Novos modelos de negócios associados a uma quantidade cada vez maior de dados e inovações disruptivas no mercado estão transformando o tradicional setor da advocacia. Um mapeamento feito pela Escola de Direito de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas (FGV Direito SP) mostra as 27 novas profissões do setor - ou aquelas que ganharam uma nova roupagem em decorrência das mudanças no mercado.
Na lista de funções estão coordenador de proteção de dados, business intelligence, analista de dados jurídicos e legal designer, que dentro do ramo da inovação é responsável por “criar e remodelar serviços jurídicos por meio do uso de elementos de design de modo a facilitar a comunicação jurídica”. Nas funções voltadas à tecnologia, as atividades podem ser desempenhadas por profissionais com outras formações que não a jurídica.
Segundo a professora da FGV Direito SP, Olívia Pasqualeto, integrante do grupo de pesquisa, os conhecimentos da engenharia da computação, por exemplo, podem ajudar na organização de fluxos internos, no acompanhamento de processos judiciais e na sistematização de uma base de dados para facilitar consultas aos advogados.
Esse cenário integrativo é similar ao dos econofísicos, pessoas formadas em Física que encontraram nos setores financeiro e bancário uma carreira que pode pagar até R$ 52 mil.
Outra possibilidade seria a convergência de conhecimentos em um único profissional, como uma pessoa com sólida base jurídica que é especializada em estatística ou programação. Já pensando nesse profissional, o Insper oferece um curso de ciência de dados aplicada ao Direito.
No estudo da FGV, os pesquisadores do Centro de Ensino e Pesquisa em Inovação (CEPI) da escola se propuseram a buscar novidades em uma das áreas mais tradicionais do Brasil. “É justamente fazer uma reflexão, saber como e se o ensino jurídico tem atendido essas novas demandas do mercado”, diz Olívia.
A pesquisa baseou-se em buscas orientadas no LinkedIn, em sites jurídicos e em plataforma de literatura acadêmica por palavras-chave como “novas profissões jurídicas/no Direito”, “novas funções jurídicas/no Direito”, “futuro do Direito” e “futuro das profissões jurídicas”.
De escritório para empresa
Vindo do mercado financeiro, a missão de Marcelo Doubek no KLA Advogados era transformar o escritório em empresa. Ou seja, mais do que uma sociedade de advogados que peticionam, vão a audiências e resolvem casos, era preciso pensar na sustentabilidade do trabalho e do negócio no longo prazo.
Para isso, o diretor executivo agregou a expertise da gestão orientada por dados e criou duas áreas estratégicas: business development (BD), que coleta informações de origens diversas, inclusive de fora do negócio, e business intelligence (BI), baseada em dados internos para planejamento estratégico.
Ambas as áreas têm por fim ajudar os sócios e os advogados a tomarem melhores decisões para si, para a empresa e para os clientes. “O primeiro passo foi conseguir uma boa estrutura para capturar informações, implementar um sistema que desse todos os dados de que precisava dali a dois anos”, conta Doubek.
A base de dados criada no começo de 2020 gerou, após um ano, números confiáveis, insights e informações importantes para a transformação. “Começou a dar um norte para o escritório, não só de faturamento, mas de rentabilidade e produtividade.” Recentemente, um profissional de dados foi contratado para reforçar o núcleo de BI.
Todo esse esforço é integrado ao cerne do escritório. Doubek liderou a implementação de uma ferramenta de visualização de dados para facilitar a comunicação da área com os sócios e advogados. A partir dos números, é possível analisar se as horas disponíveis dos profissionais estão sendo bem aproveitadas e se o trabalho está de acordo com o perfil deles, por exemplo.
O diretor comenta que metade das mudanças é voltada à experiência do cliente. “Hoje, a gente entrega resultados que dizem claramente, com gráficos e imagens, qual é o status do negócio dele. Cortamos pela metade o tempo de reunião”, diz. As informações também embasaram o escritório para traçar um plano estratégico sólido de cinco anos com metas de menor prazo nesse período.
Habilidades comportamentais
O estudo da FGV mostra que habilidades de mediação e conciliação, bem como o marketing jurídico e o gestor de operações legais ganharam maior relevância. Já cargos tradicionais ganharam novas atribuições, como os de consultoria e compliance.
São posições que, segundo a pesquisa, demandam um perfil de planejamento estratégico orientado ao negócio e desenvolvimento de condutas preventivas. É diferente do consultor convencional, que tende a ser mais pontual e estritamente jurídico na atuação.
Nesse ponto, entram as habilidades comportamentais, demandadas pela criação de cargos de gestão nos escritórios, pela figura do empreendedor jurídico e do desenvolvedor de negócios. São funções que pressupõem relacionamento entre pessoas, escuta ativa e comunicação não violenta.
O sócio gestor do Pinheiro Neto Advogados, Fernando Meira, diz que o desenvolvimento de soft skills faz parte da evolução de carreira do profissional. “Capacidade de comunicação, assertividade, síntese, empatia, criar laços de confiança. É um negócio que depende de pessoas, e o uso de ferramentas (digitais) vai ser em benefício das pessoas”, afirma.
Áreas emergentes na advocacia
Confira o resultado do mapeamento da FGV, que aponta 27 funções importantes para o futuro da carreira em advocacia:
Gestão
C-Levels (cargos de chefia executiva)
Gestor(a) de Projetos
Coordenador(a) Jurídico
Gerente de conhecimento
Gestor(a) de risco
Legal Ops
Negócios
Desenvolvedor(a) de negócios
Empreendedor(a) Jurídico(a)
Marketing Jurídico
Legal copywriter
Inteligência de Dados e Analytics
Analista de dados jurídico
Arquiteto(a) jurídico(a)
Engenheiro(a) jurídico(a)
Regulatório e Relações Institucionais
Advocacia de relações institucionais/governamentais
Advocacy
Analista de políticas públicas
Compliance
Profissional de Compliance
Consultor(a) de e-discovery
Inovação
Gestor(a) de inovação
Legal Designer
Proteção de dados
Coordenador(a) de Proteção de Dados
Consultivo
Assessor(a) jurídico
Advertising Lawyer
Oficial de transferência de tecnologia
Negociação
Mediador(a)/Conciliador(a)
Contencioso estratégico
Disputes Legal Counsel
Outsourcing Jurídico
Secondment jurídico
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