmou Costa.
“Quando tem uma concentração do número de países, o porcentual por país vai subir. Então, proporcionalmente, é capaz de que isso aconteça”, avalia.
O motivo para o otimismo é a grande produtividade dos campos do pré-sal, onde está desde o começo em parceria com a Petrobras. Como exemplo, Costa destaca a produção da plataforma Mero 1, na Bacia de Santos. “É um FPSO (unidade flutuante de armazenamento e transferência) enorme, de 180 mil barris, que atingiu o platô em pouco mais de oito meses de produção com apenas quatro poços. É difícil achar algo parecido no mundo”, disse.
O executivo aponta que, quanto maior a produtividade de um campo, mais baixa a intensidade de carbono gerado por barril comparado a outros países, o que ajuda a prolongar a vida da produção no Brasil.
“Do ponto de vista competitivo, tanto de custo de produção quanto de intensidade de carbono, os barris de petróleo produzidos em águas profundas no Brasil e no pré-sal vão ser os mais competitivos e consequentemente os mais resilientes no longo prazo. Outras fontes de produção de óleo e gás vão fechar antes. A nossa vai ser uma das últimas”, prevê.
Futuro da exploração
Pinto da Costa reforça que a Shell segue com o foco na exploração das bacias de Campos e Santos, onde tem perfurações marcadas. Mas não descarta uma fronteira que o País ainda não explorou devido a questões ambientais: a Margem Equatorial. Para Costa, é preciso verificar se existe potencial a ser realizado na região, principalmente depois de grandes descobertas em países fronteiriços, como Guiana e Suriname. Ele destaca que este será um dos grandes temas a serem tratados pelo governo Lula por ser estratégico e atrair investimentos, empregos e impostos.
“Dentro do Brasil, ainda há potencial exploratório em Campos e Santos, mas o País vai ter de começar a olhar em outras bacias porque está ficando claro para todos que o potencial de Santos e Campos está chegando no seu limite”, avalia.
Nos últimos cinco anos, a Shell Brasil investiu R$ 36 bilhões no Brasil, com uma média anual de US$ 1 bilhão a US$ 2 bilhões. A produção brasileira corresponde a algo entre 10% e 12% da produção global da petroleira. No mundo, a empresa investe anualmente entre US$ 7 bilhões e US$ 8 bilhões no negócio de upstream (exploração e produção) e de US$ 3 bilhões a US$ 4 bilhões em energia renovável, além de US$ 5 bilhões a US$ 6 bilhões no braço de gás e petroquímica.
Eólica offshore
O executivo acrescenta que a companhia gosta de fechar parcerias para dividir riscos e não será diferente se houver decisão pela entrada na geração de energia eólica offshore. Um exemplo é o memorando de entendimento assinado com a Eletrobras, no fim do ano passado, para avaliar oportunidades no setor.
Na avaliação do executivo, os projetos só devem sair do papel no fim desta década. Mesmo assim, se o marco regulatório que tramita na Câmara dos Deputados resultar atrativo para os vultosos investimentos previstos. A Shell já protocolou no Ibama projetos de eólica offshore para as costas de seis estados brasileiros, com capacidade instalada prevista de 17 gigawatts (GW).
“Se o Brasil conseguir nos próximos 12 a 18 meses a validação do marco regulatório (de eólica offshore) e publicar o primeiro leilão de áreas para a exploração, não estaremos atrasados (com relação ao mundo). Mas isso é uma corrida. Quanto mais tempo o Brasil demorar a avançar com o marco regulatório, quanto menos competitivo esse marco regulatório for, mais o dinheiro vai para outros lugares”, diz Pinto da Costa.
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