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Grupo de tributaristas faz campanha por taxação de armas: ‘Devem ter mesma tributação de flores?’

Especialistas em questões de gênero da FGV articulam nas redes sociais e no contato com o Congresso manifesto para incluir armas no chamado ‘imposto do pecado’

Foto do author Beatriz Bulla

Um grupo de tributaristas especialistas em questões de gênero da Fundação Getúlio Vargas (FGV) tem articulado nas redes sociais e junto ao Congresso uma campanha para incluir as armas no Imposto Seletivo, também chamado de “imposto do pecado”. “Taxar armas como flores é cultivar violência com o preço da paz”, diz a campanha.

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O grupo de trabalho responsável por regulamentar a reforma tributária na Câmara dos Deputados apresentou na quinta-feira, 4, o primeiro relatório da proposta. Havia uma expectativa de que as armas entrassem na lista de alvos do “imposto do pecado”, mas elas foram poupadas neste primeiro relatório.

“Armas devem ter a mesma tributação que outros bens como flores e fraldas? Não! Um sistema tributário justo é aquele que tributa mais os bens menos essenciais. Além disso, no Brasil, uma mulher é morta a cada seis horas com o uso de armas de fogo. Isso sem falar que, em 16 anos, o Brasil tem mais amputados por armas de fogo do que o Exército dos EUA. É clara a prejudicialidade à vida, à integridade física e à saúde que as armas de fogo causam”, afirma a advogada tributarista Jacqueline Mayer, parte do grupo da FGV-SP.

O documento encaminhado aos parlamentares pelo grupo da FGV cita que, das 3.788 mulheres assassinadas no Brasil em 2022, 1.878 foram vítimas de arma de fogo.

“Isso significa que seis mulheres são violentamente assassinadas todos os dias, ou seja, uma mulher morre por arma de fogo a cada quatro horas. Some-se a isso o fato de que outras 3.793 mulheres foram vítimas de violência armada não letal. Desse total, 28% foram agredidas por parceiros íntimos. Esses dados do Instituto Sou da Paz reiteram a lesividade das armas de fogo e munições, especialmente em relação às mulheres”, afirma trecho do documento.

“Assim, é desejável que os dispositivos do PLP 68/2024 sofram alterações para que o Imposto Seletivo, em sua função extrafiscal, incida sobre operações com armas e munições destinadas à segurança privada, com o intuito de inibir o consumo desses bens lesivos à vida e à saúde das mulheres”, afirma o grupo de tributaristas. O documento tem assinatura de 23 advogadas. O manifesto recebeu adesões de entidades da sociedade civil, como o Instituto Sou Da Paz.

O grupo de pesquisa sobre tributação e gênero do Núcleo de Direito Tributário da FGV-SP debate propostas que tenham como foco reduzir a desigualdade de gênero na carga tributária brasileira para incluir as armas no Imposto Seletivo. “Só assim vamos evitar que a tributação das armas caia de 89,25% para 26,5% e que, assim, elas sejam tributadas da mesma forma que as flores e as fraldas”, afirma a advogada Jacqueline Mayer.

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Grupo de Trabalho de regulamentação da reforma tributária durante apresentação do parecer preliminar do primeiro projeto de lei completar da reforma Foto: Wilton Júnior/Estadão

A inclusão das armas no grupo de itens que será taxado pelo Imposto Seletivo é defendida por entidades da sociedade civil e também pelo governo Lula, mas sofre resistência por parte da bancada da bala, no Congresso, e por apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro. O vice-presidente Geraldo Alckmin chamou de “equívoco” deixar as armas fora do Seletivo. “É muito melhor desonerar comida. Está comprovado que, quanto mais arma tem, mais homicídio tem”, afirmou.

No final de junho, o grupo da FGV apresentou em audiência pública na Câmara dos Deputados nove propostas de alteração no projeto de lei que regulamenta a reforma tributária. Entre elas, estão a redução a zero da tributação dos produtos relacionados à higiene menstrual, como absorventes. Este item foi incluído no relatório apresentado na semana passada. O segundo ponto da lista de alterações sugerido pelas especialistas é o relacionado às armas. O documento é assinado por 23 advogadas.

Próximos dias

Diante da expectativa de que o primeiro relatório da regulamentação da reforma tributária seja votado na Câmara antes do recesso parlamentar, que começa em 18 de julho, o Congresso deve se transformar nos próximos dias num campo de batalha sobre impostos.

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Os projetos de regulamentação da reforma tributária são a última etapa no Congresso para efetivamente torná-la uma realidade, embora a proposta preveja uma longa transição. Demanda do setor produtivo, a discussão sobre alterações nos impostos começou há mais de 30 anos. Neste momento, o debate trata apenas da tributação sobre o consumo. O Executivo prometeu enviar uma proposta para mudar a cobrança de impostos sobre a renda.

As discussões nos corredores do Congresso também serão dominadas pelos setores e empresas que desejam escapar do Imposto Seletivo, também chamado de “imposto do pecado” – que vai incidir sobre os itens considerados nocivos à saúde e ao ambiente. O relatório apresentado pelo grupo de trabalho incluiu jogos de azar (como loterias e as apostas esportivas, as chamadas de “bets”) no Seletivo, além de carros 100% elétricos, como antecipou o Estadão.

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