Pedir demissão pode ser uma vergonha? No Japão, empresas ajudam quem quer apenas deixar o emprego

Lei japonesa garante o direito de pedir demissão, mas empregadores acostumados a uma hierarquia de estilo antigo não aceitam que alguém que eles treinaram queira ir embora da empresa

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Por Redação

TÓQUIO (AP) - No Japão, nação conhecida pela lealdade às empresas e pelos empregos “vitalícios”, mudar de emprego costuma ser visto como uma vergonha. Por conta disso, nos últimos anos surgiram no país dezenas de serviços conhecidos como taishoku daiko, para ajudar as pessoas que querem simplesmente deixar seus empregos.

“Imagine um divórcio conturbado”, diz Yoshihito Hasegawa, diretor da TRK, com sede em Tóquio, cujo serviço Guardian aconselhou, no ano passado, 13 mil pessoas sobre como se demitir de seus empregos com o mínimo de aborrecimentos.

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As pessoas muitas vezes continuam trabalhando mesmo quando estão infelizes, sentindo-se como se fossem “kamikazes” sacrificando suas vidas pelo bem maior, disse ele, comparando seus clientes a pilotos enviados em missões suicidas nos últimos dias da Segunda Guerra Mundial.

“É assim que as coisas são feitas, da mesma forma que os mais jovens são ensinados a honrar os mais velhos”, disse. “Desistir seria uma traição.”

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Fundado em 2020, o Guardian, um serviço de taishoku daiko, ajudou várias pessoas, principalmente na faixa dos 20 e 30 anos, a escapar com menos sofrimento de empregos dos quais queriam sair. Isso inclui pessoas que trabalharam, por exemplo, em um santuário xintoísta, um consultório de dentista ou um escritório de advocacia.

Quase metade dos clientes da Guardian são mulheres. Alguns trabalham por um dia ou dois e depois descobrem que as promessas de pagamento ou horas de trabalho eram falsas.

A advogada Akiko Ozawa, cujo escritório aconselha quem está deixando o emprego, reconhece que pode ser difícil acreditar que as pessoas não possam simplesmente sair de seus trabalhos Foto: Eugene Hoshiko/AP Photo

A Guardian cobra 29,8 mil ienes (US$ 208) por seu serviço, que inclui uma associação de três meses a um sindicato que vai representar o funcionário no que pode rapidamente se transformar em um processo de negociação delicado e desajeitado no Japão.

Geralmente, os clientes da Guardian trabalham para pequenas e médias empresas, que empregam a maioria dos japoneses. Mas, às vezes, as pessoas que trabalham para grandes empresas também procuram ajuda. Em muitos casos, os chefes simplesmente se recusam a deixar um trabalhador sair, especialmente porque muitos lugares estão com falta de mão de obra, dada a escassez crônica de trabalhadores no Japão.

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A lei japonesa basicamente garante às pessoas o direito de pedir demissão, mas alguns empregadores acostumados a uma hierarquia de estilo antigo simplesmente não aceitam que alguém que eles treinaram queira ir embora. Aqueles que enfrentaram a batalha pela desistência e foram entrevistados para esta reportagem usaram termos como “fanáticos”, “valentões” e “mini-Hitlers” para descrever esses chefes.

As pressões relativas ao conceito de “workaholic” na cultura japonesa são dolorosamente pesadas. Os trabalhadores não querem ser vistos como encrenqueiros, relutam em questionar a autoridade e podem ter medo de falar. Eles temem assédio depois de desistirem. Alguns se preocupam com as opiniões de suas famílias ou amigos.

Embora a maioria dos clientes do Guardian prefira o anonimato, um jovem que atende pelo nome online de Twichan procurou ajuda depois que foi criticado por seu desempenho de vendas e ficou tão deprimido que pensou em se matar. Com a ajuda do Guardian, ele conseguiu sair em 45 minutos.

Taku Yamazaki, que foi para um taishoku daiko diferente, disse que seu antigo empregador era uma subsidiária de um grande fornecedor de TI e sabia que sua saída seria complicada e demorada, porque estava indo bem lá.

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“Senti uma certa gratidão pelo lugar de onde estava saindo, mas queria mudar mentalmente de marcha e seguir em frente o mais rápido possível”, disse ele. Quando as pessoas preenchem os formulários online dos “taishoku daiko”, uma resposta automática chega em minutos, com uma resposta mais pessoal prometida para o prazo de um dia útil.

A advogada Akiko Ozawa, cujo escritório de advocacia aconselha quem está deixando o emprego, embora geralmente represente empresas, reconheceu que pode ser difícil acreditar que as pessoas não possam simplesmente sair dos empregos.

“Mas mudar de emprego é um grande desafio no Japão, algo que exige uma coragem tremenda”, disse Ozawa, que escreveu um livro sobre taishoku daiko. Dada a escassez de trabalhadores no Japão, encontrar e treinar substitutos é difícil e os chefes às vezes ficam furiosos quando alguém pede demissão.

“Enquanto essa mentalidade japonesa existir, a necessidade do meu trabalho não vai desaparecer”, disse Ozawa, que cobra 65 mil ienes (US$ 450) por seu serviço. “Se você está tão infeliz que está começando a se sentir mal, então você deve fazer essa escolha para assumir o controle de sua própria vida.”

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Outro serviço de demissão, o Albatross, oferece um serviço “MoMuri” ou “não aguento mais”, cobra uma taxa de 22 mil ienes (US$ 150) para trabalhadores em período integral e uma barganha de 12 mil ienes (US$ 80) para quem trabalha meio período.

Dirigida por Yoshihito Hasegawa, a TRK, com sede em Tóquio, aconselhou 13 mil pessoas em 2022 sobre como se demitir de seus empregos com o mínimo de aborrecimentos Foto: Yuri Kageyama/AP Photo

Problemas no local de trabalho sempre existiram, mas agora as pessoas percebem que podem obter ajuda online, disse o fundador do serviço, Shinji Tanimoto. “Eles nos dizem que não conseguiam dormir antes, mas finalmente podem dormir o quanto quiserem”, disse ele sobre os clientes do MoMuri. “Os usuários nos agradecem o tempo todo. Alguns choram de alegria.”

Uma pessoa queria parar de trabalhar em um salão de beleza para pets onde os funcionários chutavam os animais secretamente. Outro queria deixar o emprego em um consultório odontológico onde a equipe não usava luvas novas para cada paciente.

Muitas são mulheres que trabalham como enfermeiras ou cuidadoras e são convidadas a ficar até que um substituto seja encontrado, mas acabam se vendo trabalhando no mesmo emprego um ano depois, disse ele.

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Toshiyuki Niino fundou a Exit Inc., pioneira no setor de taishoku daiko, em 2018, depois de passar por um chefe que gritava constantemente com ele e por outro que ameaçou matá-lo. Ele largou os dois empregos e viu uma oportunidade. “Tenho orgulho de ter começado esse gênero de trabalho”, disse.

Niino, que diz nunca ter expressado sequer uma opinião na escola, culpa o sistema educacional japonês por produzir trabalhadores obedientes que são incapazes de se afirmar. Ele está pensando em aumentar o serviço para incluir aconselhamento de saúde mental, referências de trabalho e talvez até mesmo uma expansão no exterior.

E ele ri ao contar como um de seus próprios funcionários usou uma agência rival para pedir demissão e depois abriu sua própria empresa de taishoku daiko. “É melhor se você mesmo puder dizer que quer sair”, disse.

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