Ele entrevistou mais de mil jovens e revela como a geração Z se comporta em entrevistas de emprego

Igor Chohfi diz que a geração Z é ágil com tecnologia, mas tem dificuldade em seguir regras no trabalho; ele já se deparou com candidatos sem camisa e dispersos em entrevistas

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Foto do author Jayanne Rodrigues
Foto: Arquivo pessoal
Entrevista comIgor Chohfi Co-fundador da Rede Pavim, empresa especializada em recrutamento e seleção da geração Z

A geração Z é frequentemente associada a comportamentos inadequados no ambiente de trabalho, como falta de comprometimento, dificuldade em se comunicar e em seguir regras corporativas. No entanto, para Igor Chohfi, cofundador da Rede Pavim, empresa especializada no recrutamento de jovens dessa geração, alguns exemplos são exagerados e não representam a maioria dos jovens brasileiros. Embora, segundo o headhunter, exista um padrão recorrente durante os processos seletivos: a falta de preparo para entrevistas.

“Já vi jovens participando de entrevistas sem camisa. Não é algo comum, considerando o número de entrevistas que fiz, mas já aconteceu. Em algumas situações, o candidato começa a andar pela casa enquanto conversa, como se estivesse falando com um amigo”, revela.

Apesar dos comportamentos que podem entrar em conflito com a cultura de algumas empresas, Igor destaca que a geração Z é, em geral, proativa, tem um grande interesse por inovação e é habilidosa com tecnologia. Ele trabalha com jovens em diversos níveis, desde aprendizes e estagiários até analistas júnior, pleno e sênior, com idades que variam de 16 a 30 anos.

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Ao Estadão, o headhunter compartilha experiências que presenciou em entrevistas de emprego com jovens da geração Z e oferece dicas sobre como as lideranças podem lidar com profissionais de diferentes gerações.

Confira trechos da entrevista:

Quais são as principais características que você percebe na geração Z em termos de comportamento no trabalho?

Quando pensamos na geração Z, temos diversos recortes, como em qualquer outra geração. Existem pessoas que são extremamente competentes, fora da curva, mas também há aquelas que estão perdidas e fazem o mínimo no ambiente corporativo. Além disso, há quem trabalhe por pura necessidade, para pagar contas e se sustentar. Essas diferenças são marcantes.

De forma geral, um dos traços mais evidentes da geração Z é a ansiedade, que influencia muito a forma de trabalhar. A ansiedade se manifesta, por exemplo, na busca por promoções rápidas e na tendência polywork (gerenciar vários projetos/trabalhos ao mesmo tempo). É uma geração acostumada à velocidade e facilidade de acesso: pedem comida no iFood e recebem em 30 minutos, compram na Amazon e a entrega chega no mesmo dia ou no dia seguinte.

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Quando os jovens chegam no mercado de trabalho, eles quebram a cara. No ambiente corporativo promoções levam tempo. Essa ansiedade acaba se transformando em comportamentos tanto positivos quanto negativos.

Igor Chohfi, co-fundador da Rede Pavim, empresa especializada em recrutamento e seleção da geração Z

Entre os pontos positivos, tem a busca por autonomia e proatividade, interesse pela inovação e habilidade com tecnologia.

Por outro lado, temos a falta de comprometimento, como atrasos ou dificuldade em seguir regras, desafio em compreender o senso comum organizacional, muitas vezes por falta de orientação, além de condutas inadequadas no trabalho, o jovem leva o comportamento da faculdade.

Quais são os comportamentos entre os jovens dessa geração mais desafiadores no ambiente corporativo?

Diria que o principal é a dificuldade de se comunicar. Muitos não sabem se expressar de forma adequada. Eles estão acostumados a trocar mensagens instantâneas nas redes sociais. Quando precisam se comunicar presencialmente, ou até em reuniões online, não conseguem se sobressair.

Claro, há jovens que conseguem se comunicar muito bem, mas, no geral, essa é uma habilidade que precisa ser desenvolvida.

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Já presenciei situações em que jovens realizavam um ótimo trabalho, mas não comunicavam seus avanços aos líderes. O líder, sem retorno, achava que o trabalho não estava sendo feito e precisava perguntar constantemente o que estava acontecendo. O projeto ficava parado porque o jovem não sinalizava que tinha concluído ou que era hora de outra pessoa assumir.

Também noto que muitos jovens chegam ao mercado de trabalho com uma certa acomodação, influenciada pelo ambiente acadêmico, onde há maior colaboração entre colegas e um ritmo diferente.

Eles precisam entender que no trabalho o cenário muda: existe mais competição e maior necessidade de autonomia. Nem sempre os jovens conseguem se adaptar rapidamente. Por isso, os líderes precisam orientar, “pegar pela mão” e direcionar nesse primeiro momento.

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Pode dar mais detalhes de como as lideranças podem ajudar?

O primeiro ponto é entender a realidade do jovem para ter uma conversa mais assertiva e mostrar que está ali para apoiá-lo. Uma questão importante é a parte financeira.

O líder precisa entender que o cenário atual é muito diferente de 30 anos atrás. Antigamente, você contratava um funcionário, pagava o salário no quinto dia útil e esperava que ele entregasse o combinado. Não é mais assim.

Naquela época, um jovem conseguia planejar sair da casa dos pais ou até dar entrada em um carro popular. Hoje, isso é quase impossível. Por exemplo, um analista júnior em uma grande empresa em São Paulo, mesmo ganhando R$ 5 mil - estou chutando alto -, dificilmente consegue sair de casa ou economizar para comprar um carro.

O líder tem que compreender essas nuances. Mais do que oferecer um salário, é importante contextualizar o trabalho para o jovem: mostrar como ele se encaixa no propósito da empresa. Isso é algo que a geração Z valoriza muito.

Igor Chohfi

Cargos de entrada são majoritariamente operacionais. Quem está começando geralmente lida com planilhas, relatórios e ferramentas básicas. Mas o que custa dedicar 15 minutos do seu dia para explicar o impacto dessas atividades?

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  • Por exemplo, dizer: “Fulano, sei que você passa boa parte do dia lidando com tarefas operacionais, mas quero que saiba que essas planilhas são usadas para apresentações importantes. Elas servem de base para os executivos da área x ou para demonstrar os resultados aos clientes. O que você faz tem um papel crucial.”

Isso ajuda o jovem a entender que, embora esteja em um cargo inicial, o trabalho dele é significativo. Ele deixa de pensar: “não faço nada importante” e começa a valorizar o próprio trabalho.

É entender essas diferenças e fazer acordos. Se o jovem for aquele que sempre chega atrasado ou perde reuniões, explique os motivos para um pedido de mudança de comportamento e firme um acordo. Essa prática de feedback é algo que a nova geração busca muito. Eles querem entender se estão no caminho certo e o que precisam melhorar.

Se o jovem não recebe feedback, pode acreditar que está indo muito bem apenas porque ninguém apontou erros.

Igor Chohfi

Levando em consideração alguns comportamentos que são atribuídos à geração Z, como a suposta ida a entrevistas com os pais. O que realmente acontece durante o recrutamento? Como eles costumam se comportar?

Levar pais para entrevistas de emprego é algo que nunca presenciei, e olha que já entrevistei mais de mil jovens. Vou trazer alguns exemplos do que aconteceu comigo, mas não posso afirmar com certeza que isso ocorre com frequência.

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Já presenciei jovens participando de entrevistas sem camisa. Não é algo comum considerando o número de entrevistas que já fiz, mas aconteceu. Em algumas situações, o candidato começa a andar pela casa enquanto conversa, às vezes segurando o celular como se estivesse conversando com um amigo, sem se preocupar em olhar para a câmera.

Também vi jovens chegando atrasados uns 15 minutos sem justificar ou avisar previamente. Houve casos de candidatos que simplesmente desligaram no meio da entrevista, sem explicação, porque aparentemente não queriam continuar.

Esses exemplos são extremos e não representam a maioria, mas há um padrão mais recorrente: a falta de preparo do jovem para entrevistas. Muitos não sabem como se portar, não entendem a importância de estar bem enquadrados na câmera ou de olhar para a pessoa com quem estão conversando.

Igor Chohfi

Outro ponto frequente é o desconhecimento básico sobre como apresentar sua trajetória. Muitos não sabem que precisam começar se apresentando. Quando tentam contar sua experiência, não conseguem organizar as informações.

Essa confusão e falta de conhecimento são comuns, mas não são culpa exclusiva dos jovens. Isso reflete uma lacuna na formação acadêmica e na orientação sobre o mercado de trabalho.

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O headhunter já entrevistou mais de mil jovens.  Foto: Siphosethu Fanti/People Images/Adobe Stock

Como as empresas brasileiras podem ajustar seus processos de recrutamento e seleção para atrair a geração Z?

Acredito em dois pontos principais. O primeiro é utilizar a ansiedade do jovem a favor do processo. Se o jovem é ansioso, devemos fazer um processo extremamente rápido. Faça uma entrevista de 25 minutos. Antes disso, um formulário rápido em que o jovem vai levar uns 25 minutos para preencher.

Não precisamos de testes extensos e cheios de fases. O ideal é manter o processo enxuto, com no máximo três etapas: um formulário inicial para análise curricular, uma primeira conversa de 25 minutos e uma última de 30 minutos.

O segundo ponto é educar. Precisamos dar um passo atrás e lembrar que não podemos esperar que o jovem saiba de tudo. Por exemplo, criar uma cartilha pode ser uma solução prática. O RH investe 30 minutos para elaborar um material que pode ser usado com milhares de candidatos anualmente.

Essa cartilha pode incluir orientações como o que a empresa espera, como o jovem pode se preparar para a entrevista, se apresentar e responder perguntas. Essas “regrinhas básicas” ajudam o jovem a mostrar seu potencial e também facilitam o trabalho do RH.

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Quais são os aspectos atribuídos à geração Z no trabalho que estão desconectados com a realidade?

Acho que um deles é a falta de comprometimento, que reforça estereótipos. Na verdade, a maioria dos jovens é extremamente competente, disposta e têm sede de aprendizado.

Nos contatos que tenho e nos treinamentos que realizamos com jovens dentro das empresas, percebo que são muito engajados, interessados em participar e em trazer discussões. Muitas vezes, eles se mostram mais participativos do que os líderes. Esse é um aspecto positivo que observo e que contraria a ideia de que os jovens não querem trabalhar.

Quando há falta de engajamento, pode ser reflexo da ausência de uma liderança que assuma sua responsabilidade. Se o jovem não está entregando resultados ou não entende seu papel, talvez falte ao líder dar um passo atrás, sentar com ele, contextualizar a situação e fornecer um direcionamento.

Igor Chohfi

É comum esperarmos que as pessoas cheguem prontas para executar, mas elas precisam de orientação, entender onde estão e se sentir seguras no ambiente para entregar seu melhor. Isso é ainda mais importante com os jovens, que muitas vezes lidam com níveis mais altos de ansiedade.

Um dos traços mais evidentes da geração Z é a ansiedade, avalia o recrutador.  Foto: RawPixel/Adobe Stock

Na sua experiência, quais setores ou tipos de empresas têm mais sucesso em atrair a geração Z no Brasil?

As startups. Com certeza, essas empresas vêm sendo atrativas para os jovens por causa da flexibilidade. O jovem preza por esse aspecto. Ele quer trabalhar de casa, nem que seja alguns dias na semana.

Isso faz sentido porque muitos jovens estão desempenhando atividades operacionais. É muito mais fácil mexer em uma planilha ou relatório em casa, com tranquilidade, do que no escritório, com interrupções. Essa busca por flexibilização não se limita apenas ao home office ou ao modelo híbrido.

  • Por exemplo, já liderei um jovem que precisava começar a trabalhar às 10 horas da manhã porque tinha conseguido um personal excelente, o único horário disponível para treinar era das 8h30 às 9h30. Para mim, não fazia diferença ele começar mais tarde, desde que cumprisse suas oito horas diárias. Porém, há líderes que não aceitam ajustes como esse, mesmo que não interfiram na produtividade.

O importante é entender essas necessidades e tentar atendê-las dentro da cultura da empresa. Startups se destacam nesse aspecto, pois têm maior flexibilidade para ajustar escopos de trabalho.

Por outro lado, muitos jovens buscam multinacionais pela estabilidade e pelas oportunidades de aprendizado. Nessas organizações, eles encontram uma espécie de “universidade corporativa”, com acesso a profissionais, mentores e desenvolvimento de carreira. Geralmente, são jovens mais maduros, com objetivos bem definidos e maior consciência sobre o impacto da carreira no longo prazo.

Pensando na educação continuada, quais cursos os jovens mais procuram, principalmente ali no início da carreira? Por exemplo, o MBA é uma escolha frequente?

Essa é uma geração em que percebo uma grande diferença na forma de aprendizado. É uma geração que aprende multimodal, de diferentes formas. Cada vez mais, vejo jovens que não estão tão focados em fazer um MBA ou uma pós-graduação. Eles acabam optando por cursos online oferecidos por empresas que acabaram de lançar algo inovador e que tratam de assuntos bastante específicos.

Jovens buscam esse aprendizado mais direcionado, que às vezes não está disponível em uma universidade. Mas acredito que eles continuam abertos a fazer um MBA ou estudar fora, pois ainda é visto como um sonho para muitos.

Hoje, os jovens estão explorando todas as possibilidades para se desenvolver: desde tutoriais no YouTube até cursos especializados.

Qual conselho você daria para uma liderança que tem pessoas da geração Z em sua equipe, mas que ainda tem dificuldades em identificar o potencial desses profissionais?

Para começar, o líder precisa tirar um tempo para contextualizar. É importante que a liderança se sente com os jovens que integram a sua equipe e entenda o que cada um está buscando. Como líder, você precisa saber como ajudar e enxergar o jovem como uma pessoa, com suas diferenças. Foi por isso que ele foi contratado para aquela posição. Esse seria o primeiro ponto: a contextualização.

O segundo ponto é o líder compartilhar sua própria trajetória, inspirar por meio de histórias. Isso funciona muito com os jovens. Conte como você chegou a esse cargo e como foi sua trajetória.

Quando um jovem entra em uma empresa, muitas vezes olha para os cargos e pensa que as pessoas chegaram lá de paraquedas, que nasceram líderes ou com 50 anos de experiência. É importante mostrar para o jovem que, sim, o começo da carreira não é fácil.

Igor Chohfi

Por fim, é fundamental estar sempre disposto a mostrar para o jovem da geração Z que você acredita no potencial dele. Esse é o combo que funciona: entender a realidade do jovem, trazer a contextualização para ele e contar sua própria história. Assim, o jovem terá as ferramentas para entender o ambiente em que está, o papel que desempenha e como pode crescer profissionalmente.

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