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Trabalhar na Irlanda: brasileiros elogiam oportunidades e segurança, mas aluguel é caro

Mercado de trabalho irlandês atrai brasileiros de diversos setores, principalmente da área de TI, engenharia de software, civil, marketing e vendas

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Foto do author Jayanne Rodrigues
Atualização:

O número de brasileiros que vivem na Irlanda aumentou mais de cinco vezes nos últimos anos. Entre 2011 e 2022, a comunidade de residentes legais saltou de 13,6 mil para 70 mil, segundo dados da Embaixada do Brasil, em Dublin. Afinal, o que compensa o inverno rígido e duradouro, o alto custo de vida e a moradia cara e disputada? Segundo brasileiros que moram lá, os pontos positivos são ofertas de oportunidades profissionais, sensação de segurança e qualidade de vida.

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Com o quinto maior salário mínimo da Europa, cada hora trabalhada na Irlanda vale € 11,30 (R$ 61). O país fica atrás apenas de Luxemburgo (veja dicas para trabalhar no país), Alemanha, Holanda e Bélgica.

De acordo com o Living Wage, grupo técnico irlandês que calcula o valor aproximado para se ter uma vida digna, a renda mínima ideal seria de € 14,80 por hora. O documento leva em consideração os setores que sofreram mais aumento na Irlanda em 2023, como energia (23%), alimentação (21%), cuidados pessoais (9,2%) e habitação (7%).

Apesar do custo de vida alto, o mercado de trabalho irlandês atrai brasileiros de diversos setores, principalmente de tecnologia da informação, design, engenharia, além da área de saúde, negócios e marketing.

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Indicadores econômicos e culturais entram no leque de atributos na hora de estrangeiros escolherem a Irlanda como destino, analisa o cônsul-geral da Irlanda, Eoin Bennis. “Somos o único país que fala inglês (oficialmente) na União Europeia (o Reino Unido não faz mais parte), sediamos as oito maiores multinacionais de serviços financeiros do mundo, e os brasileiros que vão para Irlanda chegam formados e com muita experiência.”

Valorização da qualidade de vida

Os incentivos fiscais funcionam como uma ímã para a instalação de filiais de grandes empresas. Foi exatamente por meio de uma oportunidade na multinacional IBM, que a analista de sistemas Jaqueline Barreto, 38, migrou para a Irlanda em 2011.

Mas antes da contratação a jornada foi árdua. Ela se candidatou a mais de 200 vagas no intervalo de seis meses. Da maioria das seleções de emprego, sequer teve retorno. Foi quando decidiu viajar para a Irlanda em busca de testar se o país realmente teria possibilidade de trabalho.

“Comecei a me candidatar às vagas dizendo: vou estar na Irlanda x dias, se quiser conversar comigo. Depois comprei um chip irlandês, adicionei meu telefone e tive respostas. No período de um mês, fiz três entrevistas e passei em duas”, relembra.

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Após concorrer a mais de 200 vagas, a brasileira Jaqueline Barreto, 38, conseguiu uma oportunidade de trabalho na Irlanda em uma multinacional. Foto: Arquivo pessoal

A profissional retornou ao Brasil somente para resolver questões burocráticas relacionadas ao visto. Para morar e trabalhar legalmente, ela usou o visto Critical Skills Employment Permit, destinado a trabalhadores qualificados em profissões com escassez de mão-de-obra na Irlanda.

No momento em que desembarcou definitivamente, ainda em 2011, sofreu o primeiro baque: o idioma. Ela tinha inglês fluente, mas no dia a dia era diferente.

“Conseguia me comunicar e entender o que falavam comigo, mas, quando chegava a hora do almoço e do café, só faltava me esconder debaixo da mesa para não me acharem. Nessas conversas informais eles usavam muitas gírias, que são bem específicas da Irlanda, não entendia nada”, conta Barreto.

Embora tenha ficado com vergonha de ser excluída das conversas, foi acolhida pelos colegas de trabalho e, aos poucos, conseguiu pegar o ritmo da língua. Superado esse trauma, ela cresceu profissionalmente e atuou por 10 anos na multinacional.

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Durante a pandemia, Barreto foi convidada para o cargo de engenheira de software no Yahoo!. Ela preferiu não revelar o salário. O modelo em vigência no trabalho é o híbrido, mas ela só vai ao escritório em situações especificas.

Após uma década na Irlanda, somando experiências profissionais, casamento com brasileiro e o nascimento de dois filhos no país europeu, a profissional afirma ter um estilo de vida desacelerado.

“Aqui as pessoas trabalham para viver, elas não vivem para trabalhar. Tem o status, tem aqueles que desejam escalar na carreira, mas não é o que dita a vida das pessoas. Também é muito incomum ver gente trabalhando fora do horário de trabalho. Fiz isso quando comecei aqui porque era o que conhecia do mundo corporativo”, afirma.

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A jornada semanal da Irlanda varia entre 39 e 48 horas, que é o limite legal. No Brasil, a CLT estabelece um teto de 44 horas semanais de trabalho. No entanto, estrangeiros que vão para o país europeu com visto de estudante só podem trabalhar 20 horas por semana.

Do encanto à frustração

Em 2019, a engenheira de produção Alessandra Batalha, 33, investiu sua reserva financeira, em torno de R$ 14 mil, para realizar o sonho do intercâmbio.

Irlanda foi o país escolhido graças à facilidade de trabalhar enquanto estudava parte do dia. Durante o período, ela conseguiu bicos como camareira em hotel cinco estrelas e barista em um café.

O que era para ser uma temporada de oito meses virou quatro anos. Ela se encantou pela rotina de Dublin e engatou um relacionamento.

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Junto com isso, Batalha não queria voltar a morar no Brasil. “Estava muito frustrada, não consegui emprego na minha área de engenharia, e trabalhava como professora de inglês e espanhol”, conta.

Alessandra Batalha, 33, foi para a Irlanda com o objetivo de realizar um intercâmbio de 8 meses, mas se encantou por Dublin e decidiu ficar. Foto: Arquivo pessoal

Após a decisão de ficar na Irlanda, foi indicada para outro trabalho: professora de matemática para crianças de quatro anos. Mas logo precisou procurar outro emprego porque o salário era baixo, cerca de € 60 (R$ 326) por semana.

Entre idas e vindas na busca por um emprego na área de formação - ela contabiliza o envio de 600 currículos - e com o visto de estudante prestes a expirar, Batalha optou por fazer uma transição de carreira e ingressar no curso de ciências da computação na faculdade Dublin Business School.

Agora, quatro anos depois da sua chegada, os motivos que a impulsionaram a morar no país europeu não são suficientes para ela permanecer. Conforme os planos da engenheira, após o término do curso, ela e o namorado italiano pretendem se mudar para a Itália.

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“O clima frio da Irlanda é difícil de lidar. O supermercado está mais caro. A energia, o gás e o aluguel também aumentaram”, diz.

Como boa parte das principais potências econômicas da região, a Irlanda também tem lidado com a histórica escalada no custo de vida, diante dos efeitos da pandemia e da guerra na Ucrânia, que restringiu os fluxos de gás natural no continente europeu. O resultado é uma inflação que atingiu o maior nível em quase quatro décadas e forçou o Banco Central Europeu (BCE) a conduzir um agressivo processo de aumento de juros.

Nos últimos meses, o índice de preços ao consumidor arrefeceu, mas continua em patamares elevados, com reflexos palpáveis para a população.

O casal paga € 2000 por um apartamento com um quarto. “O meu aquecedor não funciona, tenho problema de mofo. O banheiro e a cozinha também são super-antigos.”

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Hoje, a Irlanda enfrenta um déficit habitacional grave. Uma das causas é o crescimento populacional desenfreado, que empurra ainda mais a alta de aluguéis e a escassez de casas e apartamentos.

Apesar da frustração, Batalha não desanima quem deseja fazer o mesmo que ela fez há quatro anos. Planejamento, pesquisa, idioma na ponta da língua e reserva financeira são os conselhos da brasileira para profissionais que almejam o país europeu.

“Vim bem planejada, mas não achei que fosse tão difícil conseguir um emprego na engenharia. Gostaria que as pessoas tivessem me contado a real, não são só flores. Você precisa ter certas qualificações”, desabafa ao mencionar que não tinha conhecimento que muitas empresas exigiam pelo menos três anos de experiência na área, o que não ela não teve antes no Brasil.

‘Meus filhos são mais livres’

O problema de moradia é confirmado por outro brasileiro: “É muito caro alugar uma casa. Depois do Brexit (saída do Reino Unido da União Europeia) isso gerou uma tensão maior porque muita gente foi da Inglaterra para Irlanda. Então, essa é uma situação um pouco injusta para quem está tentando começar uma vida”, pondera o engenheiro naval Felipe Campos, 43, que vive na Irlanda há dois anos.

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Ele se mudou para o destino europeu após receber uma promoção para ocupar a cadeira de diretor de operações na multinacional de helicópteros da aviação civil em que trabalha desde 2016.

Essa movimentação para o mercado internacional era algo previsto por Campos. “Desde que as crianças nasceram, elas iam para a escola bilíngue porque sabíamos que podia ter esse momento”, afirma. Ele tem uma filha de 13 e um filho de 11 anos.

O engenheiro naval Felipe Campos, 43, elogia hierarquia mais descentralizada no trabalho e maior segurança para criar os filhos. Foto: Mariana Baldocchi/Reprodução

Antes de embarcar para a Irlanda, ele viveu três anos no Chile por demanda do trabalho (saiba como é trabalhar na nação sul-americana).

Em solo europeu, o engenheiro naval percebe diferenças latentes a respeito da cultura de trabalho brasileira e irlandesa. “Aqui, os horários e a carga de trabalho são mais definidos. Não é esperado que você trabalhe mais do que o proposto no dia”, descreve.

Outra vantagem do ponto de vista de Campos é a hierarquia. “A sociedade é mais horizontal. Então, tem menos diferença do CEO para o funcionário que começa na empresa.”

Ele não descarta a possibilidade de retorno ao Brasil. Porém, a passagem de volta ainda não tem data.

“Eu me vejo no Brasil no futuro, mas a liberdade que meu filhos têm na Irlanda compensa qualquer problema que temos da falta de presença da família. Então, a vida deles é muito mais livre. Isso tem um valor muito grande para nós”, declara Campos.

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