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Simone Tebet, crítica do orçamento secreto, vai assumir ministério que pode reformar Orçamento

Senadora e ex-candidata à presidência fará parte do núcleo da equipe econômica de Lula, com Haddad (Fazenda), Alckmin (Indústria) e Esther Dweck (Gestão)

Foto do author Lauriberto Pompeu
Foto do author Daniel  Weterman
Atualização:

BRASÍLIA - Escolhida para comandar o Ministério do Planejamento, a senadora Simone Tebet (MDB-MS) assumirá a pasta após uma série de indefinições sobre seu espaço no governo e disputas com alas do PT e do MDB. A parlamentar, que termina seu mandato no Congresso neste ano, vai assumir uma pasta que trata diretamente da coordenação do Orçamento federal. Ela terá a missão de dialogar com deputados e senadores para construir uma peça orçamentária que atenda aos interesses do Executivo e do Congresso e fará parte do núcleo da equipe econômica do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que também contará com Fernando Haddad no Ministério da Fazenda, com o vice-presidente eleito Geraldo Alckmin no Ministério de Indústria, Desenvolvimento e Comércio Exterior e com Esther Dweck no Ministério de Gestão e Inovação.

A articulação envolvendo o orçamento ganha nova importância dado o contexto atual. A decisão do Supremo Tribunal Federal de proibir o orçamento secreto, esquema de compra de apoio política revelada pelo Estadão, obriga que o governo eleito ajuste a forma de distribuir emendas com os parlamentares.

O orçamento secreto consiste em trocar indicações de verbas do orçamento federal pelo apoio a assuntos de interesse dos presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), e do governo federal. O esquema era posto em prática com a utilização das emendas de relator, modalidade sem transparência em que os presidentes das duas Casas Legislativas tinham poder quase absoluto e não dependiam de negociações com o Poder Executivo. Com a decisão do Poder Judiciário, a cúpula do Congresso ainda vai ter influência sobre o orçamento, mas o governo federal retoma influência nas negociações.

Tebet acertou apoio a Lula no segundo turno da eleição presidencial  Foto: ALEX SILVA/ESTADAO

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Tebet foi candidata do MDB à presidência e enfrentou Lula no primeiro turno da campanha. Escolhida como nome da chamada terceira via para a disputa, ela criticou os casos de corrupção do PT e também focou ataques no presidente Jair Bolsonaro, a quem classificou como o pior presidente da história. Um mote recorrente da campanha presidencial da emedebista foram justamente as críticas ao orçamento secreto, que teve início no governo Bolsonaro.

Em entrevista ao Flow Podcast em agosto, a futura ministra classificou o orçamento secreto como “maior esquema de corrupção do planeta Terra”. No mesmo mês, quando participou de um comício em São Paulo, a parlamentar falou sobre investimentos em educação e disse que “dinheiro tem, só que está indo para a corrupção do orçamento secreto”.

Ainda durante a campanha de primeiro turno, antes de embarcar no projeto petista, a senadora chegou a comparar a prática com o mensalão, esquema de corrupção revelado durante o primeiro mandato de Lula como presidente. “O orçamento secreto comprou a eleição para a presidência do Senado. Perdi a eleição para o orçamento secreto. Eis a versão 2.2 do mensalão”, declarou em julho deste ano ao comentar a derrota sofrida por ela ao ter concorrido ao comando do Senado com Pacheco em 2021.

No segundo turno, a emedebista abandonou os ataques a Lula e mergulhou na campanha do petista, gravando propagandas, andando ao lado do então candidato do PT nas agendas de campanha e originando a fatura do cargo.

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Antes de aceitar ser ministra, a senadora tentou turbinar a pasta. A parlamentar pediu que ficassem sob a sua alçada estruturas estratégicas, como a Caixa Econômica Federal, o Banco do Brasil e o Programa de Parcerias e Investimentos (PPI). Tradicionalmente os bancos públicos ficam com o Ministério da Fazenda, que será comandado pelo petista Fernando Haddad. A ideia de transferir os bancos foi prontamente descartada.

A tentativa de puxar os bancos para o Planejamento irritou o futuro ministro da Fazenda, que chegou a falar para interlocutores que não havia entendido o pedido de Tebet e que interpretou isso como um pretexto usado por ela para recusar o ministério. Haddad chegou a procurar o senador eleito Renan Filho (MDB-AL) para ser ministro do Planejamento, mas ele e a bancada do partido no Senado preferiram uma pasta com entrega direta a população - ele será ministro dos Transportes. Apesar disso, houve acordo entre o PT e Tebet para ela assumisse a pasta. O próprio Haddad não fez objeção à senadora quando a escolha se encaminhou para ser sacramentada.

Petistas sinalizaram que Tebet terá influência sobre o PPI, ainda que o programa fique sob o guarda-chuva da Casa Civil, comandada por Rui Costa. Em entrevista coletiva, o futuro ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, comentou sobre a estrutura da pasta de Tebet. “O Ministério do Planejamento é muito importante, tem um papel decisivo de acompanhamento, participa dos comitês gestores que são coordenados pela Casa Civil, inclusive do comitês gestor do PPI, que é coordenado pela Casa Civil, executado pelo ministério que está na ponta e o Planejamento participa desse comitê gestor”, afirmou. A pasta também terá sob a sua responsabilidade o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).

A futura ministra do Planejamento entrou na política pelas mãos do pai, o ex-presidente do Senado Ramez Tebet, em 2002, quando foi eleita deputada estadual em Mato Grosso do Sul, no mesmo ano em que Lula foi eleito para o primeiro mandato à frente do Planalto. Ela foi prefeita de Três Lagoas, sua cidade natal, vice-governadora do Estado, secretária de governo e conseguiu uma vaga no Senado em 2014.

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Antes de ser definida no Planejamento, Tebet tentou ser ministra do Desenvolvimento Social e coordenar o Bolsa Família, uma das principais vitrines do governo Lula. O petista vai aumentar o benefício do Bolsa Família, mantendo o pagamento mensal de R$ R$ 600 e concedendo um valor extra de R$ 150 para crianças de até seis anos. A ampliação motivou a aprovação de uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) e forçou Lula a negociar a entrega de cargos e a manutenção de espaços de parlamentares no orçamento antes mesmo de tomar posse.

Apesar disso, o PT fez intensa pressão para ter o controle da pasta que coordena os programas sociais. O escolhido para a função foi o senador eleito Wellington Dias (PT-PI). A emedebista chegou a falar que não participaria do governo se não fosse ministra do Desenvolvimento Social, mas depois de se reunir com Lula na semana passada, passou a deixar a porta aberta para outras opções.

Histórico e embates no MDB

A atuação da parlamentar nos oito anos de Senado foi de embates com o PT para a oposição ao governo do presidente Jair Bolsonaro, o que aproximou a senadora a aliados de Lula no Congresso. Simone votou a favor do impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff e foi favorável às reformas econômicas criticadas por Lula, incluindo o teto de gastos públicos e a reforma trabalhista.

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No último ano, ela ganhou destaque na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid. Mesmo não sendo integrante da comissão, Simone atuou na investigação da compra suspeita da vacina Covaxin. A futura ministra do Planejamento foi a autora da pergunta que levou o deputado Luis Miranda (Republicanos-DF), a arrolar o líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR), nas suspeitas envolvendo a compra do imunizante.

Além dos embates com o PT, Simone Tebet acumula uma série de insatisfações com caciques do MDB, seu próprio partido. Foi assim nas duas vezes que tentou presidir o Senado, na candidatura à Presidência da República e na escolha para o ministério, que não foi bancada por integrantes históricos da legenda nem incluída na cota de cargos reivindicada pelo partido para o futuro presidente.

Em 2019, Simone sofreu uma derrota para o senador Renan Calheiros (MDB-AL), até hoje um adversário interno no partido, ao tentar concorrer à Presidência do Senado. Renan foi o candidato e perdeu para Davi Alcolumbre (União-AP). Dois anos depois, Simone conseguiu a indicação, mas viu o partido abandoná-la para apoiar a escolha de Rodrigo Pacheco na reta final da disputa. Cinco meses depois, a senadora disse ao Estadão que perdeu a disputa para o orçamento secreto, em função das verbas distribuídas a senadores para eleger Pacheco.

A candidatura ao Planalto foi alvo de emedebistas que apoiaram Lula logo no início da campanha, entre eles Renan Calheiros e Eunício Oliveira. Ao sair candidata, a senadora argumentou que o MDB precisava recuperar protagonismo e poder de articulação no cenário nacional. A parlamentar avalia que o Centrão, bloco de partidos que domina a pauta do Congresso, só conquistou o poder que tem por falhas do MDB ao perder esse espaço. “Eu queria estar no PT para falar isso”, confidenciou a interlocutores antes da campanha presidencial.

Agora, na transição do governo Bolsonaro para o governo Lula, os mesmos caciques do MDB cobram ministérios de Lula e não bancaram a indicação da senadora para o Desenvolvimento Social, argumentando que a escolha cabia à cota pessoal de Lula e não poderia reduzir ou outros cargos que o partido terá no governo.

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