Desconhecimento barra avanço de licença parental nas empresas

Dois terços das companhias não aderem ao Empresa Cidadã mesmo sendo elegíveis, segundo pesquisa; dentre elas, 37% não o fazem por não conhecerem o programa suficientemente

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Foto do author Ludimila Honorato

A ampliação das licenças maternidade e paternidade por meio do programa Empresa Cidadã é oferecida por apenas 12% das cerca de 200 mil companhias elegíveis no Brasil, 12 anos após o benefício ser estendido à iniciativa privada. De caráter voluntário, a baixa adesão é justificada, principalmente, por falta de conhecimento, o que barra discussões mais avançadas sobre licença parental.

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Pesquisa conduzida pela Family Talks e 4Daddy, à qual o Estadão teve acesso exclusivo, mostra que dois terços das 472 empresas respondentes não aderem ao benefício. Dessas, 37% afirmam que o motivo é não conhecer suficientemente o programa. Os resultados do levantamento serão divulgados ao público e discutidos no seminário online Parentalidade nas Empresas, que ocorre no dia 7 de abril às 18h. Clique aqui para conferir os palestrantes e se inscrever.

A maioria dos que responderam ao questionário eram profissionais que atuam com gestão de pessoas ou relações sindicais e pertencem majoritariamente a organizações de médio e grande portes. Uma parcela de 17% desacredita na viabilidade financeira do Empresa Cidadã e 8% diz não acreditar que essa seja uma demanda interna. Mas, entre as companhias que possuem o benefício da licença ampliada, que vai além das licenças tradicionais de 120 dias para mães e 5 dias para os pais, 69% foram motivadas por pedidos internos e 31% pela influência da sede internacional.

“A viabilidade financeira é a crítica dos empresários. O governo paga a extensão (da licença), mas não no ato. Para empresas que têm dívidas, têm de lidar com fluxo de caixa, entrar em logística contábil, é uma barreira”, diz Rodolfo Canônico, especialista em políticas públicas para a família, fundador e diretor executivo da Family Talks. Ele destaca que a pesquisa foi respondida por pessoas interessadas no tema em algum nível e supõe que um levantamento amostral, com seleção de mais empresas, poderia trazer números mais altos.

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Diretora de RH da PepsiCo,Thaisa Thomaz também usufruiu da licença-maternidade estendida pelo Empresa Cidadã; um ano depois, foi promovida ao cargo atual. Foto: Taba Benedicto/Estadão

Camila Pires, mestre em antropologia e pesquisadora associada à 4Daddy, sugere caminhos para ampliar o conhecimento. “Deveria existir uma divulgação estruturada do governo, mas não temos isso. Então, a gente entende que, em segundo, as empresas têm papel fundamental nessa instrução da sociedade e de outras empresas. Um terceiro caminho é a pressão social: se a população está instruída, sabe que existe possibilidade de direitos e benefícios, esses colaboradores podem fazer maior pressão.”

Mesmo as organizações já engajadas em políticas pró-equidade de gênero (75% das empresas cidadãs), tema que antecede a discussão da licença, têm dificuldades de progredir. Elas aumentam os benefícios concedidos a mães e pais de forma mais estruturada, como acompanhamento médico, sala de amamentação e cursos de gestante para ambos, mas esse empenho não afeta a familiaridade com a licença parental.

“Isso está muito relacionado ao conhecimento de possibilidades e de potenciais resultados”, diz Camila. Ela comenta que esses movimentos estão trabalhando outros temas necessários ao avanço da licença parental, como ter mais mulheres em cargos de liderança e deixar de demiti-las após a licença-maternidade. “O ideal, pensando em como evoluir internamente e expandir, é começar a quantificar os benefícios (de ter a licença estendida).”

Só podem aderir ao Empresa Cidadã as organizações tributadas com base no lucro real, mas 55% dos entrevistados não sabem ou preferiram não responder sobre o regime tributário da companhia. “Quem trabalha na área financeira, que provavelmente teria esse conhecimento, não está envolvido nessa discussão. A baixa adesão, claramente, é a falta de fluxo de informação dentro das empresas”, reforça Canônico.

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Comunicação e inclusão

Na PepsiCo, o benefício é oferecido desde 2011 e a diretora de Recursos Humanos da companhia, Thaisa Thomaz, afirma que a adesão cresce gradualmente, fruto da comunicação interna sobre a licença estendida. Nos últimos dois anos, houve 95% de adesão à política. “A gente sempre reforça com os líderes, que são embaixadores do programa, e coloca em todos os canais as oportunidades possíveis para as pessoas se sentirem à vontade. Leva tempo para que comece a ser usado na sua potencialidade, mas aumenta a cada ano”, diz.

No ano passado, foram solicitadas 438 licenças ampliadas na Pepsico, sendo que 60% (263 pedidos) eram de licença-paternidade. A diretora conta que, com o tempo, as iniciativas ficaram mais alinhadas às demais estratégias de diversidade, equidade e inclusão da companhia e passaram a envolver mais os homens. “É um caminho de maturidade comum nas empresas. Começa com as mulheres e elas percebem que, se não trouxerem os homens, elas não vão fazer a mudança sozinhas.”

A exemplo do que mostra a pesquisa, a organização oferece outros recursos, como acompanhamento pré-natal, orientações para cuidados com o bebê, até 30 dias de licença-paternidade e sala de amamentação. Mães também podem reduzir a jornada de trabalho pela metade do tempo nos 30 primeiros dias após a licença-maternidade.

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Thaisa reforça que as licenças valem para todas as configurações familiares, com filhos biológicos ou adotivos. Embora alguns resultados não sejam mensuráveis ou venham no longo prazo, há indícios positivos. “A gente sabe que esse acolhimento faz com que as pessoas permaneçam mais tempo conectadas à companhia e aos valores.”

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Tendências e sinais de avanço

A pesquisa sobre parentalidade indica três tendências para o avanço das discussões: expansão do papel da mulher para além do lar e dos filhos, engajamento para promover igualdade de gênero nas empresas e inclusão dos homens no cuidado. As percepções foram observadas também entre os 1.153 brasileiros entrevistados pela Market Analysis.

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No primeiro quesito, 84% das empresas concordam que as mulheres têm receio de serem demitidas após a licença-maternidade e 73% da população afirma que elas têm menos oportunidades do que os homens na carreira. Por outro lado, cerca de metade dos respondentes nos dois públicos ainda concordam que a maternidade e o espaço doméstico são locais de atuação preferencialmente das mulheres atualmente.

Entre os profissionais, 59% dizem que a rejeição da pauta sobre igualdade de gênero não vem da empresa, mas do gestor, e 80% concordam que líderes bem treinados reverteriam o cenário. Para Camila, essa falta de engajamento se deve à ausência de pesquisas suficientes sobre os ganhos e o retorno financeiro relacionados à extensão das licenças. “Esses gestores não têm embasamento teórico e ficam só no discurso.”

Exemplo disso é que 89% das empresas discordam que homens não sabem cuidar de bebês, mas elas não possibilitam meios para que eles exerçam esse papel. Nas aderentes ao Empresa Cidadã, 17% oferecem retorno gradual ao trabalho para homens e 30% para mulheres; já o retorno presencial com flexibilidade de horários é oferecido por 31% para elas e por 14% para eles. “Mesmo que exista a intenção dos pais em cuidar, toda a estrutura social ainda não é feita para esse pai cuidar”, comenta a pesquisadora.

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