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Islândia, mesmo com vulcões e custo de vida alto, atrai brasileiros por salário de mais de R$ 15 mil

Renda maior e sensação de segurança estão entre os principais atrativos da ilha remota que abriga pouco mais de 240 brasileiros

Foto do author Bruna Klingspiegel
Foto do author Jayanne Rodrigues
Atualização:

Um salário tentador foi o que motivou o youtuber Junior Guimarães, 49, a se mudar com a família para a Islândia, país europeu famoso pelas paisagens vulcânicas, gêiseres e auroras boreais, com 370 mil habitantes, o que corresponde a 3,2% da população da cidade de São Paulo. Cerca de 240 brasileiros decidiram percorrer mais de 9 mil quilômetros para viver na ilha isolada no Mar do Norte, segundo dados do Ministério das Relações Exteriores.

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O fenômeno de imigração é algo novo no território. No último ano, o país nórdico ultrapassou a marca histórica de 60 mil estrangeiros. Destes, pessoas nascidas na Polônia (34,2%) representam o maior contingente, seguido por imigrantes da Lituânia (5,6%) e da Romênia (4,1%).

Mesmo com o risco de vulcões, o tempo frio e o alto custo de vida, os imigrantes são atraídos pelos altos salários. Não há um salário mínimo obrigatório. O valor é negociado pelos sindicatos, mas pelo que os brasileiros disseram dá para conseguir no mínimo de R$ 15 mil a R$ 17 mil brutos por mês. Segundo o portal Hagstofa Íslands, a média salarial da Islândia ficou em torno de 4.250 euros (o equivalente a R$ 22,7 mil) em 2021. O imposto é de cerca de 40%, dependendo do cargo.

Ele foi para Portugal primeiro e depois buscou a Islândia

O brasileiro Junior Guimarães foi um dos 17 mil imigrantes que desembarcaram na Islândia em 2022.

Esta não seria a primeira mudança radical. Desde 2019, ele, a esposa, Mirelle Candeloro, 38, e a filha Úrsula, 8, não viviam mais em Porto Alegre (RS).

Com uma reserva de 12 mil euros, Portugal foi o país escolhido. Inicialmente, a renda do casal era integralmente do canal de games que administram no YouTube, com quase 2 milhões de inscritos. “Não fomos para trabalhar, fomos para viver”, relembra Junior.

No entanto, a pandemia transformou o padrão de vida do casal. A monetização das plataformas caiu drasticamente, e o brasileiro começou a atuar como entregador para complementar a renda.

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“Portugal é um ótimo lugar para se morar quando tem uma renda boa. Mas não era mais aquela coisa toda que vivemos no início”, conta.

A oportunidade de morar na Islândia veio com o convite de um primo da esposa, que havia conseguido trabalho temporário em um hotel. Ao saber o salário, não pensaram duas vezes.

Mirelle, com cidadania italiana, foi a primeira a conseguir uma vaga no país por meio de um site de emprego. Saíram da cidade portuguesa Viseu para Reykholt, localidade com apenas 280 habitantes.

Logo depois, foi a vez de Junior encontrar a família na ilha remota e ficar de vez. Ele foi contratado para atuar no setor de caixa e depósito no mesmo local em que Mirelle trabalha, uma espécie de complexo que reúne hotel, restaurantes, espaço de conveniência e loja de roupas e acessórios.

Em Portugal, o profissional recebia em torno de 700 euros (R$ 3.700). Na Islândia, a remuneração quadriplicou (cerca de 2.800 euros ou R$ 15 mil).

À primeira vista, a rotina de trabalho não parece tão diferente da do Brasil. A jornada é de 10h às 18h. Mas, para além da barreira do idioma, há um detalhe curioso: “Saio de noite e volto de noite. Nesta época do ano, são 24 horas de noite”, diz rindo.

“Muitas vezes a estrada está fechada por causa da neve. Já aconteceu de não poder trabalhar ou ter que vir mais cedo porque havia previsão de vento ou de neve mais forte.”

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Bebês na Islândia dormem ao ar livre e no frio

Morando há nove anos na Islândia, a empresária Anne Litla, 36, saiu de João Pessoa (PB), ao lado do marido islandês, em busca de um sistema de ensino adequado para o filho de 6 anos com TDAH.

Grávida de 8 meses, a adaptação cultural não foi fácil. Anne já tinha visitado o país algumas vezes, mas a mudança foi um choque tanto para ela quanto para a família do seu companheiro.

A empresária lembra das diferenças culturais, como a estranheza dos islandeses ao ver brincos em sua filha recém-nascida, ou a prática de deixar bebês dormindo ao ar livre no meio do frio.

“Você chegou aqui e já está em outro mundo. Tudo é muito diferente, desde a alimentação até como as pessoas se comportam no dia a dia”, conta.

Essa adaptação também se estendeu à sua vida profissional. Inicialmente, Anne trabalhou na pousada da família do marido, mas com o tempo a necessidade de conciliar trabalho e cuidados com a família a conduziram a abrir seu próprio negócio. Sua loja, especializada em fantasias e produtos infantis, começou em casa e se expandiu para a capital, Reykjavik.

Na foto, a empresária Anne Litla, de 36 anos.  Foto: Arquivo Pessoal

Igualdade salarial na Islândia surpreende

Outro aspecto que surpreendeu a brasileira foi a igualdade salarial no país. Não importa se a pessoa trabalha como caixa de supermercado ou em uma loja, os salários são parecidos e só mudam um pouco com carreiras diferentes, como na área de TI.

Conforme a pessoa avança na carreira e o salário aumenta, também passa a pagar mais impostos. Assim, a disparidade salarial não é tão evidente e não é comum ter um tratamento diferenciado das pessoas com base em suas profissões.

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A ilha é considerada a nação com a melhor distribuição de renda em um lista de 44 países, conforme levantamento da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).

“Ao chegar à Islândia pela primeira vez, é estranho não conseguir distinguir quem tem dinheiro de quem não tem. A diferença não é muito evidente, porque todo mundo vive de forma semelhante.”

Ela diz que a média salarial lá é de cerca de 2.800 coroas islandesas por hora, o que dá 18,6 euros por hora (R$ 99). Considerando uma jornada diária de 8h, com 22 dias de trabalho por mês, o valor mínimo chega a R$ 17 mil brutos.

Vulcões da Islândia não assustam brasileira

A Islândia tem enfrentado desde novembro tremores e risco de erupção de vulcões, com uma cidade inteira evacuada.

Mas isso não preocupa Anne. Isso se tornou uma rotina comum. Ela relata que essa realidade é bastante típica no país, o que facilitou sua adaptação. “Nunca pensei sobre isso antes de vir morar aqui, inclusive visitei todas às vezes que pude.”

Imigrantes na Islândia têm contrato de trabalho temporário

A maioria dos contratos de imigrantes é temporária. O de Junior Guimarães é indeterminado. Ele recebe por hora trabalhada.

Durante o verão, costuma ter uma jornada de 9 horas por dia e faz hora extra. Nesse período, a renda é um pouco maior. Ainda assim, não é possível cravar o valor exato. “Não tem um mês fixo. Às vezes, também pedimos folgas para fazer algumas coisas”, explica.

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Em um semana de trabalho, ele e a esposa folgam dois dias. Junior, aos sábados e domingos. Mirelle, às terças e quartas.

O quesito financeiro é a principal razão para permanecerem no país europeu. Porém, algumas características devem ser levadas em consideração, avalia o brasileiro.

“Tem gente que gosta de uma vida mais calma, não se importa com ausência do sol. Algumas pessoas sentem muito isso. Mas aqui se ganha muito bem, então é mais fácil juntar dinheiro para poder ir para um outro lugar”, afirma.

Além do salário vantajoso, a empresária Anne Litla comenta que há uma abordagem mais flexível em relação ao trabalho, com a valorização do tempo de descanso e da qualidade de vida.

“Os islandeses não se sobrecarregam de trabalho. Durante o dia, eles têm várias pausas para tomar café, criando um ambiente muito mais relaxado. Eles não querem se desgastar com o trabalho.”

Quanto custa morar na Islândia?

Na mesma medida que a remuneração é superior em relação a outros países europeus, o custo de vida na ilha remota é significativamente maior que a cidade de São Paulo, por exemplo.

O aluguel em Reykjavik (capital da Islândia) é, em média, 189,8% maior do que a capital paulista, conforme informações do Numbeo, site especializado.

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Confira o preço de alguns itens em Reykjavik:

  • Pão branco fresco (500g) R$ 17,99
  • Filé de frango (1kg) R$ 94,20
  • McDonald’s (ou refeição combinada equivalente) R$ 78,22
  • Aluguel de apartamento (1 quarto) no centro da cidade: R$ 8.650,29
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