The Economist: A corrida da China para se tornar uma superpotência robótica

À medida que sua população diminui, país espera que as máquinas consigam assumir o trabalho

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Por The Economist

A primeira tentativa chinesa de construir um robô humanoide não acertou o alvo. A máquina produzida no ano 2000 por uma equipe da Universidade Nacional de Tecnologia de Defesa parecia uma torradeira ambulante. Tinha olhos arregalados e protuberâncias com formato de canhão perto da virilha. Chamado Xianxingzhe, ou “Precursor”, o robô foi ridicularizado no vizinho Japão, que na época ostentava modelos muito mais elegantes. Os internautas japoneses o descreveram como a arma secreta da China, projetado para matar os inimigos - de tanto rir.

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Mas a China persistiu. Em novembro, o governo publicou um plano prevendo a produção em massa de robôs humanoides até 2025. O amor do país pelos robôs vai além daqueles que conseguem andar e falar. No ano passado, metade de todos os robôs industriais do mundo estavam instalados em solo chinês, de acordo com a Federação Internacional de Robótica, um órgão do setor. A China é agora o quinto país mais automatizado do mundo em termos de robôs por trabalhador. Motivada pelo orgulho e pelos desafios demográficos prementes, a China encarou a missão de se tornar uma superpotência robótica.

Muitos dos robôs recentemente instalados no país são braços mecânicos que podem ser programados para soldar, perfurar ou montar componentes nas linhas de produção. Mas, no ano passado, a China também produziu mais de 6 milhões de “robôs de serviço”, que ajudam os humanos em tarefas que vão além da automação industrial. Essas máquinas circulam pelos depósitos, movendo caixas. Outras limpam hotéis. Em um restaurante na cidade de Guangzhou, no sul do país, são os robôs que preparam e servem as refeições.

Pode até parecer mero truque, mas, para o Partido Comunista, liderado por Xi Jinping, os robôs são um negócio sério. As autoridades acreditam que, se a China ficou para trás e foi humilhada pelas potências ocidentais no século 19, foi pelo menos em parte porque não adotou as revoluções tecnológicas que aconteciam em outros lugares. Agora, o país quer liderar essa corrida. Se no passado as autoridades usavam a produção de aço como indicador do progresso econômico, hoje olham para o número de robôs instalados, diz Dan Wang, do Hang Seng Bank.

O impressionante crescimento econômico da China nas últimas décadas foi resultado de três fatores principais: crescente força de trabalho urbana, grande aumento no estoque de capital e explosão da produtividade. Hoje, porém, há menos necessidade de infraestruturas novas. E a população em idade ativa, entre 15 e 64 anos, está encolhendo. Prevê-se que diminua mais de 20% até 2050. No início deste ano, o governo divulgou uma lista de 100 profissões para as quais há escassez de mão de obra. Os cargos industriais somaram 41 delas. Antigamente, um excesso de trabalhadores jovens e baratos realizava esses trabalhos; agora os salários estão mais elevados e os trabalhadores, menos abundantes.

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Em 2022, a China produziu mais de 6 milhões de 'robôs de serviço', que ajudam humanos em tarefas que vão além da automação industrial Foto: Thomas Peter/Reuters - 22/8/2017

Como resultado, Xi priorizou o aumento da produtividade. O governo vê os robôs desempenhando um papel importante nesse esforço. Por anos, pressionou a indústria a deixar de ser intensiva em mão de obra para se tornar intensiva em robôs. As províncias gastaram bilhões de dólares ajudando fabricantes a se atualizarem. A experiência da China durante a pandemia reforçou essa mentalidade. Os lockdowns intermináveis fizeram com que as fábricas fechassem e as empresas ocidentais repensassem suas cadeias de abastecimento. Quando todos os controles foram suspensos, em 2022, uma onda de covid-19 voltou a atrapalhar as empresas, pois os trabalhadores ainda adoeciam. Com os robôs, a saúde não é mais preocupação.

Muitos dos desafios enfrentados pelas fábricas também se aplicam à agricultura. O agricultor chinês médio está na casa dos 50 anos de idade. Poucos jovens querem ocupar seu lugar no campo. Os países que enfrentam situações semelhantes muitas vezes importam alimentos ou mão de obra barata. Mas a China é paranoica em relação à segurança alimentar e não está interessada em imigração. Os robôs podem ser a resposta. Alguns aspectos da agricultura, como a ordenha das vacas, podem ser automatizados com bastante facilidade. Outros são mais complicados, mas parecem possíveis em pequena escala. A cidade de Chengdu, no sudoeste do país, desenvolveu uma horta sem mão de obra humana que, em tese, poderia produzir dez colheitas por ano.

Com o tempo, os robôs poderão substituir os trabalhadores idosos. E também podem desempenhar um papel importante no cuidado dessas pessoas. A China tem pouquíssimos profissionais cuidando dos 8,1 milhões de moradores de lares de idosos. Um plano da Comissão Nacional de Saúde publicado em 2021 apelava ao desenvolvimento de cuidados inteligentes para os idosos. Algumas das ideias são aspiracionais, como fornecer exoesqueletos eletrônicos a pessoas frágeis, para ajudá-las em seus movimentos. Mas robôs mais simples poderiam ser usados para ajudar os idosos a tomar banho ou a se levantar.

Os gigantes tecnológicos da China estão encarando o desafio. Em 2022, a iFlytek, uma grande empresa de inteligência artificial, disse que queria enviar robôs às casas dos idosos para oferecer companheirismo e gestão de saúde. Idosos de uma casa de repouso em Xangai ficaram felizes com um robô que andava pelos quartos cantando canções revolucionárias da juventude dos moradores, segundo a mídia local.

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Mas o governo ficaria ainda mais feliz se a indústria robótica chinesa se tornasse mais autossuficiente. As empresas locais ainda dependem de companhias estrangeiras para obter peças e know-how. A China teme ser excluída dos mercados ocidentais - e por boas razões. Os Estados Unidos impediram que as empresas chinesas comprassem semicondutores avançados e o equipamento utilizado para fabricá-los (os robôs precisam de chips, mas geralmente não do tipo mais avançado). Então, o governo vem tentando estimular a pesquisa em robótica. Em agosto, a cidade de Pequim anunciou um fundo de 10 bilhões de yuans (US$1,4 bilhão) para o desenvolvimento de robôs.

Investimento em robótica humanoide virou foco da China na última década Foto: Guilherme Guerra/Estadão

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Os esforços estão surtindo efeito. No ano passado, 36% dos robôs industriais instalados na China tinham sido fabricados em solo nacional, ante 25% em 2013. A Shenzhen Inovance Technology, uma grande empresa chinesa, constrói robôs que são usados para fabricar luzes de LED e aparelhos celulares. Ela planeja adquirir todos os componentes necessários de empresas chinesas dentro de cinco anos, diz Zhu Xingming, seu presidente.

Mas, para a maioria das empresas chinesas de robótica, a autossuficiência ainda está um pouco mais distante. Esta é parte da razão pela qual o governo está incentivando o desenvolvimento de robôs humanoides. Estes talvez não venham a ser muito práticos ou acessíveis no curto prazo. Mas as autoridades esperam que o processo de fabricação crie uma cadeia de abastecimento doméstica.

Uma coisa com a qual o governo não precisa se preocupar é com muitas resistências contra seus planos. Pesquisas sugerem que a maioria dos chineses acredita que os robôs vão criar mais empregos do que destruir. Ao que parece, a China é uma terra de tecno-otimistas. É claro que ajuda o fato de os sindicatos independentes serem proibidos no país. / TRADUÇÃO DE RENATO PRELORENTZOU

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