Carreira em W ou Y: entenda a diferença e saiba por que esses modelos têm crescido nas empresas

Corporações começam a enxergar a importância do perfil técnico dentro da organização e oferecem planos de carreira mais horizontais, em que os cargos de senioridade são tão valorizados quanto os de alta gestão

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Por Bianca Zanatta
Atualização:

ESPECIAL PARA O ESTADÃO - Para muitos, o caminho natural na carreira é começar em cargos mais operacionais ou básicos e, com o tempo e a experiência, ir subindo na hierarquia da empresa: de analista a coordenador, depois gerente, quiçá um dia diretor, vice-presidente ou até o cobiçado cargo de CEO. Há outro perfil, no entanto, que não quer saber de cargos de chefia. São pessoas que, em vez de gerenciar times, crises e estratégias, preferem se mover de forma horizontalizada na estrutura organizacional, especializando-se tecnicamente ou até passeando entre diferentes áreas, com uma pegada mais multidisciplinar.

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Desde que começaram a olhar para as competências e habilidades técnicas e também socioemocionais dos colaboradores, algumas empresas passaram a reestruturar seus planos de carreira para incluir modelos em Y ou em W, que oferecem possibilidades de crescimento profissional em diferentes direções.

O especialista em carreiras e negócios Uranio Bonoldi, autor do livro Decisões de Alto Impacto (Alta Books Editora), explica que a carreira em Y é um modelo em que a empresa permite que o colaborador possa crescer em duas direções: liderança ou funções técnicas. No caso da W, ainda mais flexível, o crescimento vai de acordo com o propósito estabelecido pelo profissional. “É uma visão mais holística para se desenvolver em todas as áreas da companhia”, afirma.

Bonoldi fala que essas nomenclaturas surgiram quando as companhias perceberam a importância de reconhecer o técnico com o mesmo valor que a liderança. “Os líderes que não olharem para isso estão fadados ao insucesso, porque são esses profissionais que trazem inovação para a empresa, proporcionando soluções, produtos e serviços que conversam com as necessidades dos clientes”, alerta.

“São pessoas que talvez não tenham a habilidade de mediar conflitos, fazer planejamento financeiro, garantir o cumprimento de estratégias, mas que surgem com grandes ideias de produtos e soluções. São habilidades diferentes, mas que têm o mesmo valor para a empresa.”

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Dentro do plano de carreira das organizações, essas figuras estão claramente mapeadas, segundo o especialista. Na área financeira, por exemplo, é o perfil técnico que garante as informações relevantes para o negócio - o analista, o controller, o contador são os profissionais-chave que compilam as informações para a tomada de decisão do CFO.

“O líder tem o papel de fazer a ponte entre esses técnicos e as necessidades do mercado. Então as organizações têm de olhar com mais carinho para esses profissionais, aproximar do nível de liderança via remuneração, bônus e outros sinais claros de que é um perfil altamente valorizado”, orienta.

Foco em competências

Especializada em marketing digital, a publicitária Flavia Bonfim é analista de parcerias na Vertem, atuando na negociação de ações promocionais com o marketplace varejista e fazendo o meio de campo com o TI da empresa. O contato com o desenvolvimento de produtos para atender à demanda dos parceiros se intensificou no último ano e despertou na executiva o interesse de migrar de área para ser uma product owner, ao invés de ocupar um cargo de gestora em sua própria área. “Vem muito de autoconhecimento, de entender quais são os meus talentos e habilidades. Percebi que estaria mais próspera na área de produtos”, afirma.

Ela diz que a competência de liderar pessoas é algo que ela pratica em outro campo da vida, dando mentoria para jovens profissionais. Já dentro da empresa, entendeu que o legado que quer deixar é em termos de conhecimento especializado e experiência - e identificou em produtos o espaço para essa bagagem proliferar.

“Planejamento e relacionamento sempre permearam minha trajetória profissional e vi que são pontos muito relevantes no dia a dia de produtos. Junto com as ferramentas da área, é possível canalizar isso para trabalhar os processos de forma mais prática e otimizada”, diz a analista, que está buscando certificações e capacitações para atuar na nova função.

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Fernanda Vassoller e Flavia Bonfim: cultura da empresa mais voltada às competências e entregas dos funcionários Foto: Eric Fernandes

Sem escopo engessado

A diretora de RH da empresa, Fernanda Vassoller, explica que a área de pessoas passou por grandes transformações nos últimos três anos e agora tem uma cultura mais voltada às competências e entregas dos funcionários, favorecendo o desenvolvimento de carreiras em Y e em W.

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“A gente não pode inflar a empresa com muita liderança. Queremos valorizar também profissionais com o perfil da Flavia, que ocupam posições de senioridade e extremamente técnicas. Está tudo bem se a pessoa não quer uma cadeira de gestão. Quero que ela esteja 100% no que quer entregar”, defende.

Na prática, a diretora conta que a estrutura de cargos e salários da Vertem é baseada na construção de carreiras focadas nas competências que eles destacam como diferenciais, entre habilidades socioemocionais e técnicas. O quesito salarial é classificado em três pilares: banda padrão, para cargos administrativos ou operacionais; banda técnica, para cargos técnicos; e banda técnica especializada, para cargos com alta senioridade técnica e nível de gestão multidisciplinar.

“Ninguém tem escopo engessado aqui. Promovemos o plano de carreira em Y, priorizando o caminho da gestão ou do foco técnico, e já vivemos também a carreira em W, que projeta a capacidade do profissional de liderar projetos multidisciplinares ou ocupar cargos de maior complexidade”, ela exemplifica.

Mesmos salários e benefícios

O engenheiro Israel Mor fez curso técnico em telecomunicações e começou a estagiar na área ainda no segundo colegial. Foi efetivado pela empresa quando estava na faculdade, no início dos anos 2000, e trabalhou em diversas frentes de telecom, especializando-se na parte de softwares e sistemas de cobrança e controle dos usuários das operadoras.

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De lá para cá, passou por todas as inovações do mercado, da telefonia fixa ao celular e depois à implementação do 2G, 3G, 4G e agora 5G. “Todos esses sistemas, que são complexos e dependem de muita integração entre diversas áreas da operadora, são parte dos produtos que eu trabalho para que os usuários tenham uma experiência boa”, destaca.

Ele define o tipo de cargo que ocupa como “fluido”: ao invés de seguir o rumo da gestão, optou por desenvolver o lado técnico e navegar no mercado de outra forma. “Para assumir um cargo de liderança eu teria de deixar muitos dos desafios de que gosto nessa evolução tecnológica. E o que me levou a seguir nessa carreira mais técnica é também a autonomia que eu tenho”, afirma.

O engenheiro conta que sempre recebeu muito incentivo dos gestores porque ele resolvia os problemas em um setor de alta complexidade e padrões internacionais rígidos. “Não é fácil você adquirir esse conhecimento, não tem uma formação específica. Eu usei a experiência a meu favor para cada vez me desenvolver mais e sou reconhecido por isso, sem precisar estar em cargo de gestão.”

Israel menciona que, por estar constantemente na vanguarda tecnológica, tornar-se referência como especialista no assunto, tanto para a empresa quanto para o mercado, e ter autonomia para definir como trabalhar, entregar e cobrar as pessoas da equipe são alguns atrativos que vê nesse tipo de trajetória. Na empresa onde atua hoje, há também a preocupação de dar oportunidades iguais, em termos de salários e benefícios, a gestores e técnicos.

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Ele, por exemplo, pelo nível de senioridade que já atingiu, tem os mesmos benefícios que os principais gestores da organização. “Mesmo não sendo de gestão, sou um líder técnico e ajudo outras pessoas que querem seguir esse caminho. Sendo um arquiteto de soluções, tenho tanta responsabilidade quanto um diretor de operações ou de marketing”, revela.

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