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Trump volta a criticar decisões do BC americano e eleva temor de interferência política

Ex-presidente já afirmou que não cogita apoiar o nome de Jerome Powell a um novo mandato no Fed; republicano defendeu necessidade de o presidente ter voz na política monetária dos EUA

Foto do author Aline Bronzati

NOVA YORK - Os renovados ataques do ex-presidente Donald Trump ao Federal Reserve (Fed, o banco central americano) preocupam Wall Street quanto à ameaça de riscos políticos à principal autoridade monetária do mundo caso o republicano seja eleito, em novembro. As críticas ecoam em meio aos temores de que a autoridade possa ter demorado muito para começar a cortar os juros nos Estados Unidos, esfriando o mercado de trabalho além do necessário, e ampliando as chances de um pouso forçado na maior economia do mundo.

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“O Fed cometeu muitos erros. Tende a ser rápido demais ou atrasado demais”, disse Trump, em recente declaração à imprensa americana. O ex-presidente diz que ganhou muito dinheiro e julga ter “instintos melhores” que os próprios dirigentes do BC dos EUA para opinar para onde os juros devem ir no país.

Foi o próprio republicano que indicou o atual presidente do Fed, Jerome Powell, meses após assumir a Casa Branca, em 2017. Mas a lua de mel acabou logo. Durante o seu primeiro mandato, Trump não só o criticava como teria tentado demiti-lo, mas acabou desistindo diante das barreiras legais. Desta vez, já disse e repetiu que não cogita apoiar o nome de Powell a um novo mandato.

Segundo Trump, Fed 'cometeu muitos erros' na definição da política monetária americana Foto: Rick Bowmer/AP

Em meio às maiores preocupações com a saúde financeira dos EUA, Trump reforçou as críticas ao Fed e defendeu a necessidade de o presidente ter voz na política monetária. “Sinto que o presidente deveria ter pelo menos (uma) palavra a dizer, sim. Sinto isso fortemente”, disse o republicano, na semana passada.

A preocupação com a independência do BC após as renovadas críticas de Trump ao Fed tem repercutido na imprensa americana. “Isso prepara o sistema para abusos”, disse o diretor do Centro de Economia Financeira da Universidade Johns Hopkins, Robert J. Barbera, à revista americana Time.

A candidata democrata e vice-presidente dos EUA, Kamala Harris, discordou fortemente de Trump e prometeu não interferir no BC dos EUA, caso seja eleita. “O Fed é uma entidade independente e, como presidente, eu nunca interferiria nas decisões que o Fed toma”, disse ela, no fim de semana.

Enquanto no caso de Harris, o mercado vê um pouco mais do mesmo da agenda do atual presidente dos EUA, Joe Biden, em um eventual governo Trump, a aposta é em um Fed mais “dovish”, ou seja, propenso a manter os juros baixos na maior economia do mundo.

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Mas a sua tentativa por ter voz no Fed, ainda que tenha chances baixas de sucesso na visão de alguns especialistas, preocupa Wall Street. Economistas defendem a importância da independência dos bancos centrais uma vez que os governos tendem a pressionar por juros baixos, o que pode levar ao descontrole da inflação e, ao contrário, exigir juros maiores, pesando na atividade econômica à frente.

“Há algumas razões para ficar nervoso sobre a independência do Fed sob o presidente Trump”, diz o economista-chefe da Moody’s Analytics, Mark Zandi. De acordo com ele, as críticas do republicano ao Fed são um “ponto de alerta” e um sinal de como poderia ser a sua gestão, caso vença nas urnas em novembro. “Um banco central independente é uma pedra angular”, alerta Zandi.

Considerado o “pai dos bancos centrais”, o Banco de Compensações Internacionais (BIS) alertou para o risco de pressões políticas minarem a reputação e a autonomia das autoridades monetárias, em seu relatório anual, divulgado no mês passado. “Em períodos de inflação, o banco central precisa tomar decisões, e deve ter os graus de liberdade para agir de acordo com os seus mandatos”, disse o gerente-geral do BIS, Agustín Carstens, ao comentar o documento.

Para a consultoria britânica TS Lombard, um novo governo Trump pode significar um Fed mais dovish, e de forma paulatina. O mandato do atual presidente do Fed, Jerome Powell, termina em 2026. Além disso, diretores da autoridade que integram o chamado “Board of governors” devem deixar o bastão nos próximos anos. Ou seja, o próximo presidente dos EUA deverá indicar não só um novo nome para chefiar a autoridade, mas também ao menos dois diretores.

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O Comitê Federal do Mercado Aberto (FOMC, na sigla em inglês) do Fed é composto por 12 membros. Além do presidente, participam sete membros do chamado ‘board of governors’ e ainda outros quatro integrantes com mandato de um ano em uma base rotativa.

“No mínimo, ele (Trump) poderia gradualmente mudar a composição do Fed para o lado mais ‘dovish’”, dizem os analistas da TS Lombard, Freya Beamish e Alexandros Xenofontos. As pressões políticas na gestão do republicano tendem a crescer a exemplo do que já tem ocorrido durante a campanha eleitoral, conforme eles, que, apesar disso, veem sua influência no Fed limitada em um eventual segundo mandato.

Para Zandi, da Moody’s Analytics, a composição do Congresso será importante para calibrar as pressões que podem vir caso Trump volte a liderar a Casa Branca. Se vier uma onda vermelha, com os republicanos levando a Câmara e o Senado, a independência do BC será um ponto de alerta, avalia.

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Fora das quadras de Wall Street, na arena política, ele ganhou reforços. O candidato a vice-presidente da chapa republicana JD Vance endossou o ex-presidente. “O presidente Trump está dizendo algo que é realmente importante e profundo, que é que a liderança política deste país deveria ter mais voz sobre a política monetária”, disse, em uma entrevista no fim de semana. “Eu concordo com ele.”

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