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Jovens são mais adaptáveis às mudanças, mas acham que sabem de tudo, diz líder da geração Z

Diretora de Novos Negócios e Planejamento Estratégico da farmacêutica Cimed, Juliana Marques, de 25 anos, prefere o modelo de trabalho presencial e aposta em uma gestão mais colaborativa

Foto do author Jayanne Rodrigues
Foto: Felipe Rau; Artes/Estadão
Entrevista comJuliana MarquesDiretora de novos negócios e planejamento estratégico da Cimed

Dos muitos desafios que confrontam as lideranças no dia a dia, garantir uma equipe de alta performance talvez seja um dos mais cruciais. A jovem executiva Juliana Marques, de 25 anos, encontrou uma solução prática para o problema: priorizar as demandas. Embora a resposta pareça simples, só aprendeu a duras penas. Antes gerenciava vários projetos simultaneamente, não conseguia executar, e a equipe terminava sem foco.

Uma falha comum entre veteranos e iniciantes no mundo dos negócios. Representante da gen Z, a líder aproveita os atributos da sua geração, como rápida adaptabilidade às mudanças, para resolver esses e outros problemas.

No entanto, foge de algumas características atribuídas aos jovens. Por exemplo, Juliana prefere o trabalho presencial ao home office. Além disso, embora o grupo valorize o equilíbrio entre vida pessoal e profissional, ela acredita que quem diz alcançar isso “tem algo errado”.

À frente da diretoria de Novos Negócios e Planejamento Estratégico do grupo farmacêutico Cimed, Juliana Marques faz parte da sucessão familiar da empresa. Filha de Karla Felmanas, vice-presidente da companhia, e sobrinha do CEO, João Adibe, ela poderia rebater os comentários quando chamada de “nepobaby” - termo que ganhou ascensão na internet e remete ao nepotismo (favorecimento de parentes no trabalho). Mas reconhece seus privilégios e, justamente por isso, diz só contratar pessoas que sejam mais competentes que ela.

“Tenho um lugar de segurança, então não tenho a questão de algumas empresas corporativas como ‘não vou contratar essa pessoa mais inteligente porque ela vai roubar meu cargo’”, conta ao Estadão. Juliana Marques é a segunda entrevistada da série Líderes Gen Z.

Confira trechos da entrevista:

O fato de ser uma pessoa da geração Z influencia o seu estilo de liderança?

Como vivemos em um mundo em que tudo é muito rápido, nós, da geração Z, somos capazes de mudar de opinião com facilidade. Não temos verdades absolutas, além de ter uma adaptabilidade rápida aos novos mercados e novas tecnologias. Também acredito que a geração Z tem uma curva de aprendizagem um pouco mais rápida.

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Aos 25 anos, Juliana Marques ocupa cargo de liderança na Cimed.  Foto: Felipe Rau/Estadão

Somos mais convictos e brigamos mais pelas coisas que defendemos. Isso é bom porque questionamos as ‘verdades’. Acabamos tendo mais facilidade de mudar as verdades absolutas do mercado.

Juliana Marques, diretora de Novos Negócios e Planejamento Estratégico da Cimed

O ponto negativo é que a gente acha que sabe tudo. Sei que não domino tudo. Acho que a gen Z tem que aprender com as gerações mais velhas que não sabe de tudo. Mesmo tendo acesso a muitas informações, não tenho tanta experiência. Ainda vou demorar para ter uma vivência de trabalho.

Outra coisa, os mais jovens não vivem tanto o presente. Às vezes, entro em reuniões com pessoas mais novas, e a maioria está no computador respondendo e-mails. Perdemos muito nas trocas e na gestão do dia a dia.

Existe uma percepção de que a geração Z tem preguiça de trabalhar, dificuldade de se relacionar no trabalho e rompe hierarquias. Você considera essas avaliações justas?

Na minha visão, as gerações anteriores viviam para trabalhar. Por exemplo, a relação que meu pai tem com meu avô é muito diferente da relação que tenho com meu pai. Antes existia um objetivo maior de trabalhar, construir uma família etc.

A nossa geração entendeu que, conforme envelhecemos, vamos perdendo a qualidade de saúde e, se não nos cuidarmos, perdemos a possibilidade de viver bem.

A gen Z trabalha para viver, não vive para trabalhar.

Juliana Marques

Buscar ter uma qualidade de vida maior é uma mudança do mundo inteiro. Não tem essa de “ah, vou começar a viver depois que me aposentar”. Tenho que viver todos os dias porque nem sei se vai ter o dia de amanhã. É uma percepção de tempo diferente.

O Estadão pediu para Juliana Marques responder a algumas perguntas usando apenas emojis. Veja como ela reagiu a cada uma delas no quadro abaixo:

Enquanto líder, de alguma forma, você consegue moldar o local de trabalho da sua equipe. Qual é o diferencial da sua gestão?

Tenho muita sorte de trabalhar em uma empresa familiar. A minha mãe (Karla Marques) e o meu tio (João Adibe) são pessoas de mentes abertas, sempre escutaram nossas opiniões desde criança. Perguntavam o que eu e os meus primos achavam de algo, e se consideravam que nós estávamos certos, mudavam de opinião. Isso me deu muita autonomia na empresa.

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O que agregamos dentro da gestão deles é uma cultura mais aberta. Tentamos pregar essa liberdade com todos os colaboradores.

Às vezes, um funcionário não está trabalhando em um determinado produto, mas tem uma visão superválida como consumidor, que agrega ao produto. Nós o escutamos.

Ter uma cultura cada vez menos hierárquica e com mais abertura foi algo que buscamos na Cimed. Meu irmão fez a arquitetura do escritório, pensamos em como refletir a ideia de a empresa ter a mente aberta.

Hoje quem entra vê que todos trabalham juntos. Antes tinha uma sala para cada setor, e eu nem sabia quem estava do outro lado.

Como você faz para incorporar essa cultura de autonomia e liberdade com as pessoas com quem trabalha?

Acredito que preciso contratar pessoas que vão fazer o trabalho melhor do que eu. Óbvio que tenho um lugar de segurança (por ser uma empresa familiar), então não tenho a questão de algumas empresas corporativas, como “não vou contratar essa pessoa mais inteligente porque ela vai roubar meu cargo”.

Já contrato com a premissa de confiar que a pessoa vai fazer um trabalho mais decente que o meu.

Juliana Marques

Juliana Marques, diretora de Novos Negócios e Planejamento Eestratégico da Cimed. Foto: Felipe Rau/Estadão

Gosto de ter uma reunião semanal com o meu time (no começo e no final da semana) para ver o que está acontecendo. Também acompanho as entregas, mas sempre confiando, vejo os resultados e vamos ajustando as rotas.

Também temos uma cultura de feedback transparente. Se alguém falar algo de que não gostei, vou dizer na reunião com as outras pessoas do time: “Olha, não gostei da sua atitude, não concordo com x coisa, mas se você quiser replicar é um ambiente para discutir se está certo ou errado.”

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Não fico esperando para conversar depois ou esperar três meses para elaborar um feedback estruturado.

Pensando nessa questão da cultura do feedback, como é no dia a dia?

Gosto de dois tipos de feedback: comportamental ou de alguma entrega.

Costumo mandar algumas perguntas antes das reuniões para o time pensar. Quando pego uma planilha que não está boa, sento com a pessoa, aponto o que faltou e onde precisa ter informação um pouco mais clara. Esses são os feedbacks mais diretos do dia a dia. Também tenho o feedback trimestral, que é mais estruturado.

Gosto de verificar se está tudo ok com a saúde mental do funcionário, se está fazendo exercícios físicos e como está em casa.

Sempre pergunto: “Como está sua vida? A Cimed está fazendo sentido? O que você se vê fazendo daqui a três meses? Como vamos desenvolver seu plano de carreira daqui a três meses? O que estou fazendo que não está legal, como posso facilitar mais ainda o seu trabalho?”

Considerando seus cinco anos na Cimed, qual erro você carrega como aprendizado?

Vários. Bem no começo queria abraçar o mundo, começava um monte de coisa, mas, quando chegava à fase de execução, não continuava direito. Acabava fazendo isso com o time, também. Então, o pessoal ficava perdido. Toda hora era uma coisa nova, e a gente não conseguia focar no que estávamos fazendo.

Não saber priorizar muito bem as coisas e sair trabalhando sem saber onde você quer chegar foram erros que cometi no começo.

Juliana Marques

Demorei para aprender, mas hoje adquiri uma capacidade um pouco melhor de priorizar meu tempo e as atividades.

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Já teve que lidar com o ego?

Mais do que gostaria. A nossa antiga cultura organizacional aceitava mais as coisas em termos de gestão. Por exemplo, o líder era um pentelho, tinha ego, era chato, mas entregava. Então, a gente achava que não precisava arrumar uma “confusão”.

De um tempo para cá, percebemos que isso criava um ambiente tóxico. Há cinco anos, mudamos o estilo de gestão e não aceitamos mais o ego no ambiente de trabalho. Não tem essa de “eu que fiz isso e aquilo”. Não aceitamos mais. Sabemos que ninguém faz nada sozinho.

Descubra abaixo no vídeo de lançamento da série qual é, segundo Juliana, a maior qualidade da liderança da geração Z.

No seu dia a dia, quais são as estratégias para garantir bons resultados e, ao mesmo tempo, manter as pessoas motivadas e saudáveis?

Ter uma cultura de alta performance tem muito a ver com saber priorizar as atividades. É saber delegar bem, saber priorizar e planejar para conseguir executar as demandas. Vejo muita empresa dizendo que vai “faturar tanto”, mas não tangibiliza para a realidade. Puxa muito a corda, mas as pessoas não têm capacidade de fazer aquilo.

Claro, é preciso garantir alta performance, mas tem que ser dentro da realidade do time.

Por isso, é importante escutar o time para entender o que está dando certo e o que está dando errado. Meu papel como líder é facilitar a vida da minha equipe. Não posso criar bloqueios.

Reconhecer as pessoas e celebrar com o time também muda o jogo. Quando você está jogando e ganha o campeonato, tem que ter um tempo para comemorar as vitórias.

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O que faz para equilibrar vida pessoal e profissional?

É uma loucura. Quem fala que tem equilíbrio tem alguma coisa de errado. A rotina de trabalho é intensa, ainda tem a família, o aspecto social e a saúde mental. Mais uma vez, tem que saber priorizar as coisas.

Na minha vida, a saúde mental é prioridade. Minha segunda prioridade é a minha família e os meus amigos. O trabalho entra como terceira prioridade.

Uma diferença da geração Z é que a gente não acredita que trabalhar mais horas é um reflexo de um bom trabalho. Tem que trabalhar de uma forma inteligente.

Juliana Marques

Algumas vezes consigo, outras, não. O objetivo é nunca entrar no piloto automático. Acho que isso faz diferença.

Durante um processo seletivo, o que pode te levar a desistir de uma contratação?

Não gosto de pessoas individualistas. Daquela que diz: “eu fiz, eu montei aquilo, eu fiz uma empresa chegar lá”. Hoje em dia ninguém faz nada sozinho, não existe isso.

Isso é uma red flag (bandeira vermelha) gigantesca. Se fizer isso, a entrevista acaba em 20 minutos.

Como manter a sinergia de diferentes gerações no trabalho?

Aqui temos uma cultura muito jovem, então é natural atrair profissionais mais jovens. É até um gap geracional nosso, estamos trabalhando com o RH para equilibrar um pouco mais as gerações.

Somos feitos de bagagens. O que tento fazer com o meu time é entender de onde cada pessoa veio, a experiência de vida que faz com que ela chegue naquele sentimento, naquela resposta ou situação.

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Com a minha mãe, tenho discussões geracionais, é normal. Mas sempre foram racionais.

Assista a um vídeo das duas, publicado por Juliana em sua conta no TikTok:

Vou dar um exemplo: decidi morar com meu namorado antes de casar. Para minha mãe, aquilo foi impensável.

Disse para ela: “mãe, se eu me casar e depois de seis meses descobrir que não gosto de dividir uma casa com a pessoa, em vez de ser uma solteira, vou ser uma divorciada.” Ela concordou. Então, sempre tento entender de onde o questionamento vem.

Karla Marques e Juliana Marques. Foto: Marina Beginsky/Divulgação Cimed

Notei que a maioria dos funcionários vestem uma blusa com o logotipo da Cimed. Vocês estimulam a cultura de vestir - literalmente - a camisa da empresa?

Literalmente. Algumas pessoas perguntam: “Eles são obrigados a vir de amarelo?” Não!

Você não sabe o quão é fácil acordar de manhã, ver o armário cheio de roupa e decidir colocar a blusa polo amarela e já está arrumada para trabalhar.

Virou um ambiente em que as pessoas querem usar a cor amarela. Fizemos um trabalho de branding tão legal que ficou natural e fácil para a galera. Falei para o nosso diretor de Marketing que ele nunca mais comprou uma camisa, só usa a blusa da Cimed. Resolveu o sonho da vida dele.

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Na sua visão, qual é a liderança do futuro?

É uma liderança em que as pessoas conseguem ter bastante autonomia para trabalhar. Não é aquele líder que fica microgerenciando as tarefas. É mais empática e, ao mesmo tempo, sabe cobrar as pessoas com uma cultura de alta performance.

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