A cada dezembro, os governantes da China se reúnem para a sua Conferência Central de Trabalho Econômico, na qual revisam os últimos 12 meses e antecipam as tarefas que enfrentarão no ano seguinte. É um exercício útil, mesmo que você não seja membro do Politburo, o comitê central do Partido Comunista.
Este ano, a perspectiva em ambas as direções parece sombria. As vendas no varejo em novembro foram 3% maiores que no ano anterior, abaixo das expectativas, mesmo antes de ajustadas pela inflação. Não que estivesse alta. Os preços ao consumidor aumentaram apenas 0,2% no mesmo período. Ambas as estatísticas refletem a cautela das famílias. A confiança do consumidor nunca se recuperou do colapso durante os bloqueios na pandemia.
Esse é o panorama retrospectivo. E sobre o futuro? As exportações e investimentos na indústria, que ajudaram a sustentar a economia em 2024, enfrentam a perspectiva de uma nova guerra comercial com os Estados Unidos. Durante a campanha eleitoral, Donald Trump ameaçou a China com tarifas de 60% ou mais. Após sua vitória, ele disse que imporá 10% adicionais se a China não fizer mais para restringir o fluxo de fentanil, um opioide sintético feito a partir de precursores químicos que geralmente se originam no país. Alguns comentaristas na China esperavam que a ameaça de 10% substituísse a anterior, maior. Mas Trump disse que a penalidade do fentanil suplementará “tarifas adicionais”, e não as substituirá.
Cálculos rápidos feitos pelo Citigroup sugerem que tarifas tão altas podem reduzir em 2,4 pontos porcentuais a taxa de crescimento da China, se o governo não fizer nada para amortecer o golpe.
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Tudo isso deixou os participantes da Conferência Central de Trabalho Econômico com muito trabalho pela frente. Eles devem estimular gastos para manter a economia no mesmo nível de antes da guerra comercial, por conta do aumento das tarifas, e, assim, atenuar o impacto na demanda. Mas o passado oferece algum ensinamento.
Em 2008, durante a crise financeira global, os mercados de exportação da China no Ocidente entraram em colapso. Mesmo assim, a sua economia ainda cresceu vigorosamente, graças aos esforços de resgate do governo. A China, naquela época, deu muitos estímulos à demanda: convocou os bancos estatais para emprestar e as empresas estatais para gastar. A economia também foi ajudada por um mercado imobiliário efervescente, que era difícil de controlar, mas fácil de abrir.
Esforços tardios
Infelizmente, os esforços de estímulo da China durante grande parte deste ano foram tardios, cautelosos e ineficazes. O país reduziu gradualmente as taxas de juros, os custos de hipotecas e as reservas obrigatórias dos bancos. Mas a demanda por crédito permaneceu fraca. Para estimular o mercado imobiliário, o Estado insistiu que os bancos a emprestassem para uma “lista branca” de projetos de construção de casas supostamente viáveis. No entanto, os bancos permaneceram cautelosos.
Em maio, o banco central chinês ofereceu até 300 bilhões de yuans (US$ 41 bilhões) em refinanciamento barato para empresas estatais dispostas a comprar propriedades não vendidas e convertê-las em moradias acessíveis. A adesão foi muito pequena: menos de 15% até 23 de novembro, segundo a Huatai, uma empresa de valores mobiliários.
Um motivo pelo qual o estímulo ficou aquém nessa recessão é que ele foi muito grande no passado. O boom de crédito após a crise financeira global deixou a China com altas dívidas, excesso de capacidade e milhões de apartamentos não vendidos. Xi Jinping, presidente da China, assumiu o poder em 2012 determinado a não repetir o erro.
Quando a economia vacilou em 2015, ele cunhou um novo slogan, “reforma estrutural do lado da oferta”, que enfatizava o corte da capacidade industrial, redução dos estoques de imóveis e diminuição da dívida corporativa. Um espírito similar motivou sua política posteriormente conhecida como as “três linhas vermelhas”, que impôs limites estritos de empréstimo para as incorporadoras do mercado imobiliário, empurrando muitos delas para a falência após 2021.
Independentemente de suas virtudes, essa mentalidade prejudicou os esforços da China para reanimar a economia em 2024. Embora o governo central tenha aumentado seu endividamento, continuou a impor disciplina financeira a muitos governos locais endividados, que foram forçados a apertar os cintos.
Os bancos também estão cautelosos em emprestar para incorporadoras imobiliárias da lista branca porque se preocupam que sofrerão perdas se os empréstimos não forem pagos. Sob a reforma estrutural do lado da oferta, por exemplo, os credores foram convocados a tomar participações acionárias em empresas devedoras que não conseguiam pagar seus empréstimos.
Estímulo à demanda
Para lidar com os riscos do próximo ano, os governantes da China terão que priorizar o estímulo à demanda em vez de impor disciplina nos gastos. Há sinais de que eles agora aceitam esse fato. Em novembro, o ministério das finanças disse que permitiria que os governos locais emitissem títulos adicionais para substituir 10 trilhões de yuans em passivos “ocultos”, na maioria das vezes mantidos por veículos de financiamento criados para evitar limites de empréstimo. Isso reduzirá os custos de empréstimo deles. E, como Adam Wolfe, da Absolute Strategy Research, apontou, em 2025 isso liberará cerca de 1,2 trilhão de yuans, que anteriormente estavam voltados para refinanciar essa dívida.
A mudança de política também foi evidente na Conferência Central de Trabalho Econômico. A necessidade de “impulsionar vigorosamente o consumo” e expandir a demanda interna foi listada como a primeira de nove tarefas que o governo deve enfrentar, colocada acima do objetivo principal de Xi Jinping de atualização industrial. E, após aparecer em todos os relatórios oficiais da conferência desde 2015, o termo “reforma estrutural do lado da oferta” este ano esteve ausente.
Ajuda do mercado imobiliário
Os formuladores de políticas, portanto, identificaram a prioridade correta. Mas como eles pretendem alcançá-la? Eles podem ser ajudados por uma estabilização que começa aparecer no mercado imobiliário. As vendas de novas propriedades residenciais aumentaram um pouco na comparação anual em novembro, o primeiro crescimento em mais de três anos, excluindo um surto no início de 2023, após o abandono dos controles impostos na pandemia. Os preços também parecem estar se estabilizando. Isso pode dar uma certa medida de confiança para os consumidores que pretendem comprar imóveis.
Para estimular o consumo, as cidades podem usar cupons de compras eletrônicas distribuídos em Xangai nos últimos meses. Esses cupons oferecem descontos em refeições, filmes, hotéis e esportes se as pessoas gastarem acima de um determinado valor.
O governo também parece empenhado em expandir seu programa de trocas, que incentiva as famílias a trocarem seus carros, geladeiras, aparelhos de ar condicionado e outros bens duráveis por modelos mais novos. Essa política conseguiu aumentar as vendas no varejo de eletrodomésticos em mais de 22% em novembro em comparação com o ano anterior. (No entanto, as vendas no varejo foram fracas, por conta da antecipação das promoções do “Dia dos Solteiros”, que ocorre em 11 de novembro).
Em um esforço adicional para fazer as pessoas economizarem menos e gastarem mais, os líderes da China prometeram aumentar as pensões e os subsídios para o seguro saúde. O Goldman Sachs acredita que o déficit fiscal amplo do governo pode aumentar em quase 2% do PIB (Produto Interno Bruto) em 2025. No próximo ano, a China precisa impulsionar o gasto doméstico usando medidas que no passado negligenciou. Isso poderia ser chamado de reforma estrutural do lado da demanda.
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