Tarifaço de Trump: protecionismo desacelera o comércio global e ninguém ganha, diz economista da FGV

Para Brasil, que tem baixa participação no comércio mundial, também será ruim, avalia Lia Valls; nos EUA, deve aumentar a inflação americana e dificultar as exportações do país para o resto do mundo

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Foto do author Márcia De Chiara

A decisão do governo americano de Donald Trump de taxar em 25% as importações do México e do Canadá terá impacto muito grande nas cadeias produtivas das indústrias dos Estados Unidos, especialmente do setor automotivo. Do ponto de vista macroeconômico, deve aumentar a inflação americana, dificultar as exportações dos Estados Unidos para o resto do mundo e também reduzir o comércio global.

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A avaliação, ainda preliminar, é da economista Lia Valls, pesquisadora de Comércio Exterior da Fundação Getulio Vargas. A especialista pondera que esse diagnóstico tem como pressuposto que todos os produtos sejam taxados.

Até este sábado, 1º, pela manhã, ainda não era conhecida a lista de itens que terão uma alíquota de 25%, se o petróleo, por exemplo, cujo principal fornecedor é o Canadá, estaria enquadrado nessa nova taxação.

“Supondo que todos os produtos entrem, que é o pior cenário, será criada uma incerteza muito grande na economia americana”, diz a pesquisadora.

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Para Lia Valls, pesquisadora de Comércio Exterior da FGV, cenário é incerto e depende do detalhamento das medidas Foto: Werther Santana/Estadão

Ela destaca que Canadá, México e China são os três maiores parceiros comerciais dos EUA. A mudança de um cenário de praticamente livre comércio com Canadá e México, para uma taxação de 25% será radical e terá desdobramentos nas cadeias produtivas.

A pesquisadora lembra que o Canadá exporta para os EUA muito petróleo, alumínio, carros e autopeças. Além de veículos, o México vende para os EUA produtos eletrônicos e máquinas. O acordo automotivo do Canadá com os EUA é dos anos 1960. “As cadeias de produção são muito interligadas entre os países na parte do setor automotivo”, observa.

Impacto global

A imposição de tarifas pelos Estados Unidos às importações tem como objetivo fortalecer o dólar. Segundo Lia, além do aumento da inflação local por conta do encarecimento das importações, outro desdobramento, a médio prazo, será o encarecimento das exportações dos Estados Unidos para o resto mundo. “Com o dólar valorizado, será mais difícil os americanos exportarem para o resto mundo.”

Outro ponto destacado pela especialista é que, se os países afetados começarem a reagir com retaliação e protecionismo, o efeito será uma desaceleração no comércio mundial. “No final, ninguém ganha e para o Brasil, que já tem uma participação muito pequena comércio mundial, será ruim.”

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Quanto à hipótese de que o Brasil poderia ter alguma vantagem com as tarifas impostas ao México, Canadá e China, a pesquisadora diz que o cenário ainda é incerto. Segundo ela, o Brasil poderia exportar produtos do agronegócio, mas esse movimento estaria na dependência de a China reagir retaliando as compras desses itens dos Estados Unidos, como já ocorreu com a soja americana.

Já no caso de o Brasil exportar partes, peças e veículos para os Estados Unidos na lacuna que seria deixada pelo México, Lia diz que não se sabe ao certo se o setor automotivo teria capacidade para responder rapidamente a essa demanda.

Mesmo com um aumento de 25% de tarifas de partes, peças e autos que vem do México, a pesquisadora pondera que necessariamente não daria para afirmar que os produtos brasileiros seriam mais competitivos. “Tem distância, custo de transporte.”